No dia 16 de julho, domingo, num conflito dentro da Reserva Indígena Aldeia Kondá em Chapecó (SC), ocorrido entre seus próprios moradores kaingangues, registrou-se um morto, 11 feridos, casas e carros incendiados e mais de 300 pessoas apartadas e levadas a um ginásio de esportes.
A primeira explicação noticiada foi a de uma disputa interna pelo poder, com parcela do grupo se opondo ao cacique Efésio Siqueira, eleito no ano passado pela outra parcela. A explicação, embora verificável, é muito simplista e está longe de refletir a enorme complexidade do caso.
De dentro e de fora
As hipóteses foram várias, e abarcaram desde a espiritualidade representada na cosmologia das duas metades opostas, até um cenário mais materializado, de influência nociva da sociedade não-indígena e capitalista, das classes dominantes, externa e poderosa, sobre a vida tribal.
Uma senhora da aldeia, ouvida por uma TV, afirmou que “arma de fogo não é daqui de nós, é coisa que veio de fora”.
A mesma visão, de o conflito ter tido um forte componente externo, foi expressada por Adroaldo Fidelis, da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas). “Armas de fogo não fazem parte dos nossos costumes indígenas. Penso que (com o conflito), tivemos perdas, tanto de pessoas quanto de dignidade, e de parte da nossa cultura”, lamentou ele, que também é membro da etnia kaingang.
Sol e Lua brigam?
Houve quem enxergasse o “racha” na aldeia como manifestação da cosmologia Kaingang, que vê seu mundo dividido entre a metade Kamé e a metade Kainru.
A metade Kamé remete à força dos raios do Sol (seu grafismo, em cestos e outros objetos, é de linhas em sequência) e a metade Kainru remete ao poder da Lua (grafismo arredondado).
Mas a Antropologia nega haver uma “oposição” que pudesse levar a uma guerra interna. Explica-se que a relação entre as metades exogâmicas baseia-se numa dualidade falsamente oposta, já que há uma complementaridade entre elas, ou seja uma engloba a outra.