Abrapo se pronuncia sobre as investigações da Chacina de Pau D’Arco

Abrapo se pronuncia sobre as investigações da Chacina de Pau D’Arco

 

 Dr. Felipe Nicolau, presidente da ABRAPO (Associação Brasileira dos Advogados do Povo)

 

 

O presidente da Associação Brasileira dos Advogados do Povo (Abrapo), Dr. Felipe Nicolau em entrevista exclusiva ao AND, concedida no dia 15 de julho, falou sobre as investigações em curso da Chacina de Pau D’Arco, no Pará.

 

− A forma como a Polícia, e, portanto, o Estado, atuou no que ficou conhecido como Chacina de Pau D’Arco é uma prova da certeza de impunidade que se tem quando do cometimento de crimes de lesa-humanidade contra o povo pobre em luta, especialmente, o povo do campo. Dados divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) em 2014 no Caderno de Conflitos do Campo mostram que: de 1985 a 2014, ou seja, em 30 anos, foram registrados 1.723 assassinatos no campo (média superior a 1 assassinato por semana). Desses, somente 108 casos foram levados a julgamento, e pouco mais de 80 pessoas condenadas, além de pouco mais de 20 mandantes. Ou seja, houve condenação em menos de 5% dos casos. E ainda, houve condenação de mandantes em aproximadamente 1% dos casos. Os dados evidenciam que os assassinatos no campo são impunes, especialmente para mandantes.

Assim que houve a Chacina em Pau D’Arco advogados da Abrapo foram ao Pará prestar solidariedade aos familiares das vítimas e cobrar do Estado punição aos mandantes e executores do crime. A ida de jornalistas do Jornal A Nova Democracia também cumpriu com o importante papel de denunciar o ocorrido, e de confrontar com a primeira versão do evento que havia sido veiculado pelo monopólio de imprensa, de que teria ocorrido um confronto entre camponeses e policiais que resultou na morte de 10 camponeses. Assim, fruto de uma campanha intensa foi desvendado que o que de fato ocorreu na Fazenda Santa Lúcia, em Pau D’Arco, foi a tortura e execução de 10 camponeses pobres que lutavam por um direito justo e legítimo, que é o acesso à terra.

A campanha iniciada pela Abrapo e seguida por demais organizações e pessoas democráticas serviu para chamar atenção ao caso e obrigar que as instituições estatais tomassem providências sobre a Chacina. Sobre isso, foi muito importante a posição do Ministério Público Federal que publicou, através de sua Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, nota em que questiona a Secretaria de Segurança Pública o porquê de ter endossado tão prontamente a versão de que os policiais foram recebidos a tiros, por ocasião do cumprimento dos mandados de prisão e de busca e apreensão na fazenda Santa Lúcia, em Pau D’Arco, e que assim as mortes foram resultado de reação legítima dos policiais; como explicam a versão de troca de tiros em que nenhum policial é ferido e 10 camponeses são mortos; por que os corpos foram removidos, adulterando a cena dos fatos, antes da realização de perícia; dentre outras questões.

Depois disso, investigações foram realizadas e foi concluída a reconstituição dos fatos, de forma a confrontar as duas versões apresentadas: a versão dos sobreviventes da Chacina, o qual afirmam que foi execução; e a versão dos policiais de que teria sido confronto. E ainda, 11 policiais militares e 2 policiais civis tiveram prisões preventivas decretadas.

Apesar de tudo isso, as pessoas que reocuparam a Fazenda Santa Lúcia e os familiares das vítimas ainda vivem sob medo. Recebemos denúncias de que uma lista com nomes de pessoas ameaçadas tem circulado. E no último dia 07 de julho, um dos dirigentes locais, o camponês Rosenilton Pereira de Almeida, foi assassinado na cidade de Rio Maria – PA.

As investigações e prisões decretadas são passos importantes, mas são apenas o início. Processos criminais podem demorar muitos anos e ao final, se não houver pressão popular, a maioria deles pode ser absolvida. Como no Massacre de Corumbiara, em que houve julgamento, mas apenas 3 policiais foram condenados e os verdadeiros mandantes dos crimes (latifundiários da região) sequer foram a júri popular. O mesmo ocorreu em Eldorados dos Carajás, em que 154 policiais foram denunciados pelo Ministério Público Federal, mas penas 2 foram condenados.

Assim, as investigações, decretação de prisões e prováveis denúncias que virão são importantes, mas é preciso continuar acompanhando o caso, continuar as campanhas de denúncias, para que haja efetivamente condenações. Além disso, é preciso identificar quem são os mandantes, e não só executores do crime. Afinal, como apontam os dados, a história brasileira é marcada pela impunidade dos mandantes dos crimes contra camponeses pobres.

E por fim, outro aspecto importante da luta que também está sendo acompanhado pela Abrapo é o processo administrativo, que tramita no INCRA, de desapropriação da Fazenda Santa Lúcia, latifúndio improdutivo. A lei brasileira garante que as propriedades que não cumprem com a função social devem ser destinadas a reforma agrária. Sendo assim, é parte da defesa do povo não só a punição dos criminosos da Chacina de Pau D’Arco, como também a luta pela desapropriação da fazenda para reforma agrária, problema que não merece menos importância e que deve ser acompanhada e defendida por todas as pessoas progressistas e democráticas do país. Afirmou Doutor Felipe Nicolau durante a entrevista ao AND.

 

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