No dia 13 de agosto, se encerraram as prévias das eleições presidenciais na Argentina. O período e os resultados da farsa eleitoral trouxeram à tona uma situação explosiva no país, com um abstencionismo recorde, o assassinato de um manifestante pela polícia durante uma manifestação contra a farsa eleitoral, e saída à frente de um candidato de extrema-direita. Com essas eleições, foram definidos os candidatos a serem apresentados pelos diferentes partidos nas eleições gerais de outubro.
Apesar do alarde da imprensa monopolista, o verdadeiro vencedor das primárias foi o boicote eleitoral, mesmo com obrigatoriedade de voto no país. A participação nas eleições foi de 69,6%, uma das mais baixas em eleições presidenciais desde a dita “redemocratização”, em 1983, e 7% a menos que em 2019. Além disso, essas eleições registraram 4,78% de votos em branco e 1,21% de votos nulos, totalizando 36,39% de pessoas que boicotaram as eleições.
Perdendo para o boicote eleitoral, o candidato que saiu à frente no jogo de cartas marcadas da farsa eleitoral foi Javier Milei, de extrema-direita. Apesar de ser o “mais votado”, Javier Milei teve apenas 30,1% dos votos.
O deputado ultrarreacionário montou seu discurso em uma vã tentativa de aproveitar do rechaço popular à velha ordem para lançar-se como preferido. O discurso de campanha de Milei centrou-se na estória de “ser diferente de tudo o que está por aí” e ser “contra a casta política”, apesar ter sido citado em casos de corrupção em 2021.
Reacionário e lacaio
A campanha de Milei foi marcada também pela garantia de antemão em manter a Argentina subjugada aos interesses do imperialismo e cumprir com os ditames impostos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). “O FMI não deveria ter problemas com o programa que apresentamos, porque propomos um ajuste fiscal muito mais profundo do que o que eles [outros candidatos e partidos] propõem”, afirmou o candidato.
Já em relação à dívida astronômica do País, o deputado afirmou ser “possível pagar”. O possível governo de Milei promete, assim, a manutenção da alta inflação e do saqueio generalizado às riquezas da Argentina, com o aprofundamento subsequente da miséria e exploração das massas.
Mesmo com todas as promessas ao imperialismo de manter o País nas mesmas condições, Milei afirmou ser diferente da política “peronista” e “macrista”. Talvez a diferença seja pelo nível de polêmica levantado pelo candidato, que relativizou durante a campanha a possibilidade de tráfico de órgãos e de pessoas e que, tendo um filho, talvez o vendesse.
No Brasil, Javier é conhecido por nutrir apoio da família Bolsonaro, atualmente atolada até o pescoço nas denúncias de golpismo e venda ilegal de joias. O parlamentar argentino esteve em junho reunido com Eduardo Bolsonaro em um fórum em São Paulo.
O deputado argentino Javier Milei com sua irmã Karina e Eduardo Bolsonaro, em São Paulo. Foto: RR.SS.
Povo rejeita velha ordem de exploração e opressão
A vitória de Pirro do candidato de extrema-direita, o palhaço Javier Milei, revela o nível de crise política e econômica que se instaurou na Argentina, reflexo da crise em toda a América Latina. Na Argentina, a inflação atingiu os valores de 110% em 2022. A dívida externa do País é calculada em 44,5 bilhões de dólares (R$ 221 bilhões). Já a pobreza no país atualmente atinge 40% da população.
Esses índices são responsáveis também pela crescente desmoralização do regime político no País, incapaz de solucionar a crise brutal que se instaurou e reverter o quadro de piora nas condições de vida das massas. No quadro eleitoral, sintoma dessa situação é o ascenso da extrema-direita, sobretudo de figuras como Javier Milei, alçado sobre a insatisfação generalizada e o discurso demagógico voltado ao “ataque às instituições”.
Por outro lado, a vitória da extrema-direita na corrida eleitoral não é sinal da generalização do fenômeno entre as massas, como prova o boicote ao processo eleitoral, que atingiu nível recorde desde a redemocratização do país. Dias antes da eleição, uma manifestação em Buenos Aires rechaçou o processo eleitoral farsesco e a crise no país. O protesto encerrou com o assassinato do ativista e jornalista Facundo Morales Schoenfeld pela polícia.
No dia seguinte, uma nova manifestação massiva condenou a brutalidade policial com vigorosos confrontos de rua entre manifestantes e as tropas de repressão. O Centro de Monitoramento da Polícia Municipal foi alvejado com pedras e coquetéis molotovs e pichações contra a polícia foram realizadas.
Um fenômeno no subcontinente
O mesmo fenômeno se repete em todo o subcontinente latinoamericano, que se vê abalado por sérias crises políticas e econômicas. A fome atingiu um total de 56,5 milhões de pessoas na América Latina, segundo o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2021. Já a dívida da região da América Latina e Caribe total subiu para 5,8 trilhões de dólares – ou 117% do PIB na região como um todo, em 2022. A estimativa é de que a desaceleração da economia na América Latina chegue a uma taxa de 1,3%, e segundo o Banco Mundial, está prevista uma inflação de 9,9% para 2023.
A “democracia” burguesa também se encontra desmoralizada em todo o subcontinente. Segundo pesquisa do Latinobarómetro, a insatisfação com o regime político atinge cerca de 69% dos entrevistados. Por outro lado,a aversão a golpes e regimes militares atinge cerca de 61% de latino-americanos e 63% no Brasil.
Cada vez mais, escancara-se o nível de insatisfação popular com a velha ordem de exploração e opressão.