42 anos da Chacina da Lapa – o sinistro trabalho da reação e do revisionismo

42 anos da Chacina da Lapa – o sinistro trabalho da reação e do revisionismo


Aparelho partidário na rua Pio XI onde ocorreram os assassinatos

A Chacina da Lapa ocorreu no dia 16 de dezembro de 1976, resultado de uma operação das Forças Armadas que visava eliminar o Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que se reunia na Rua Pio XI, no bairro da Lapa, em São Paulo.

Na ocasião, os grandes dirigentes comunistas Pedro Pomar e Ângelo Arroyo foram barbaramente assassinados. O dirigente comunista João Batista Franco Drummond, também membro do Comitê Central, havia sido preso um dia antes e foi assassinado sob bárbaras torturas no odioso Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI/Codi). Outros cinco comunistas foram presos e levados às torturas.

Este fato trágico na história do Movimento Comunista brasileiro contribuiu para o aniquilamento do PCdoB enquanto um partido revolucionário do proletariado, pois, em seguida, sua direção foi tomada de assalto por revisionistas que, sob a batuta de João Amazonas, transformaram o PCdoB neste pecedobê apodrecido e completamente integrado ao velho Estado burguês-latifundiário de hoje.

Reconstruído em 1962 com a sigla PCdoB (para se diferenciar do antigo PCB revisionista de Prestes), o partido de Pedro Pomar, Maurício Grabois e outros notáveis revolucionários dirigiu a heroica Guerrilha do Araguaia, que até os dias atuais é o mais elevado nível da luta de classes no Brasil, em que pese a dificuldade da assimilação da ideologia do proletariado, que, na época, com as grandes experiências da Revolução Chinesa, já havia evoluído em marxismo-leninismo-maoismo.

Mesmo com limitações na compreensão da ideologia do proletariado, os comunistas, ligando-se às massas camponesas, ousaram levantar a bandeira da luta armada e foram até a região do Araguaia. Lá, de armas nas mãos, verteram seu honrado sangue não só contra o regime militar-fascista pró-USA, mas pela Revolução Brasileira.

A Chacina da Lapa contribuiu para que os revisionistas interrompessem as discussões acerca do balanço da experiência do Araguaia. O capitulador João Amazonas simplesmente passou “um pano” para abafá-la, desembocando, posteriormente, no ataque aberto ao maoismo. Assim foi que a reação armada e o revisionismo, em trabalho conjunto, liquidaram o Partido Comunista do Brasil, colocando em seu lugar mais um partido revisionista, antimarxista e a serviço das classes dominantes.

“A esquerda na direção do PCdoB, que já estava profundamente debilitada na defesa do maoismo com a perda de Maurício Grabois e dezenas de quadros no Araguaia e nas cidades (além do imenso prejuízo orgânico e ideológico da saída dos quadros da Ala Vermelha e do PCR nos anos anteriores), receberá um golpe definitivo durante a reunião do Comitê Central de dezembro de 1976. Isto, precisamente no momento em que a luta pelo justo balanço sobre o Araguaia estava se impondo. Balanço este de importância decisiva para o desenlace da luta interna na direção por tirar lições dos erros e persistir na linha revolucionária que, com o massacre pelas forças da repressão, foi sepultado no partido.”, afirmou o Núcleo de Estudos do Marxismo-leninismo-maoismo em sua obra Problemas na história do Partido Comunista do Brasil, que pode ser adquirido na loja virtual de AND.

Publicamos a seguir parte do balanço feito pelo camarada Pedro Pomar acerca da experiência da Guerrilha do Araguaia, no Pleno do Comitê Central cujo prosseguimento foi interrompido pela chacina.

“Examinemos mais detidamente essas opiniões expendidas pelo camarada J. A concepção. A idéia geral, que presidiu a preparação e, a seguir, a deflagração da luta, bem como a própria luta no Araguaia, foi a de, a partir de um dado momento, julgado o melhor pela Comissão Militar, converter o núcleo de camaradas implantados e organizados em destacamentos guerrilheiros, no estopim de um movimento armado que se expandiria paulatinamente e abarcaria, ao fim e ao cabo, todo o país. Baseados nessa concepção é que trabalhamos desde 66-67. A coisa começou pela escolha de áreas adequadas onde seriam fixados os camaradas, que para lá se dirigiam voluntariamente, mas devidamente selecionados e advertidos. A princípio houve empenho para o trabalho de implantação em três áreas contíguas, mas por motivos de segurança, de falta de confiança, ou por outros motivos, a preparação acabou limitada a uma só área, cujo fundo, no entanto, era imenso, praticamente assegurando tranquilidade quanto à retaguarda. Para essa área tudo convergiu, tudo se subordinou. Nela seriam colocados, cuidadosamente, os camaradas adredemente escolhidos, mas voluntários. Mediante o treinamento militar intensivo e prioritário, o conhecimento do terreno, a capacitação ideológica e política, o estudo dos problemas locais, etc., esses camaradas se transformariam, num prazo determinado (de acordo com o critério da CM) num pequeno agrupamento guerrilheiro — célula-máter do exército popular, do fortalecimento do Partido, da libertação do país, etc. A configuração desse agrupamento já correspondia à de um exército em miniatura, dirigido pela Comissão Militar do CC, a qual se deslocara para a área, e nela concentrara sua atividade. Em relação às massas locais, o critério foi o de travar amizade com elas, conhecer seus problemas, prestar-lhes assistência. Cada camarada devia aparecer como pessoa amiga, séria, trabalhadora, mas que não falava por nada no mundo em política ou coisa que o valha. O trabalho, dito de massas, consistia em servir ao povo por meio de assistência médica e farmacêutica, da ajuda dos mutirões e em outras atividades desse tipo. Na medida em que a situação dos moradores era estudada e seus problemas conhecidos, tinha-se em vista formular um programa que, no entanto, só devia ser dado ao conhecimento do povo e do país após a deflagração da luta, como aliás aconteceu. Nem sequer a Comissão Executiva dele soube de antemão, dado o estrito segredo em que era mantido o trabalho na área. Quanto ao Partido, como organização, aparecia formalmente através do trabalho da Comissão Militar. Nem na periferia foi estruturado, muito menos na área, por precaução. Os comunistas que lá estavam ficaram enquadrados militarmente e deviam, antes de tudo, preocupar-se com sua preparação para se transformarem em guerrilheiros, combatentes. No âmbito nacional, cabia ao Partido principalmente selecionar militantes e quadros destinados à guerrilha na área prioritária. Não foi fácil enviar esses militantes, atendendo a insistentes pedidos da Comissão Militar e preencher o número de camaradas julgado ideal. Apesar disso, houve organizações regionais que fizeram o máximo para cumprir seu dever, já que o fundamento da argumentação era de que do cumprimento dessa tarefa dependia o futuro do Partido. Em princípios de 71, quando a CM julgou estar bem próximo o momento da explosão da luta, o CC reuniu-se e adotou uma série de medidas relacionadas com o desencadeamento da luta armada para curto prazo. Entre as mais importantes estava a tarefa de criar condições para instalar na área (conhecida só como prioritária) o resto da direção que permaneceria nas cidades enquanto não houvesse as referidas condições. A parte do CC nas cidades devia dar o máximo de apoio ao trabalho desenvolvido pela direção da área. As comunicações entre as duas direções dependeriam, como dependeram, da iniciativa e da responsabilidade da CM. Em suma, tudo se condicionou ao êxito da luta armada que se preparava no Araguaia. Do ponto de vista político, os motivos e a decisão para o desencadeamento da luta também ficariam sob a responsabilidade da Comissão Militar. As Forças Guerrilheiras seriam o braço armado do Partido, em desafio à ditadura militar-fascista. A bandeira política, embora de amplo sentido democrático e libertador, devia ser arvorada assim que se iniciasse a luta, que se daria por meio de uma ação de repercussão nacional. As contradições sociais e políticas da área, as motivações locais, deveriam apenas respaldar a ação nacional; serviriam para atrair as massas da área e incorporá-las à luta, no processo. 

Repito: essa, em síntese, me parece ter sido a concepção que presidiu a preparação e terminou sendo aplicada na luta armada do sul do Pará. Mas, a partir de abril de 1972, ou pouco antes, que aconteceu? Apesar de todo o sigilo da preparação, esta foi denunciada e descoberta. O inimigo resolveu imediatamente liquidar os núcleos guerrilheiros através de uma investida de surpresa. A eventualidade estava prevista. Como, porém, reagiu a Comissão Militar? O camarada J coloca a questão em termos de opção, entre abandonar a área e resistir. A opção foi pela resistência. Isto foi bom, acrescenta o camarada J, porque aparecemos como vítimas. Mas não esclarece quais os objetivos imediatos e futuros perseguidos por essa resistência. E não o faz, porque tais objetivos estavam há muito fixados. Quero dizer que, na realidade, essa resistência já havia sido decidida com antecedência; decorreu de toda a concepção do trabalho realizado: do número de elementos dispostos na área, de sua organização, do plano geral de luta. A concentração das forças e a centralização do comando eram parte integrante e fundamental dessa concepção. Em virtude de tal preparação e da idéia política predominante, dificilmente a Comissão Militar poderia recorrer, por exemplo, a outra opção, ou mesmo a uma forma de luta como a preconizada no documento da Guerra Popular para os propagandistas armados. No entanto, agora o camarada J reconhece que o principal erro da guerrilha consistiu em não ter dispersado seus grupos. Mas isto importa num erro de princípio e não de tática, secundário. O camarada J viu-se obrigado também a concordar que era grande a quantidade de elementos combatentes em relação ao terreno e à massa (70 combatentes para uma área de 6.500 Km2 e de população rarefeita). E afirma que foi um erro tático (só tático?) manter forças concentradas numa área bem menor, ao invés de dispersá-las. Explica que isso ocorreu pela necessidade de consolidar o trabalho de massas, em vista de o Exército poder voltar a qualquer momento. Era ‘indispensável ter o pessoal à mão’. Tal concentração foi agravada pela decisão da CM de fundir os três destacamentos. Mesmo assim, não fica claro o verdadeiro sentido dessa premência em ‘consolidar o trabalho de massas’.

Apesar dessas constatações e da derrota sofrida, o camarada J dá como aceita a concepção que prevaleceu na luta do Araguaia. Pondera que devemos continuar trilhando-a. Sinceramente, discordo dessa opinião. Certamente, como já disse, a experiência do Araguaia tem aspectos de valor que devem ser sistematizados e aproveitados. O espírito de luta, heroísmo mesmo, o esforço para adaptar-se às condições do meio, a capacidade de resistência, precisam ser salientados e devidamente estimados; servem como exemplo. Nosso Partido sempre se orgulhará dessa luta; do sacrifício dos camaradas que lá tombaram, tentando abrir caminho para a vitória de nossa causa. Mas para determinar a validade de uma experiência isso apenas não basta. O fundamental, no caso concreto e como já ficou esclarecido em documentos relacionados com a guerra de guerrilhas, é a sobrevivência e o desenvolvimento da mesma. E isto depende antes de tudo da incorporação das massas à guerrilha, de estas fazerem sua a causa – a bandeira levantada pelos guerrilheiros. Nessa determinação devemos contar, naturalmente, com erros, com fracassos, com perdas terríveis. Em certa medida, as derrotas e os erros serão inevitáveis; mas poderemos sem dificuldades avaliar seu resultado político (e/ou sua sobrevivência) pelo nível de incorporação das massas, por seu apoio ativo à luta guerrilheira. Ora, exatamente é com essa dificuldade que nos deparamos ao tratar da experiência do Araguaia. O número de elementos de massas ganho para a guerrilha foi insignificante, principalmente se considerarmos como um êxito formidável o tempo de duração da luta armada. Mesmo assim, não se soube trabalhar com esses elementos. Também a atividade política dos núcleos da ULDP não é esclarecida. Tudo leva a crer que a guerrilha se iniciou como um corpo a corpo dos comunistas contra as tropas da ditadura militar. E assim continuou quase todo o tempo. Aí reside, a meu ver, o maior erro, o mais negativo da experiência do Araguaia. Pois a conquista política das massas não pode ser efetuada só depois da formação do grupo guerrilheiro. Tampouco este deve ser constituído única e exclusivamente, mesmo que seja apenas no princípio, de comunistas. E não se diga que a orientação contida nos documentos e resoluções do Partido não seja cristalina a respeito. Tanto pela letra, como pelo espírito, os documentos partidários essencialmente dirigidos contra as teses pequeno-burguesas e foquistas, indicam, sem margem de dúvida, que:

1) a guerra popular é uma guerra de massas;

2) a guerrilha é uma forma de luta de massas;

3) para iniciá-la, ‘mesmo que a situação esteja madura, impõe-se que os combatentes tenham forjado sólidos vínculos com as massas’; 

4) a preparação ‘pressupõe o trabalho político de massas’;

5) os três aspectos — trabalho político de massas, construção do Partido e luta armada — são inseparáveis na guerra popular; 

6) o Partido, isto é, o político, é o predominante desses aspectos;

7) numa palavra, o trabalho militar é tarefa de todos os comunistas e não apenas de especialistas.

A experiência contrariou frontalmente essa orientação sobre a guerra popular. Sob o fundamento de que nas atuais condições brasileiras é impossível criar a base política antes de se forjar e acionar o dispositivo militar, o braço armado do povo; alegando-se impossibilidade de ganhar elementos de massa para a guerrilha antes de deflagrar a luta armada e que, portanto, o núcleo guerrilheiro deve ser organizado de início só com comunistas, enveredou-se pelo caminho que levou aos resultados que estamos discutindo. A vida, porém, encarregou-se de mostrar que esses tipos de preparação, assim como a organização de grupos guerrilheiros só de comunistas, não permitirão sua sobrevivência nem seu desenvolvimento. Por mais conspirativa que venha a ser a preparação, o inimigo poderá descobri-la “antes da criança nascer”; por mais heroicamente que se comportem os combatentes comunistas, se estiverem isolados das massas, sem seu apoio ativo, serão batidos; e por mais eficiente que seja a direção militar, com tal concepção será derrotada. Por isso, a orientação seguida no Araguaia tem de ser modificada em suas linhas essenciais. 

Ao invés de se considerar que só será viável o trabalho de preparação à base dessa concepção, o certo é primeiro realizar o trabalho político, procurar, através de uma ação planificada, cuidadosa, paciente, clandestina, e tendo em conta o movimento camponês real, criar a base de massas necessária para desencadear a luta. Afirmar que esse trabalho, no momento atual, por causa do aumento de vigilância do inimigo, não é possível, me parece falso. Seria o mesmo que concluir ser o trabalho de massas em geral, bem como a construção do Partido, sob as condições da ditadura militar-fascista, também impraticável. Mas esta conclusão ninguém a aceita entre nós, por absurda. 

Julgo este ponto de vista, acusado de dogmático, o único capaz de corresponder à realidade atual e aos princípios da guerra popular, quer na concepção, quer no método”.


Os quatro dirigentes executados no curso da luta armada revolucionária do Araguaia: Maurício Grabóis (morto na guerrilha), Pedro Pomar e Angelo Arroyo (executados na Chacina da Lapa); e João Batista Drummond, capturado e morto na tortura pouco antes da chacina

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