A Câmara dos Deputados aprovou no dia 14 de setembro uma medida que permite ao governo destinar, em 2024, valores para Saúde e Educação abaixo do piso mínimo exigido por ambos os setores. O artigo, que é uma adição ao projeto de lei complementar que trata da compensação da União a estados e municípios pelos cortes de 2022 no ICMS, foi proposto pelo líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu. Na Saúde, o rombo será de R$ 18 bilhões. A aprovação foi um favor ao governo, que já havia ensaiado, junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), outras propostas que buscavam permitir a destinação de verbas abaixo do piso mínimo para as mesmas áreas.
O novo artigo é consequência direta do novo arcabouço fiscal aprovado pelo governo. Primeiro, porque o arcabouço impõe a necessidade do “déficit zero” para o governo, o que exige cortes avassaladores nas despesas. Para isso, o governo começa justamente pelos serviços mais essenciais para o povo e vistos como “obstáculos” pelas classes dominantes, como Saúde e Educação.
Segundo, porque o arcabouço, na substituição do antigo “teto de gastos”, trouxe de volta os pisos constitucionais da Saúde e Educação, calculado a partir da Receita Corrente Líquida (RCL), e que haviam sido extinguidos pelo antigo teto. Com a aprovação do artigo, o governo se isenta da responsabilidade de pagar os mínimos necessários para cada área. É a comprovação de que as medidas são idênticas em conteúdo, com leves mudanças nos caminhos tomados para cortar os direitos e serviços básicos.
De acordo com os pisos constitucionais, o piso da Saúde deve ser equivalente a 15% da RCL. O da Educação, 18%. A proposta de Zeca Dirceu, contudo, busca usar a RCL da Lei Orçamentária sancionada em janeiro como referência para o piso. Acontece que a receita de janeiro 2022 foi estimada em R$ 1,1 trilhão, enquanto a RCL do relatório bimestral do orçamento apresentado em 22 de julho apresenta receitas de R$ 1,2 trilhão. Os diferentes resultados calculados a partir dos 15% para cada receita geram uma diferença de R$ 18 bilhões que deixará de ser repassado à Saúde com a aprovação da medida.
A aprovação do artigo foi um agrado ao governo, que já buscava formas de não ter que arcar com os pisos para Saúde e Educação como forma de reduzir as “despesas” do Estado e conseguir arcar com o pagamento de juros e amortizações da saqueadora dívida externa e outros gastos do governo direcionados ao latifúndio, grande burguesia e imperialistas. No dia 31 de agosto, a ministra do Planejamento e Orçamento Simone Tebet comentou que o pagamento dos pisos pelo governo geraria um “apagão” nos outros ministérios. Além disso, o governo já havia proposto ao TCU a redução dos pisos constitucionais. O argumento é que, assim como os limites máximos foram reajustados com o arcabouço, os pisos também devem sofrer alteração (no caso, redução).