A única certeza: a próxima crise será maior

Jornalões reacionários recomendam cautela frente à crise envolvendo Bolsonaro e militares. Este é um sinal da falta de unidade sobre o que fazer com o elefante na sala: as Forças Armadas conspirando abertamente por um golpe militar com ministros de Estado.
Durante reunião ministerial, Jair Bolsonaro, Augusto Heleno e ministros discutiram como dar golpe militar. Foto: Reprodução.

A única certeza: a próxima crise será maior

Jornalões reacionários recomendam cautela frente à crise envolvendo Bolsonaro e militares. Este é um sinal da falta de unidade sobre o que fazer com o elefante na sala: as Forças Armadas conspirando abertamente por um golpe militar com ministros de Estado.

Os grupos das classes dominantes estão cautelosos quanto à atual crise política desatada a partir da Operação da PF Tempus Veritatis. Representantes de longa data das principais oligarquias e grupos de poder do establishment, os jornalões dos monopólios de comunicação “Estadão” e “O Globo” foram absolutamente unânimes em recomendar “serenidade” e “prudência” à continuidade das investigações pela PF e STF. Sabem que a atual crise política guarda sintomas de uma crise militar profunda, em que os grupos de poder estão cindidos, carentes de uma unificação sobre como proceder. Sabem também que a crise vindoura será maior e mais profunda. E tentam se antecipar a ela.

Não há celebração alguma do pretenso “combate ao golpismo”. Pelo contrário, da parte d’O Globo há a defesa de que PF, PGR e STF devem manter postura “serena e responsável” – como se dissessem ao governo de Luiz Inácio: “nem tentem fazer carnaval em cima disso”. Também há a constatação de que a situação “não tem paralelo na História recente do Brasil”.

Por sua vez, o Estadão, frente à maior operação jurídica dos últimos decênios, lança críticas para cima de… Alexandre de Moraes! Com isso, passam a mensagem de que, muito embora se devesse punir alguém pelos episódios do 8 de janeiro, não é a qualquer custo. Pedem, assim, mais respeito aos máximos desrespeitadores das próprias leis desta republiqueta Brasil.

Este é um sinal da falta de unidade sobre o que fazer com o elefante na sala: as Forças Armadas conspirando abertamente por um golpe militar com ministros de Estado.

Forças Armadas falam com silêncio

O ineditismo mais importante da crise de agora é o silêncio dos generais, que têm seus pares como alvos de fato do STF – o que é novo, dado o enorme corporativismo na caserna. Este silêncio, porém, cumpre um papel político.

Após a operação, as Forças Armadas reacionárias não se pronunciaram de maneira oficial, até agora. Foi o general da reserva Hamilton Mourão, hoje senador, quem conclamou os militares a “não assistirem calados”. O que se observa como tendência principal entre os verde-oliva é o crescimento da agitação, sobretudo entre os da ativa. O que estarão pensando, agora, os oficiais e militares de baixa patente dos kids preto, que até 8 de janeiro contavam com a promessa de seu comandante que eles seriam utilizados para uma “intervenção militar com Bolsonaro no Poder”? Tal possibilidade, bastante explosiva, – a saber: de que tal agitação continue sendo feita pela extrema-direita obstinada – toma contornos mais graves: esses galinhas verdes estão ainda mais convencidos de que não devem esperar pelos generais que são “cagões”.

Fato é: desde o governo Bolsonaro abriu-se uma grave crise militar e não há mais nenhum general que unifique os demais e o restante da tropa. Este papel Villas-Bôas cumpriu nas crises de 2016 (que resultou no impeachment de Dilma) e nos julgamentos no STF de Luiz Inácio (que Villas-Bôas atuou coesionando todo o ACFA numa intervenção militar com o objetivo político de retirar o petista do pleito do ano de 2018).

Em tal situação, bastou uma minoria de extrema-direita minimamente organizada com um centro (o palácio do Planalto com Bolsonaro) para que as agitações tomassem proporções gigantescas. Não há ninguém que coloque a mão no fogo como garantia de que coisa similar não ocorrerá nos próximos períodos.

E o silêncio dos generais é um duplo recado. Ao STF, indicam que, embora não estejam de acordo, não vão se levantar em oposição aberta neste momento. Já para os militares de baixa patente influenciados pela extrema-direita, seguem com a porta aberta ao proselitismo político.

Choques entre reacionários

O STF deixa o recado de que certas atitudes muito escancaradas dos militares rumo à uma mudança de regime não serão aceitas – pelo menos da forma que foi, em que o STF era um dos alvos e estava absolutamente fora das negociatas golpistas. Nunca será demais lembrar que, ao longo da história do País, o STF nunca foi contrário a um regime brutal de repressão à luta popular e revolucionária. Jamais representou um obstáculo à continuidade do regime de exploração e opressão do povo brasileiro sob as formas mais brutais de ditadura militar escancarada, tendo, inclusive, seguindo atuante após o AI-5. De modo que sofre de desatenção, ou de má fé, aqueles que afirmam que o STF “combate o golpismo”.

O entendimento vigente entre os ministros da “corte suprema” é de que é sua responsabilidade a palavra final frente a qualquer desentendimento entre os poderes, e não dos militares – com quem se chocam frontalmente na presente crise. Enchem a boca repetindo a velha tese de Rui Barbosa, de que o STF tem “o supremo privilégio de errar por último” (Dias Toffoli afirmou que, havendo conflito, os ministros são “editores de um país inteiro”, Barroso defendeu que o STF é o protagonista da vida política nacional).

O STF sabe que a resposta dos militares virá, mas apostam no isolamento político da extrema-direita após o 8 de janeiro. E também na repercussão negativa dos quatro anos de governo militar genocida de Jair Bolsonaro (por isso incluíram o negacionismo durante a Covid como fundamentação da Operação).

Lira, presidente de fato, tem reunião com Luiz Inácio

Os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, mantiveram silêncio. Lira se limitou a dar um significativo aviso a parlamentares próximos. Ele reclamou que, diferentemente do comandante do Exército, os chefes do Legislativo não foram avisados sobre a operação; Lira crê ser mais importante até mesmo do que o presidente da república, o que ilustra bem a situação do País.

No dia seguinte à operação, Lira se reuniu com o presidente Luiz Inácio. O encontro não estava agendado. Certamente, o petista tem razões para se preocupar. Lira é, hoje, o presidente de fato. É imensa a quantidade de parlamentares – políticos reacionários da velha ordem divididos entre dois campos (extrema-direita e direita liberal) – que se mobilizam para aprovar alterações na composição e no funcionamento do STF. E é Lira e Pacheco (e não Lula) quem definirão quando e em que contexto os projetos de leis entrarão em votação.

Não é só no Congresso que Lira dá as cartas. É também no governo. Lira tem nomeado tantos ministros que, hoje, a Esplanada dos Ministérios é povoada por políticos reacionários fisiológicos, até ontem bolsonaristas. Quase todo o primeiro escalão do governo federal está com Lira. No Parlamento, está sem ação toda a base governista – que mais correto seria chamar de “base lirista”. Ali, a iniciativa que o governo federal poderia ter é comprada à vista com emendas parlamentares.

Quem é louco de afirmar que, nestas condições, o governo federal poderia lançar uma campanha política exitosa, no sentido de “combater o golpismo” ao lado do STF e da PF? E no caso de ocorrer uma resposta da extrema-direita, o que poderia fazer Luiz Inácio?

Aonde isso vai parar?

Ao fim, todos os caminhos levam à Roma. Isto é, até a próxima e futura crise, que será mais profunda e ainda mais ampla. Por estas razões, as classes dominantes, através de seus jornalões do monopólios de comunicação, por mais estardalhaço que possam fazer, estão a recomendar calma, cautela e serenidade.

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