Angola: Greves em todo país de professores, médicos e funcionários públicos!

Angola: Greves em todo país de professores, médicos e funcionários públicos!

Estudantes da Angola se solidarizam com a greve dos professores universitários. Foto: Lusa

Professores universitários, médicos, enfermeiros e funcionários do judiciário (desde motoristas a assessores) estão em greve no mês de março em Angola exigindo o fim do ataque aos seus direitos. Os professores estão há quatro meses em greve por tempo indeterminado contra as péssimas condições de trabalho e salários baixos. Agora, os profissionais dessas três categorias em greve convocam outros trabalhadores a uma greve geral em todo o país.

As reivindicações de todos os profissionais iniciaram desde o início do governo de João Lourenço, do partido oportunista Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

Professores universitários mantém greve há quatro meses

No Ensino Superior, a greve dos professores universitários das instituições públicas acontece há quase quatro meses, iniciada em novembro de 2021. Os professores reivindicam aumentos salariais e melhores condições de trabalho ativamente desde 2018.

Eduardo Peres Alberto, secretário-geral do Sindicato dos Professores do Ensino Superior (Sinpes), afirma que os docentes universitários não querem ser cúmplices da má qualidade do ensino superior no país.

No dia 19/03 ocorreu uma manifestação em Luanda, com quase mil professores universitários. Ali, eles afirmaram que os protestos ocorrerão de 15 em 15 dias, até o velho Estado angolano atender suas reivindicações. Aos docentes de Luanda se juntaram também colegas de outras províncias, entre as quais o Cuanza Norte e Cuanza Sul.

Os protestos e manifestações com centenas de professores têm sido frequentes durante os quatro meses de greve. Como resposta à mobilização dos professores, o Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS), órgão que tem intermediado as negociações, realizou uma proposta de apenas 0,4% de aumento salarial e a mera manutenção dos subsídios já garantidos aos professores. A proposta, é claro, não foi aceita. 

Alunos apoiam os professores

Os alunos do ensino superior de Angola protestaram no dia 19 de fevereiro reivindicando a volta às aulas. Entretanto, todos alunos deixaram claro que a greve não era uma decisão arbitrária dos professores, mas sim uma necessidade frente ao descaso do governo. Além disso, colocam que a única forma de solucionar a greve é o governo ceder às reivindicações dos professores.

Cartazes levados pelos alunos declaravam: “João Lourenço, atenda às exigência da classe dos professores universitários. Nós estudantes queremos estudar e estamos solidários com os professores”.

“O apelo que eu deixo para o Ministério do Ensino Superior é que revejam essa situação, porque precisamos nos formar. O país precisa de nós, precisa destes quadros. Nós ainda somos jovens e os jovens são a força motriz de um país. Queremos regressar às aulas”, afirmou Dias Bengue, estudante de engenharia de petróleos, em entrevista ao monopólio de mídia DW.

Hospitais lotados, falta de condições

Médicos em greve protestam na Angola. Foto: Reprodução

Já os médicos angolanos deflagraram uma nova greve por tempo indefinido. Esta é a segunda greve dentro do período de três meses e ocorre após o governo não ter cumprido nenhum dos acordos que havia firmado com a categoria. Os profissionais da saúde exigem reajuste salarial, a realização de concursos públicos para admissão de novos técnicos e mais verba para as unidades de saúde.

Além disso, os médicos protestam contra a medida disciplinar imposta pelo velho Estado ao seu colega e presidente do Sindicato Nacional dos Médicos de Angola, que foi afastado por denunciar mortes no hospital onde trabalhava devido às condições precárias do local. 

Os médicos do Hospital Pediátrico de Luanda, presentes na manifestação do dia 21/03, exigem a contratação de mais técnicos para dar resposta ao elevado número de pacientes em listas de espera e afirma que não há condições para o tratamento de urgência no hospital.

Funcionários do judiciário em greve 

No dia 21/03, em Luanda, os trabalhadores do judiciário do Tribunal Supremo, entre motoristas, assessores e outros, protestaram exigindo equiparação salarial com os demais tribunais superiores do país. O protesto ocorreu próximo da Presidência da República e fez parte da greve decretada em 19/03, que tem data para ser finalizada no dia 1 de abril. Eles reivindicam a equiparação salarial desde 2017.

“É injusto que um funcionário do Tribunal Constitucional, um funcionário do Tribunal Supremo Militar e um funcionário do Tribunal de Contas ganhem três vezes mais do que um funcionário do Tribunal Supremo.”, afirma Domingos Feca, coordenador da Comissão de Instalação do Sindicato dos Funcionários Judiciais do Tribunal Supremo.

“Queremos ter salários iguais aos dos funcionários de outros tribunais superiores. Não queremos privilégios, não exigimos um salário melhor aos praticados nos tribunais, Supremo Militar, de Contas e Constitucional. Apenas queremos ter salário igual ao desses colegas com os quais, do ponto de vista de hierarquia, estamos ao pé de igualdade”.

O coordenador da comissão de instalação do sindicato exemplifica que a remuneração de um motorista do Tribunal Supremo (TS) tem um salário mensal de 117 mil kwanza (kz), cerca de R$ 1.200, enquanto um motorista do Tribunal Constitucional ganha 300 mil kz, cerca de R$ 3 mil. “A instituição só se movimenta quando há greve”, afirma Domingos Feca.

O MPLA

O MPLA foi uma organização que surgiu como expressão do descontentamento das massas angolanas com a dominação colonial de Portugal. Juntamente com outras organizações de massas, dirigiu a luta armada pela independência da Angola a partir dos anos 50. Já em 1974, Angola torna-se independente. 

No 1° Congresso do MPLA, após a independência, é quando a organização se degeneraria e conformaria-se em partido eleitoreiro e a Angola em semicolônia. O MPLA adotou a designação de “MPLA-PT” (MPLA – Partido do Trabalho) e os seus estatutos colocaram que se procuraria pôr em prática o modelo do “socialismo”, não o do “comunismo”. 

A partir da independência, em 1975, iniciou-se uma guerra civil que durou até o ano de 2002, entre o MPLA, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) e a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), para decidir quem seria o movimento a assumir o governo em Angola.

Em 1992 Angola viveu as suas primeiras eleições, parlamentares e presidenciais e desde então o MPLA tem sido o partido no governo. Nessas eleições, após anos de traição do MPLA com o povo, nenhum dos dois candidatos à presidente chegaram a receber mais de 50% dos votos. Assim, cada vez mais se apresenta um rechaço das massas ao partido eleitoreiro que não deu fim ao capitalismo burocrático no país e não dirigiu uma revolução democrática ininterrupta até o socialismo.

Problemas como o desemprego, relações de produção atrasadas no campo (semifeudalidade), a miséria crescente de toda a população e muitos outros problemas elementares da sociedade de classes persistem enquanto as riquezas naturais do país africano seguem sendo saqueadas pelas potências imperialistas.. A revolta das massas se manifesta também no fato de que já em 2012, 10 anos depois da primeira eleição, o MPLA já havia perdido 10% dos votos em relação à 2011.

Em setembro de 2018, o atual presidente da Angola, João Lourenço, tornou-se presidente do partido. Ele era presidente da Angola desde 2017 e já havia sido Ministro da Defesa de Angola.

O Governo de João Lourenço

O governo de João Lourenço tem sido marcado, desde o seu início, por dezenas de casos de corrupção e por deixar as massas do país à míngua. Numa operação conhecida como “Operação Caranguejo”, o judiciário de Angola apreendeu milhões de dólares, euros e kwanzas na posse de oficiais da Casa de Segurança do Presidente, suspeitos de peculato, retenção de moeda e associação criminosa. Mais de 10 oficiais, incluindo o ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente, foram exonerados. Já o chefe das finanças da banda musical da Presidência, foi detido.

Já na investigação Pangea-Risk, a mulher de João Lourenço teria sido pega em práticas de fraude, corrupção, peculato e subornos que teriam sido pagos pela brasileira Odebrecht a empresas ligadas ao Presidente de Angola. 

Expondo ainda mais que a eleição é um jogo de cartas marcadas, Manuel da Silva Pereira, político acusado de corrupção, foi empossado como presidente da Comissão Nacional Eleitoral em fevereiro de 2020, entre muitos protestos populares. 

Mais recentemente, em janeiro deste ano, o governo de João Lourenço foi responsável pela brutal repressão a uma manifestação de taxistas em Luanda por uma decisão do governo de diminuir a lotação de todos os tipos de transporte em 50%, inclusive os táxis. 

As massas furiosas e gravemente afetadas pela crise econômica arrancaram bandeiras e atearam fogo a um comitê do MPLA, queimaram de um carro do ministério da saúde e o fecharam de uma via principal da Capital. Cerca de 33 taxistas foram detidos pela polícia. 

O presidente afirmou que a justa rebelião das massas fora um “ato de terror” para tornar o país ingovernável e “subverter o poder democraticamente instituído”. Ele elogiou também a “contenção” da Polícia Nacional.

Em entrevista à DW África, um ativista angolano, Nuno Dala, que fez parte dos protestos populares de 2014 no país, afirmou não ter dúvidas de que estes protestos mostram que Angola é uma “panela de pressão” prestes a rebentar. 

Ele declara: “se há aqui algum terrorista tem sido naturalmente o regime que ao longo de mais de 46 anos tem estado a praticar terrorismo de diversas formas, na forma de assassinatos de grupos, corrupção, má governação, ou seja, isso é que tem sido terrorismo contra todos os cidadãos deste país.”

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