O almirante Alvin Holsey é o novo comandante do Comando Sul das Forças Armadas Americanas (U.S. Southern Command). Durante a cerimônia de posse, o militar frisou o caráter estratégico da atuação ianque na América Latina, demonstrando preocupação com a influência russa e chinesa, no qual afirmou ser um risco à estabilidade e segurança no subcontinente e ao próprio imperialismo norte-americano.
O almirante substituirá a general Laura Richardson, cuja administração foi responsável pela elevação sem precedentes do intervencionismo ianque no território latino-americano. Foram mais de 24 exercícios conjuntos com tropas americanas envolvendo mais de 40 mil militares de 30 países, inclusive dentro da Amazônia brasileira, que figura fato inédito. Além disso, sob sua gerência foram criadas as bases militares de Ushuaia na Argentina e a de Alcântara no Brasil. A general também chegou a propor a criação de um novo “Plano Marshall” por meio de investimentos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD).
Instabilidade na região e crise no Haiti
O discurso de Holsey demonstrou a grande preocupação do establishment militar norte-americano com a “estabilidade da região” segundo eles ameaçada por crises econômicas, climáticas e migratórias, bem como pela interferência do “crime organizado”.
O Secretário de Defesa norte-americano, Lloyd Austin, presente na solenidade, também ressaltou o papel das forças norte-americanas em meio à atual crise no Haiti, afirmando que o Pentágono continuará apoiando as forças de segurança haitianas enquanto elas “restabelecem a segurança e a estabilidade para o povo haitiano”. Referindo-se ao esforço conjunto de interferência imperialista na região sob comando dos EUA, e valendo-se de tropas do Quênia, o secretário convenientemente não fez menção às intervenções frustradas de tropas brasileiras sob mandato da ONU entre 2004 e 2017. As tropas da Minustah (Missão das Nações Unidas para a estabilização do Haiti) foram responsáveis por inúmeros crimes contra o povo haitiano.
A gazela mais lenta morre
“A gazela mais lenta morre. Quando o sol nasce é melhor você estar correndo”. O tom fatalista das palavras de Alvin Holsey não é à toa. Referindo-se à disputa interimperialista com Rússia e China, o novo comandante do Comando Sul não mediu palavras para descrever o atual estado da competição na América Latina: “Entender-me é entender a essência da sobrevivência. Toda manhã na África, uma gazela acorda, ela sabe o que é correr mais rápido que o leão mais rápido ou ser morta.”
Para os militares ianques, pesa especialmente o grau da influência econômica da China, tendo 21 países do continente assinado acordos de cooperação com a potência asiática dentro do projeto Nova Rota da Seda e Cinturão e Rota (do inglês, Belt and Road). Além da crescente influência militar russa, que assinou acordos de cooperação e chegou mesmo a enviar tropas e armas para a República Bolivariana da Venezuela em meio a crise instalada com a Guiana.
A general Richardson completou o tom belicoso de Holsey: “Este é um chamado para a ação. E esta é uma luta entre democracia e autocracia. É simples assim”.
América Latina é chave para o novo conflito global no horizonte
Com a continuidade do genocídio palestino em Gaza, a guerra na Ucrânia e o constante perigo de uma guerra deflagrada no mar do sul da China entre a RPC e Taiwan, as tropas norte-americanas veem seus contingentes mais espalhados e comprometidos com inúmeros conflitos. A derrota recente no Afeganistão, em 2021, deixou claro que sua estratégia de intervenção no Oriente Médio já está se esgotando, frente a possibilidade da generalização de uma nova guerra de proporções mundiais, o controle sobre a zona de influência ianque na América Latina se torna primordial para a sobrevivência de seu sistema global de dominação. E isto os militares norte-americanos sabem muito bem, como demonstra sua recente intervenção militar no Peru.
Com a posse de Donald Trump em janeiro, muitos esperam por um novo aprofundamento da política belicosa para a América Latina, ainda mais após o presidente eleito ter declarado que se tivesse sido eleito em 2020 teria “tomado a Venezuela” e “pegado todo o petróleo”. Agora busca pressionar o governo brasileiro, mesmo antes de tomar posse, a construir uma “coalizão regional” anti-Venezuela. Trump ainda afirmou que seu primeiro ato enquanto presidente será o de expulsar todos aqueles que estejam no país de forma ilegal, hoje mais de 12 milhões de pessoas, certamente contribuindo para a eclosão de uma imensa catástrofe social de repercussões políticas ainda inimagináveis por todo o continente.