No dia 6 de abril de 2017, a proposta da Base Nacional Comum Curricular foi entregue pelo MEC ao Conselho Nacional de Educação. De acordo com a Lei 9131/95 coube ao CNE, fazer a apreciação da proposta da BNCC para a produção de um projeto de resolução que futuramente seria aplicado em todo o país.
O projeto contava com uma mudança na grade curricular, adicionando disciplinas conhecidas como “Itinerários Formativos”. O objetivo do MEC era “Converter o ensino em algo mais atrativo aos estudantes”. Assim, adicionando novas aulas com temas diversos que deveriam ser escolhidos pelas instituições de ensino.
A base também contava com a integralização total do ensino público, elevando a carga horária em até 10 aulas diárias. Algo que já estava sendo aplicado no estado do Ceará há alguns anos.
O novo projeto foi alvo dos estudantes brasileiros, que como forma de barrar o projeto, iniciaram uma grande onda nacional de ocupações em suas escolas, o que retardou o avanço da proposta. A modo de ignorar totalmente a vontade popular, a dita reforma foi novamente resgatada pelo ultrarreacionário governo de Jair Bolsonaro, e continuada pelo governo oportunista de Luíz Inácio. Organizações estudantis argumentam que o ensino integral, juntamente com a nova BNCC aumentaria ainda mais a evasão escolar e a secular desigualdade entre ensino público e privado.
Sua aplicação em Barro
Em Barro, uma cidade do interior do Ceará, a aplicação do pacote de itinerários e ensino Integral ocasionou uma total desordem na educação municipal.
A situação dos estudantes, já muito precarizada, ficou ainda pior. No ano de 2023, os alunos da escola Justino Alves Feitosa, anexo da escola César Cals, passaram todo o ano letivo estudando em um prédio que estava literalmente caindo aos pedaços, suportando calor excessivo o dia todo e uma merenda de péssima qualidade.
Essa mesma cena se repete até hoje na sede da escola, onde o ensino integral foi aplicado nas séries de 8° ano.
Uma “escuta” surda
Dos dias 20 a 25 de maio, o governo do estado do Ceará realizou um programa chamado de “semana da escuta”. Nele, foram coletadas a opinião dos estudantes sobre a atual situação da escola e o resultado foi único. O rechaço do ensino integral, e dos Itinerários formativos!
A grade curricular da escola é composta pelas matérias da BNCC e itinerários, sendo eles: Programa Inteligentes, Cultura digital e Projeto Caminhar (relativo ao projeto de vida).
Os estudantes questionaram o porquê de tantas aulas que “não possuem nenhum sentido” enquanto estão atrasados no conteúdo das matérias básicas (muitos conteúdos das avaliações externas, não chegaram a ser ensinados). O sistema de “notório saber” também foi criticado, pois muitos professores ministram aulas em matérias que sequer são formados.
Entretanto, mesmo aparentemente se esforçando para democratizar a educação, a Prefeitura de Barros continua a aplicar as mesmas políticas que foram tão criticadas pelos estudantes.
Como consequência da imposição do projeto, a sexta séria da Escola César Cals foi forçosamente fechada e os alunos foram transferidos para a Escola Gilberto Leite de Aquino como requisito para completar o projeto e integralização do 8° ano.
Histórico de repressão ao movimento estudantil
Em setembro de 2022, surgiu na Escola César Cals um grêmio estudantil de linha democrática. A partir daí, um movimento combativo emergiu dentro da escola. Os ativistas do grêmio tiveram que enfrentar uma quantidade imensurável de ataques do corpo gestor,
Foi relatado ao AND que, no mês de maio passado, foi feita uma rifa com o intuito de consertar um congelador do Anexo Justino Alves. Isso fez toda a escola se mobilizar para essa campanha, e em menos de uma semana foram arrecadados mais de R$ 700.
Entretanto, a “oposição política“ aproveitou desse acontecimento para fazer um palanque eleitoral de encontro ao atual prefeito. E como consequência, a Secretaria de Educação proibiu a continuidade das vendas e obrigou o grêmio estudantil a publicar uma nota falsa, negando que o intuito da rifa era o conserto do congelador.
Algum tempo depois, um dos coordenadores do grêmio estudantil tentou criar um projeto para a compra de microscópios para tentar criar um pequeno laboratório de ciências naturais dentro da instituição. Todavia, a direção o pressionou, e utilizou do dinheiro para a compra de uma televisão, sem sequer consultar a opinião dos estudantes sobre isso.
“Quando fomos perguntar, o dinheiro já havia sido gasto, e a televisão estava comprada”, denuncia um estudante.
Também foi relatado, que ações de propaganda, contrárias ao Novo Ensino Médio, eram reprimidas. “Toda a história de nosso grêmio foi marcada por tormentas, já que a diretoria não nos permitia andar com nossos próprios pés. Ela queria fazer uma ditadura dentro da escola seguindo brilhantemente o legado de César Cals [político cearense da ditadura militar, que tem seu nome homenageado na instituição]”, denuncia um aluno.
“Nossos projetos eram rejeitados e reprimidos. Tivemos que lutar contra nossas dificuldades internas e contra a direção, que cortava nossas asas. E infelizmente, essa é a situação da maioria dos grêmios estudantis brasileiros. As escolas ainda não respeitam a Lei do Grêmio Livre!”
Entre reformas, nada muda.
No início do ano, o anexo da EMEF – César Cals passou por uma reforma estrutural, que adicionou climatizadores ao prédio da instituição. E a partir do meio do ano, se iniciou um projeto de reforma na sede da escola com o intuito de construir novas salas para assim futuramente integrar as turmas de 7° Ano.
Entre reformas, nada muda. Pois os problemas de infraestrutura estão bem longe de serem resolvidos. A escola que funciona integralmente carece de recursos mais básicos para poder ofertar uma educação de qualidade,como laboratórios e quadras. Obrigando assim os professores, a se humilharem atrás de recursos externos, que muitas vezes não são conseguidos mesmo com muitas tentativas e requerimentos.