Camponeses bloqueiam BA-156 em protesto contra mineradora estrangeira. Foto: Banco de Dados AND
Camponeses do município Licínio de Almeida, no centro-sul da Bahia, bloqueiam, desde 26 de setembro, a Rodovia BA-156, que liga a cidade ao distrito de Brejinho das Ametistas. A estrada é utilizada pela mineradora responsável pela mina Pedra de Ferro, a Bahia Mineração (Bamin), pertencente ao Eurasian Resources Group (ERG), grupo de oligarcas do Cazaquistão com sede em Luxemburgo. Segundo os camponeses, o tráfego dos caminhões da Bamin levanta e espalha poeira de pó de minério, o que vem afetando a saúde da população e a produção dos camponeses, como também o solo e as águas das comunidades.
Os camponeses afirmam que, durante todo o período de protesto, que segue e já completa mais de um mês, em nenhum momento a mineradora ou seus representantes ouviram as queixas da população. Os camponeses denunciaram também o caso ao Ministério Público de Jacaraci e à Promotoria Regional de Meio Ambiente, e solicitaram a esses órgãos e à câmara de vereadores que convocassem uma audiência pública com o poder público, os órgãos de fiscalização competentes, como o Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), a Bamin e as comunidades, mas nenhuma resposta foi dada.
A mineradora atua na região desde dezembro de 2020, e desde então enfrenta resistência camponesa. As primeiras grandes mobilizações ocorreram em 2021. Naquela época, um grande protesto exigindo uma solução para os graves impactos que o minério causa sobre a saúde das famílias reuniu 400 moradores das comunidades da região.
Camponeses se mobilizam contra mineradora. Foto: Banco de Dados AND
VELHO ESTADO E MINERADORA PLANEJAM MAIS EXPLORAÇÃO E ENTREGUISMO
A Bamin extrai, atualmente, aproximadamente um milhão de toneladas de minério por ano, em uma operação piloto, que pode crescer mais de vinte vezes com a conclusão da Ferrovia de Integração Oeste Leste (Fiol), arrematada junto ao governo federal pela própria empresa, e do Porto Sul, em Ilhéus, que também está sob responsabilidade da mineradora. O lucro da Bamin vai todo para seus compradores, isto é, grandes burgueses cazaques.
Segundo o geólogo Pedro Jacobi, “ao exportarmos minério bruto, sem valor agregado, estamos repassando todo o lucro da cadeia produtiva ao país comprador que transformará o minério de ferro em ferro gusa, aço e, depois, em produtos industrializados que retornarão ao Brasil com lucros embutidos simplesmente gigantescos”. Ele prossegue: “Lucros, é claro, que nós estamos deixando de ganhar.”.
CAMPONESES RESISTEM
Enquanto não há um ramal ferroviário para embarque do minério extraído diretamente na mina, o produto está sendo escoado por 41 quilômetros de caminhões até Licínio de Almeida, próximo do povoado onde ocorre o embarque nos trens da Ferrovia Centro Atlântica. Com a estrada bloqueada pelos camponeses, a mineradora chega aos trens por outra rodovia, também próxima às comunidades.
Com a persistência e desenvolvimento das manifestações, no dia 11/10, a Bamin demitiu funcionários da empresa terceirizada RD. Entre eles estava um camponês morador de uma das comunidades cujos familiares participam da mobilização. Se tratou de uma vã tentativa de intimidar e dividir os camponeses, que não logrou desmobilizá-los da justa luta.
Os camponeses, enfrentando o velho Estado burocrático-latifundiário e os seguidos ataques da mineradora, elevaram a combatividade de sua luta. No dia 24/10, mais uma via de transporte da Bamin, a linha férrea que corta o município e segue em direção ao porto de Tubarão, no Espírito Santo, onde a mineradora exporta sua produção para o exterior, foi interditada pelas massas. Uma assembleia popular ocorreu em cima dos trilhos durante a manifestação.
Camponeses bloqueiam linha férrea utilizada pela Bamin. Foto: Banco de Dados AND
Como resultado da assembleia, os camponeses, em manifesto, destacaram suas reivindicações imediatas, são elas: a realização de audiência pública para debater os impactos da mineração com toda a população do município, o asfaltamento imediato da BA-156, a fiscalização e controle do uso da água que vem sendo usada de forma indiscriminada pela Bamin, solução do assoreamento dos rios da região provocados pelo uso das estradas pela mineradora, apoio à economia camponesa, geração de emprego e renda e, por fim, a readmissão dos trabalhadores demitidos, manutenção de todos os empregos no município de Licínio de Almeida e ampliação das vagas de emprego para o município. O manifesto pode ser lido na íntegra aqui.
MINERAÇÃO E CAPITALISMO BUROCRÁTICO
Os grandes desastres de mineradoras e barragens que vitimam milhares ano após ano são consequências da exploração desenfreada do povo brasileiro e da riqueza do nosso solo. Outro grande desastre que gerou comoção nacional, deixando evidente a condição de país dominado, ocorreu em Mariana e Brumadinho, no crime promovido pela assassina e terrorista Vale.
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De acordo com o artigo Capitalismo burocrático e mineração, publicado na edição nº 181 de AND, “no processo de desenvolvimento do capitalismo burocrático nos países semicoloniais, se reservou um papel especial para a exploração da mineração, pois essa atividade se encontra amplamente dominada por monopólios transnacionais ou por grandes empresas de capital nacional/estatal, porém profundamente integradas à dominação imperialista, ou seja, realizam o trabalho duro da extração, mas deixam as etapas que agregam maior valor ao produto a cargo da exploração estrangeira.”.
O artigo A perpetuação da mineração semicolonial: Brasil, um país saqueado pelos monopólios, publicado na edição nº 229 de AND, também exemplifica a relação do capitalismo burocrático brasileiro e a mineração: “A extração e exportação de minérios para os monopólios que produzirão mercadorias de alta tecnologia nos mantém numa relação de atraso. Ao não industrializar os minérios e prescindir da tarefa de desenvolver uma indústria de manufaturas de alto valor agregado, os minérios simplesmente são exportados a um valor baixo aos países imperialistas, que utilizam-se deles para desenvolver mercadorias de alto valor agregado e de alta tecnologia, que são exportadas novamente aos nossos países dominados.”.
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O artigo ainda aponta que a mineração não é específica a um governo ou outro, mas parte integrante da política latifundista aplicada por todos os governos de turno. Trata-se de uma atividade de exploração necessária para atender aos interesses do velho Estado burocrático-latifundiário, lacaio do imperialismo, principalmente norte americano: “Os governos que se revezam obrigatoriamente reproduzem essas relações, não podem alterá-las sem destruir completamente os sistemas econômico, político e a burocracia estatal que lhes é anexa, substituí-los por novos, apoiando-se nas massas populares e confiando plenamente nelas. Em suma, a Revolução de Nova Democracia.”.