Marcha pelos 20 anos do assassinato de Maximiliano Kosteki e Darío Santillán. Foto: Reprodução
Milhares de argentinos marcharam na ponte Pueyrredón, em Buenos Aires, no dia 25 de junho de 2022, data em que completavam 20 anos desde o assassinato de dois jovens militantes, Maximiliano Kosteki e Darío Santillán, nas rebeliões populares de 2002 na Argentina. Também ocorreram grandes marchas em Mar del Plata e Córdoba.
Marcha pelos 20 anos do assassinato de Maximiliano Kosteki e Darío Santillán. Foto: Reprodução
As massas ligaram a situação da grave crise e a rebelião popular dos anos 2000 com a atual crise e destacaram que a luta das massas no país continua sendo por terra, trabalho e moradia. Os manifestantes também denunciam que o novo acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) firmado pelo governo reacionário de Alberto Fernández aprofundará a situação de miséria do povo, fruto da crise econômica, assim como naquela época, e exigem que não seja paga a dívida externa fraudulenta.
Além disso, destacam que o assassinato cometido contra Darío e Maxi não foi obra de um ou outro policial, mas sim um crime do velho Estado. Nesse sentido, também se exige punição aos policiais responsáveis pelos assassinatos de Facundo Astudillo Castro, após ter sido detido pela polícia de Buenos Aires durante a quarentena de 2020; por Luis Armando Espinoza, desaparecido e assassinado pela polícia de Tucumán; por Josué Lago da comunidade Qom de Barrio Los Silos no Chaco; por Lautaro Rose assassinado pela polícia de Corrientes há oito meses, e por todas os jovens assassinados pela repressão.
Manifestantes rememoram os assassinatos de Darío e Maxi em Buenos Aires. Foto: ANRed
A grande manifestação na capital Buenos Aires percorreu o mesmo caminho que a manifestação de 2002 fez: bloqueou a ponte Pueyrredón e rumou até a estação Avellaneda de trem. Após o assassinato dos dois jovens lutadores, a estação foi rebatizada “Maximiliano Kosteki e Darío Santillán”.
Em Mar Del Plata, uma manifestação com centenas de pessoas foi realizada na Ponte das Américas. Os manifestantes denunciaram que “enquanto os perpetradores foram condenados, os então oficiais do governo nacional que deram a ordem de reprimir ainda não foram julgados. Darío e Maxi tornaram-se a expressão mais genuína de uma juventude militante, pronta para lutar por uma sociedade mais justa. Ambos são símbolos de luta que o povo fez seu após seus assassinatos”. O ato exigiu a responsabilização do então presidente Eduardo Duhalde e outros políticos reacionários da época, como Alfredo Atanasof (ex-chefe de gabinete de ministros), Juan José Álvarez (ex-ministro da “Justiça, Segurança e Direitos Humanos”), entre outros.
Cartazes escritos “que se vão todos”, em referência aos governantes atuais e antigos do velho Estado. Essa palavra de ordem foi muito utilizada nas rebeliões populares dos anos 2000. Foto: Qué Digital
Ao mesmo tempo, destacaram que o massacre ocorreu quando o governo de Duhalde tentou reprimir as massas que exigiam trabalho genuíno, “as mesmas bandeiras que ainda hoje são levantadas, diante de uma pobreza em torno de 50%, com salários abaixo do limiar da pobreza, desemprego e precariedade crescente”.
Manifestante segura foto com as imagens do assassinato de Maxi e Darío e o então presidente Eduardo Duhalde. Foto: Qué Digital
Manifestante ergue cartaz com fotos de políticos reacionários e policiais responsáveis pelo assassinato dos jovens. Foto: Qué Digital
Em Córdoba, foi realizada uma marcha na Avenida General Paz e La Tablada, no centro da cidade, em direção à esplanada do Patio Olmos, onde ocorreu uma manifestação que contou com a presença do pai de Darío, Alberto Santillán.
O que foi o massacre de Avellaneda?
Sargento Gastón Sierra dá risada enquanto arrasta o corpo de Maximiliano Koteski. Foto: Sergio Kowalewski
O “massacre de Avellaneda” se deu em um contexto de grave crise geral do capitalismo burocrático argentino, aconteceu meio ano depois de uma grandiosa rebelião popular de dezembro de 2001, quando o velho Estado foi obrigado a decretar Estado de Sítio em todo o território nacional. Mais de 30 manifestantes foram assassinados pela polícia no curso de dois dias, e o então presidente reacionário Fernando de la Rúa teve que fugir da Casa Rosada de helicóptero.
A situação de protesto popular não mudou no ano de 2002. No primeiro trimestre daquele ano o PIB do país caiu 18% e mais de 40% da população se encontrava desempregada e 51,4% abaixo da linha de pobreza. O número de indigentes aumentou 42,5% (cerca de 7,8 milhões de pessoas) nos primeiros cinco meses daquele ano.
Imagem da manifestação próxima à ponte Pueyrredón, em 2002. Foto: Enrique Cabrera/Télam
Darío Santillán e Maximiliano Kosteki se encontravam, como outros milhões de argentinos, ativos na luta popular por reivindicações econômicas pelo fim da crise e também políticas, em um período que desde anciãos, crianças e todas as classes oprimidas viram ruir o velho Estado argentino diante dos seus olhos e tomaram as ruas enfrentando a repressão brutal.
Comissário Fanchiotti, responsável pela operação de repressão à manifestação. Foto: Pepe Mateos/ Clarín
No dia 26/06 de 2002, milhares de massas se mobilizaram para bloquear a ponte Pueyrredón, em Buenos Aires. Temperados no embate da luta de classes, os manifestantes já se encontravam prontos para se confrontar pelo objetivo de bloquear a ponte. A polícia caiu com brutalidade furiosa contra os manifestantes, que tiveram de se dispersar. Darío Santillán e Maximiliano Kosteki, que se encontravam na linha de frente e principalmente Darío, que era dirigente de um movimento de desempregados, foram perseguidos pessoalmente pelo comissário de polícia Alfredo Fanchiotti e outros policiais enquanto rumavam à estação Avellaneda.
Darío checa o pulso de Maxi. Foto: Pepe Mateos/Clarín
O primeiro a ser alvejado foi Maximiliano Kosteki, que ficou caído no chão da estação. Dário então adentra a estação e checa seu pulso mas, ainda perseguido pelos policiais, continua correndo, até ser ele também alvejado. Dário então é arrastado pelo chão pelos policiais, fazendo-o passar pelo sangue de Maximiliano, até ser atirado contra o chão da rua. Os policiais tentam fazê-lo levantar, porém ele já perdeu muito sangue, e é colocado em uma caminhonete branca, que fica manchada em vermelho.
Sargento Quevedo e comissário Fanchiotti. Atrás deles, Santillán, sangrando no chão. Foto: Pepe Mateos/Clarín.
A morte dos dois jovens, que foi gravada minuciosamente em vídeo e com fotos (algo incomum para a época), causou uma grande comoção nacional e foi um elemento que contribuiu para que as lutas populares alcançassem o auge em 2002.
Policiais arrastam Darío sobre o sangue de Maxi. Foto: Pepe Mateos/Clarín.
Darío perde muito sangue. Foto: Sergio Kowalewski
Maxi é colocado em uma caçamba de camioneta junto de outra vítima. Foto: Pepe Mateos/Clarín.
Antes e agora: a luta contra a crise do capitalismo burocrático
Foi ressaltado por todas as massas presentes nas manifestações que a situação de miséria, desemprego e repressão policial não mudou desde então. Agora, assim como naquela época, o mundo enfrenta uma grande crise de superprodução relativa que deságua nos países de capitalismo burocrático como uma crise ainda maior, devido à dominação econômica do país latino-americano aos investimentos e empréstimos com os países imperialistas.
Os empréstimos com o FMI desempenham na Argentina um grande papel nas crises, tendo em vista que o país é e tem sido há décadas o principal devedor do fundo imperialista. No mais recente acordo com o FMI de renegociação da dívida 44 bilhões de dólares, o velho Estado argentino teve de concordar com uma série de metas impostas pelo FMI, como uma meta de inflação de no máximo 48%.
de janeiro a maio os preços na Argentina subiram 29,3% e, de acordo com as projeções, a inflação pode superar os 75% neste ano. A inflação argentina, entre as mais altas da América Latina, também registrou um aumento anual de 58% em abril de 2022 e um aumento mensal de 6%, segundo o Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec).
Caso o país não cumpra com as metas estabelecidas com o FMI (nas quais já estão incluídos os cortes de diversos auxílios ao povo), a Argentina não conseguirá ter acesso aos empréstimos, o que aprofundará ainda mais a crise geral e a retirada de direitos do povo.
Tudo isso cria as condições objetivas para uma nova onda de rebelião popular no país, como as que já estão se sucedendo em outros lugares da América Latina, como as recentes greves gerais no Equador e no Peru.