Os moradores da Passagem Jesus de Nazaré, localizada na Área Portuária do município de Santana, cerca de 17 quilômetros de Macapá (Amapá) estão sem agua há mais de 20 dias. Os moradores, além de conviver com a falta de água, moram em palafitas em áreas alagadas, com casas sustentadas por estacas fincadas no fundo de igarapés e sem tratamento de esgoto.
A trabalhadora e dona de casa Nira Corrêa sofre juntamente com sua família essa negligencia do velho Estado. Ela afirma ainda que não conseguiu nem mesmo comemorar a chegada do ano novo de maneira digna com sua família. “A gente tinha combinado de reunir a família para fazer a ceia, mas não teve condição. Não tinha como cozinhar, nem fazer nada. Passamos o natal e ano novo sem um pingo de água.”, relata.
Os trabalhadores afirmam que essa situação se mantém há muitos anos e reclamam que isso prejudica diretamente a qualidade de vida, assim como agrava ainda mais a miséria, como relata dona Deuza Oliveira, que trabalha vendendo lanches: “Eu faço lanche para vender aqui por perto, mas sem água fica difícil. Faz mais de dez dias que não faço minhas vendas. Já poderia ter conseguido uma boa renda, mas esse problema de água atrapalhou muito”.
Para manter sua higiene pessoal, assim como cozinhar e beber, os trabalhadores relatam a dificuldade que é buscar água em outras partes do bairro. Aqueles que não conseguem, acabam comprando agua mineral, conforme relato da trabalhadora Nira: “Só pelo fato da gente amanhecer sem ter água para escovar os dentes, para tomar banho, fazer os serviços domésticos, lavar roupa, isso já é muito desagradável. É uma situação que acaba nos estressando. Ninguém merece passar por isso. Nós nos sentimos esquecidos pelo poder público”, protesta.
Sem saneamento os trabalhadores morrem de doenças evitáveis
Infelizmente, a precariedade do saneamento básico em Santana não é um caso isolado na região amazônica. Mesmo com tantos rios, a Amazônia possui os piores indicadores de saneamento básico do pais, conforme constatam diversas pesquisas feitas pelas universidades e até mesmo pelos órgãos do velho Estado.
No Ranking do Saneamento Básico elaborado pelo Instituto Trata Brasil, divulgado em agosto de 2018, foram avaliadas as 100 maiores cidades do Brasil, de acordo com aspectos econômicos. Macapá, capital do estado, está em 95º lugar, apresentando os piores índices. De cada dez habitantes, nove não têm acesso à rede de esgoto. Cerca 110 mil pessoas – algo em torno de um quarto da população total de Macapa – moram em palafitas. Em todo o Amapá, a cobertura de saneamento básico atinge apenas 5,9% das pessoas; na região Norte, de modo geral, apenas 55,37% da população tem acesso a água encanada e somente 10,05% dos trabalhadores têm acesso à coleta e tratamento de esgoto.
Os dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais realizada em 2017 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Amapá constatam diversas doenças que são ocasionadas pela quase inexistente cobertura de saneamento básico. Destas, as com maior incidência são diarreia (em 14 municípios), malária (em 14 municípios), dengue (em 12 municípios), zika (em um município), Chikungunya (em um município), verminoses (em todos os 15 municípios), leptospirose (em cinco municípios), hepatite (em quatro municípios), cólera (em um município), difteria (em um município), tifo (em um município) e febre amarela (em quatro municípios).
A trabalhadora Lucilene relata que é comum os filhos estarem com diarreia, sendo, inclusive, rotineira a internação devido a ingestão de agua suja. “Eles já tiveram diarreia por causa da água contaminada”, conta. Os poucos que recebem água encanada afirmam que a mesma possui péssima qualidade, conforme relata o trabalhador Pedro Gomes: “É inacreditável, porque a gente é vizinho do rio e tem que conviver com uma água dessa suja.”.