Em protesto contra ataques de usina, camponeses bloqueiam trecho da BR-101, em Rio Largo, dezembro de 2016
As famílias do Acampamento Fazenda Várzea Grande foram despejadas pelas forças de repressão do velho Estado no dia 31 de janeiro, em Rio Largo, Alagoas. A reintegração de posse foi cumprida por um grande efetivo de policiais militares, sendo marcada por arbitrariedades e truculência.
Ouvidoria Agrária participa de despejo
A Ouvidoria Agrária Nacional participou ativamente do despejo criminoso dos camponeses da fazenda Várzea Grande, sendo representado inclusive pelo Ouvidor Agrário Regional, Milton Magni Pereira, evidenciando o papel deste órgão do velho Estado na criminalização e repressão do movimento camponês combativo.
LCP se posiciona
Reproduzimos abaixo nota da Liga dos Camponeses Pobres (LCP) do Nordeste sobre o despejo ocorrido.
Camponeses pobres de Rio Largo/AL despejados em ação cheia de arbitrariedades, afirmam:
Vamos retomar essas terras! A Várzea Grande é nossa!
No dia 31 de janeiro de 2018, por volta das 10 horas, o oficial de justiça da vara agrária, juntamente com polícia militar e acompanhados de representante do INCRA/AL despejaram as dezenas de famílias que estavam vivendo e trabalhando naquelas terras. Tudo isto feita com uma ação militar repleta de ilegalidades.
No dia 27 de agosto de 2017 dezenas de famílias ocuparam a fazenda Várzea Grande, em Rio Largo/AL, quando ali chegaram não havia nada, nem mesmo cana. Desde então os camponeses plantaram roças e construíram os barracos humildes nos quais vinham sobrevivendo com suas famílias, acalentando a esperança de construir uma vida mais justa e mais digna.
Neste período muitas foram as tentativas da usina de expulsar os camponeses, utilizando as formas mais covardes e criminosas. Mandaram os jagunços, que chegaram inclusive a fazer disparos de arma de fogo, para amedrontar as famílias. Como os camponeses se mantiveram firmes, novamente os jagunços, “vigias”, da usina voltaram ao acampamento acompanhado por policias militares, mais uma vez as massas camponesas se mantiveram firmes e não deixaram se intimidar e quando perceberam que estavam sendo gravados a polícia e os jagunços foram embora.
No mês de outubro, depois que os camponeses iniciaram a denúncia em relação aos crimes da usina, apresentando inclusive o boletim de ocorrência registrado contra a ação dos policias, as famílias foram convocadas através do presidente do Iteral [Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas] Jaime Silva para uma reunião que serviria para exigir a apuração das agressões contra os camponeses. Entretanto esta reunião, em que estavam presentes os representantes da alta hierarquia da polícia e os advogados da usina, não foi para apurar as denúncias, mas sim para fazer acusações contra os camponeses. Chegaram inclusive a acusar, sem provas, que os camponeses estavam armados. Quando um companheiro do comitê de apoio às famílias, professor da Universidade Federal de Alagoas, questionou as acusações foi ameaçado de receber voz de prisão. Esta reunião, na verdade, além mais uma tentativa de intimidação, foi uma ação orquestrada para criminalizar a justa luta dos camponeses.
Por que a usina procura intimidar e criminalizar os camponeses? Pelo simples motivo de que não é capaz de comprovar que é dona daquelas terras. É um fato conhecido na história de nosso país a grilagem de terras, através da qual ricos latifundiários ocupam terras das quais não são proprietários, geralmente se trata de terras públicas. Enquanto estes grandes latifundiários ganham rios de dinheiro com um bem que deveria servir ao povo, milhares de pessoas morrem de fome por não terem onde plantar e quando estas pessoas se organizam para lutar por seus direitos representam enorme perigo. Por isto os grandes latifundiários e as instituições do Estado a seu serviço buscam intimidar e criminalizar a luta camponesa.
No mês de dezembro, poucos dias do recesso de fim de ano, o juiz da Vara Agrária concedeu liminar de reintegração de posse para a usina, logo após o recesso este mesmo juiz entraria em férias. O objetivo desta armação era que a contestação dos camponeses sobre a liminar de reintegração não fosse analisada. Diante disto, a advogada dos camponeses enviou rapidamente a contestação, ainda antes do início do recesso, entretanto quando esteve presente na Vara Agrária, no dia 02 de janeiro de 2018, verificou que a contestação não havia sido incluída no processo e, mais que isto, que os e-mails enviados para a Vara Agrária haviam sido apagados. Novamente a contestação foi protocolada, quando recebeu a informação de que não havia juiz para a analisá-la. No dia 16 de janeiro retornou à Vara Agrária, onde foi informada que o juiz substituto estava no fórum do Barro do Duro para o qual se deslocou, chegando lá somente depois de muita insistência é que conseguiu que a contestação fosse analisada. Diante dos camponeses presentes o assessor do juiz afirmou que a liminar estava suspensa até que usina prestasse os esclarecimentos que estavam sendo solicitados pela advogada dos camponeses e que seria marcada uma audiência entre as partes, ficando a decisão de fato para quando o juiz titular da Vara retornasse de suas férias.
Para surpresa dos camponeses, no dia 31 de janeiro, quando se ocupavam dos cuidados com suas roças, a área foi tomada por um grande efetivo de policiais militares, em dezenas de viaturas. O despacho do juiz lido diante dos camponeses não foi publicado e a reintegração de posse foi mantida, ao contrário do havia sido informado aos camponeses. Ficou claro que a Vara Agrária agiu em favor do latifúndio e usou a burocracia para prejudicar os camponeses. Desta forma, uma reintegração de posses, num processo cheio de absurdos, foi realizada pela Vara Agrária, juntamente com as forças policiais, contando com o apoio de um representante do Incra, que ajudou inclusive a derrubar os barracos dos camponeses.
Nem mesmo diante de toda esta série de crimes e arbitrariedades as massas camponesas não vão desistir de sua justa luta. Os camponeses de Rio Largo seguirão o mesmo caminho dos camponeses de Pau D’arco que enfrentaram o latifúndio e retomaram suas terras logo depois que o latifúndio promoveu uma chacina para tentar expulsá-los. Na Fazenda Várzea Grande estão depositados o sangue, o suor e sacrifício das massas camponesas que vivem submetidas à exploração da usina faz muitos anos. Nas terras da Várzea Grande está também o trabalho dos barracos que foram construídos e das roças que foram plantadas, tudo destroçado pela usina. Por isto os camponeses afirmam que aquelas terras pertencem ao povo e que serão retomadas!
O povo quer terra e não repressão!
Abaixo a criminalização da luta pela terra!
A fazenda Várzea Grande é do povo!
Liga dos Camponeses Pobres do Nordeste – LCP-NE