Pistoleiros divulgaram fotos em torno de uma mesa com armas longas e munição. As munições formam um “22” na mesa, número eleitoral do fascista Jair Bolsonaro (PL). Foto: Reprodução
Tropas particulares do latifúndio estão aterrorizando mais de 20 comunidades camponesas através de invasões, destruição dos pertences dos trabalhadores, perseguições e ameaças de mortes. A atuação do bando de extrema-direita ocorre nos municípios de Correntina e Santa Maria da Vitória, no Cerrado baiano. Em uma das mais recentes ações, os reacionários divulgaram fotos com extenso arsenal bélico, com munições que formavam o número “22” (em clara referência ao número ao ultrarreacionário Jair Bolsonaro, candidato derrotado). Os ataques ocorrem mesmo após os camponeses terem enviado ao governo oportunista de Rui Costa (PT) uma carta em que demonstram como se organiza o bando paramilitar, que reúne pelo menos 18 homens.
As terras da região são cobiçadas por produtores de algodão e soja vinculados à empresas estrangeiras. Além disso, há um crescente desmatamento por tratores de esteira e correntão, que são queimadas nas veredas: somente em 2021 as comunidades de fundo e fecho de pasto concentraram 5% de todos os conflitos com fogo do país, apesar de se encontrarem somente no estado da Bahia. Além disso, há uso indiscriminado das fontes de água pelo latifúndio. As principais comunidades atacadas são Capão do Modesto, Cupim, Vereda da Felicidade, Bois Arriba e Abaixo e Porcos, Guará e Pombas.
Pelo menos três incêndios de média e grande proporções foram provocados em uma semana. Foto: Thomas Bauer
Entre 18 e 19 de setembro, o grupo paramilitar do latifúndio destruiu casas de abrigo e ranchos do Fecho do Cupim. No Capão do Modesto, em 21/09, pistoleiros assaltaram o carro de um camponês quando o mesmo voltava para casa, acompanhado do pai, mãe, mulher e filha. De acordo com a denúncia, homens fortemente armados na carona de duas motocicletas perseguiram o carro por cerca de quatro quilômetros e ameaçaram atirar diversas vezes. Na ocasião, a mãe do camponês chegou a desmaiar. Em outra oportunidade, os criminosos invadiram sua residência, mas ele não estava em casa. O camponês relata que os criminosos bolsonaristas também ameaçam sua mulher e seus filhos. O camponês denuncia que as perseguições aumentaram quando se tornou membro da diretoria de uma das associações de fecho de pasto da região há oito anos.
Pistoleiros derrubaram placas sinalizando as terras dos camponeses. Foto: Associação de Fundo e Fecho de Pasto
Em outro atentado, ocorrido no dia 13 de outubro, um camponês foi abordado por cinco homens armados ao sair de casa na madrugada para levar 40 cabeças de gado para o fecho de pasto. Um deles começou a insultá-lo, deu um tiro para o alto e mandou ele tirar o gado dali. Apontando a arma para a cabeça do camponês, um dos bandidos lhe mandou abaixar a cabeça e não olhar para ninguém. Segundo a vítima, alguns dos algozes utilizavam gandolas (blusa de combate, peça de vestuário utilizada na parte superior do corpo por soldados do Exército). O único pistoleiro que o camponês conseguiu ver de relance era desconhecido na região. Ele disse que foi enviado de outro estado para “resolver” a situação em Correntina. O bandido ainda mandou o camponês dizer aos presidentes das associações de fundo e fecho de pasto que quem manda naquela terra é ele e seus comparsas. Das quatro dezenas de animais que levou, o camponês só conseguiu levar dois para casa. Os demais morreram no caminho ou se dispersaram no cerrado.
Camponês encontrou um de seus animais mortos. Foto: Reprodução
No início de novembro, pistoleiros divulgaram fotos em grupos de WhatsApp da região em torno de uma mesa com armas longas e munição. As munições formam um “22” na mesa, número eleitoral do fascista Jair Bolsonaro (PL).
O mais recente ataque ocorreu no dia 06/11 às 10 horas da manhã, no Capão do Modesto. Dois idosos, de 81 e 69 anos, voltavam de campear as 10 cabeças de gado que haviam solto há dias no fecho. Um motoqueiro e um outro homem cortando o arame e destruindo a cerca instalada para os animais da comunidade não fugirem. Os dois, parte da tropa paramilitar contratada pelo latifúndio para aterrorizar as comunidades, perguntaram de quem era o gado que estava ali. Após o camponês mais velho afirmar que era o dono, o pistoleiro disse que “ia matar tudo, animais e seus donos”, caso os bois não fossem retirados do local. Depois, com um pedaço de pau retirado da cerca na mão, arremessou a madeira em direção ao idoso. Berrando e insultando os camponeses, o bandido mandou os dois se retirarem. A essa altura, apontava o rifle para o camponês mais idoso.
Os fustigamentos iniciaram na década de 80 com a apropriação de terras públicas por grileiros, tiveram recrudescimento nos anos 2000, quando latifundiários da região passaram a reivindicar a titularidade de terras preservadas na zona rural de Correntina. Isto porque o latifúndio necessita manter áreas preservadas para expandir a sua produção. Especificamente no Cerrado, os latifundiários devem manter (de acordo com o Código Florestal brasileiro) ao menos 20% das terras com vegetação nativa. No entanto, como não é exigido que a reserva esteja no perímetro da fazenda, bastando somente que seja do mesmo bioma, o latifúndio desmata totalmente suas propriedades e avança sobre as terras preservadas pelos camponeses afirmando que são estes que estão destruindo a vegetação nativa.
Os camponeses denunciam o latifundiário, grileiro e presidente da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa) Luiz Carlos Bergamaschi e a empresa Agropecuária Sementes Talisma Ltda como principal mandante dos atentados. Ele é o titular de 14 fazendas nos arredores dos Fechos Capão do Modesto e Porcos-Guará-Pombas; apenas uma de suas supostas fazendas – a Fazenda Vale do Correntina – soma 1.142 hectares de terra. Foi no ano de 2008 que o grupo de latifundiários grileiros encabeçado por Bergamaschi foi se apropriando de papéis relacionados a uma suposta fazenda denominada Riacho do Capão. A primeira matrícula é de 2006. Após passarem quatro anos os pistoleiros começaram a aparecer na área. De acordo com relatos dos camponeses, em 2013, os latifundiários contrataram uma empresa de segurança do ex-policial militar Carlos Erlani, famoso na região por ordenar grupos de pistolagem. A partir de então, os camponeses começaram a sofrer ameaças e agressões constantemente.
Frente às provocações do latifúndio, os camponeses, que não se moveram sequer um centímetro de suas terras, iniciaram uma campanha que reúne 56 movimentos, organizações e redes sociais. A campanha, intitulada “Campanha Nacional em Defesa do Cerrado”, encaminhou um requerimento pedindo providências urgentes ao governo oportunista de Rui Costa/PT. No entanto, de acordo com a CPT, “até hoje nenhuma providência efetiva foi tomada para acabar com os conflitos”. Contatados pelo portal Meus Sertões, através da assessoria de imprensa, o governo do oportunista se recusou a responder e se mantém omisso diante de fatos tão graves.
BOLSONARO IMPULSIONOU TERRORISMO CONTRA CAMPONESES
Essas ações contra movimentos camponeses são resultado da pregação do genocida Bolsonaro, contra os camponeses pobres e a luta pela terra, tachada por ele como “terrorismo”. Com isso, o verdadeiro terrorismo, o de extrema-direita, o latifúndio é impulsionado para fazer mais e mais brutais atentados contra os pobres do campo.
Outros ataques do latifúndio contra os camponeses também ocorreram nos últimos meses. No dia 12 de novembro, um grupo da extrema-direita realizou um ataque contra o Centro de Formação Paulo Freire do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), localizado no assentamento Normandia, em Caruaru (PE). Os bolsonaristas invadiram e incendiaram a casa da coordenadora do movimento e picharam suásticas e a palavra “mito” nas paredes do centro. O atentado político foi realizado por pelo menos quatro delinquentes.
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Já na noite de 20 de outubro, a Área Revolucionária Cleomar Rodrigues, município de Pedras de Maria da Cruz (Norte de Minas), organizada pela Liga dos Camponeses Pobres (LCP), foi alvo de um atentado político. A ação criminosa consistiu em um incêndio contra a casa de um morador, na entrada da área, provocado através de uma fresta. Roupas e pertences do morador e materiais de propaganda da Assembleia Popular (AP) foram destruídos pelas chamas.
Casa de camponês foi incendiada pela extrema-direita. Foto: Banco de Dados AND
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Em 1º de maio de 2021, na abertura da exposição agropecuária em Uberaba, o fascista Bolsonaro louvou os latifundiários ladrões de terra da União e atacou a LCP “O nosso governo poucas invasões tivemos (sic) no campo, … Se bem que, deixo claro, temos um foco mais grave que os malefícios causados pelo MST em Rondônia. Nós temos aqui um exemplo da LCP, Liga dos Camponeses Pobres, que tem levado terror ao campo naquele estado. Estive reunido esta semana com o governador, ministro da justiça, para traçarmos uma estratégia de como conter este terrorismo, que obviamente começa no campo e com toda certeza pode ir pra cidade.”
Na semana seguinte, durante a inauguração da ponte sobre o rio Madeira, divisa de Rondônia e Acre, Bolsonaro mais uma vez voltou a atacar e ameaçar a LCP afirmando que “não tem espaço aqui pra grupos terroristas. Nós temos meios de fazê-los entrar no eixo e respeitar a lei.” Em resposta, a LCP afirmou decididamente, em nota pública disponível no portal Resistência Camponesa: “Terroristas são os latifundiários ladrões de terra, que com seus bandos armados de pistoleiros ou se utilizando diretamente das próprias forças policiais a seu serviço, esses sim, causam verdadeiro terror no campo, cometendo toda sorte de crimes e atrocidades, assassinando impunemente camponeses e demais lutadores do povo”. E destacou ainda que é preciso mobilização das massas “em lutas cada vez mais contundentes” para “barrar estes sinistros planos da reação”.
Os camponeses ainda declaram que os ataques não vão parar a luta pela terra, denunciando que: “Buscam tachar essa luta como guerrilha, pois bem, se assim querem, quanto mais repressão, mais ódio de classe e maior resistência”.
O VIL PAPEL DO OPORTUNISMO NA BAHIA
A Bahia é, de acordo com o relatório de conflitos no campo da CPT de 2021, o terceiro estado no número de conflitos agrários no Brasil. Já segundo o Mapa da Violência, a Bahia lidera nacionalmente por três anos consecutivos o número de mortes violentas, contabilizado a partir dos dados de homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais. A Polícia Militar (PM) da Bahia é a mais letal de todos os nove estados do Nordeste, sendo ainda líder em mortes por chacina. Em 2020, a Bahia foi o estado mais letal da região Nordeste e um dos mais letais do país (1.137 mortes) e com maior índice de chacinas (74 registros) sendo 100% das vítimas de ação policial em Salvador pessoas negras. Tamanha conivência é sabida e denunciada pelos camponeses do Cerrado baiano: “A gente está sofrendo. A gente não pode contar com as autoridades. A gente sabe que o Estado está contra a gente, o estado da Bahia vive violentando os nossos direitos”, disse um dos fecheiros que teve sua comunidade atacada.
De acordo com o artigo O fracasso do oportunismo na Bahia: “A Bahia em 2016, contabilizou 457 mortos por intervenção policial no estado, é o estado com maior número de homicídios desse tipo, na frente inclusive do Rio de Janeiro e São Paulo, sendo estes dados referentes somente aos assassinatos registrados (ou seja, pode estar subestimado).”. São números como estes que demonstram em prática a marcante frase do governador Rui Costa, em coletiva após a chacina do Cabula, de que a polícia militar é “(…) como um artilheiro frente ao gol que tenta decidir, em alguns segundos, como é que ele vai botar a bola dentro do gol, pra fazer o gol. (…) Nós defendemos, assim como um bom artilheiro, acertar mais do que errar. E vocês (PM’s) terão sempre um governador disposto a não medir esforços, a defender desde o praça ao oficial, a todos que agirem com a energia necessária” .
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O artigo finaliza: “Um inevitável levantamento de massas em luta pela terra se avizinha e promete sacudir toda a região. No sul do estado, cada vez mais mobilizações de indígenas tem ocorrido e em alguns casos em aliança com camponeses pobres. Trancamentos de estradas, barricadas, ocupações e ofensivas contra propriedades de latifundiários ganham força principalmente no oeste e norte do estado, as massas camponesas e quilombolas, diante da crise, passam a ver a tomada de terras como única forma de sobrevivência, e têm adotado formas cada vez mais radicais e belicosas de organização.”.