Sem receber salários há vários meses, alguns desde 2019, trabalhadores da saúde do setor de limpeza do Hospital de Emergências (HE) e Hospital de Clínicas Alberto Lima (Hcal), os maiores hospitais de Macapá, abandonam seus trabalhos em protesto. Sem nenhuma previsão para resolver a situação, os acompanhantes e até mesmo alguns pacientes internados nos hospitais realizam desde o início de fevereiro de 2020 a limpeza de enfermarias e banheiros seus próprios recursos, conforme vídeos divulgados na internet, devido à negligência dos governos.
Um vídeo do dia 20 de fevereiro que circula na internet mostra acompanhantes recolhendo o lixo gerado pelo fornecimento da alimentação entregue aos pacientes no HE. Em outro vídeo, gravado no dia 24 de fevereiro, é possível verificar em um dos banheiros do Hospital de Clínicas papel higiênico pelo chão e o piso com sujeiras; além disso no local também estão presentes os carrinhos de limpeza que são utilizados pelos trabalhadores. Por meio de fotos é possível ver cupins na parede, macas em locais aparentemente sujos, assim como entulhos pelos corredores.
Desde então os acompanhantes e até mesmo alguns pacientes internados se revezam na limpeza das enfermarias e banheiros e, além disso, dividem os valores da compra de materiais de limpeza.
“Em fevereiro, a limpeza deixou de ser realizada e esse serviço é feito nas enfermarias e banheiros por acompanhantes e pacientes que dão conta. Além disso, compramos os detergentes, águas sanitárias, vassouras, panos e rodos. Eles pararam tudo. É um estado de calamidade”, relata Richely Matos, que acompanha seu irmão, que aguarda desde novembro a realização de uma cirurgia neurológica por conta de um aneurisma cerebral.
Outro trabalhador que acompanha familiar e que decidiu não se identificar relata que os acompanhantes realizam essa limpeza diariamente para não agravar o estado clínico dos internados. “A gente é praticamente obrigado a limpar porque, se não fizermos isso, é possível que os pacientes piorem o quadro de saúde, então ficamos sem alternativas. Não podemos deixar nosso familiar ficar no hospital pior do que entrou por falta de uma limpeza”.
Aumento dos casos de Covid-19 expõe cenário crítico
Durante essa semana os trabalhadores da saúde de Macapá iniciaram uma campanha na internet denunciando além da falta de Equipamentos de Proteção Individuais (EPI), falta de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e o cenário caótico da saúde em Macapá que já era assim bem antes do aumento dos casos de Covid-19.
Manifestantes queimam pneus em protesto contra caos na saúde de Macapá, em novembro de 2019. Foto: Jorge Júnior/Rede Amazônica
m 19 de fevereiro de 2020, uma fiscalização realizada pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) do Amapá no Hcal constatou a falta de diversos materiais, dentre eles EPI, medicamentos de urgência e emergência e falta de materiais para realização de exames laboratoriais. No dia 13 de março o CRM realizou a interdição ética na UTI do Hcal.
Ao longo de todo 2019 trabalhadores da saúde realizaram vários protestos contra esse cenário caótico de precarização em Macapá, conforme noticiou AND.
Em abril de 2019, os trabalhadores do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) denunciaram que estavam com suas atividades prejudicadas por conta da precarização do serviço. O ponto mais crítico foi a noite do dia 24 de abril, onde o Samu chegou a ser interrompido devido à utilização de suas macas como leitos no HE de Macapá que possuía poucas macas para atendimento. Esse cenário agrava o quadro clínico dos pacientes podendo até mesmo ocasionar a morte.
Ainda em abril pacientes e acompanhantes interditaram a rua em frente ao HE de Macapá, denunciando falta de medicamentos, equipamentos quebrados e a demora na realização de cirurgias.
Em novembro de 2019 os trabalhadores terceirizados da saúde realizaram um ato contra a falta de salários. Cansados de promessas do velho Estado, os trabalhadores montaram barricadas com pedaços de madeira e queima de pneus na avenida FAB, umas das principais de Macapá.
Trabalhadores denunciam caos da saúde em Macapá. Foto: Redes Sociais