Chacina em Nova Mutum/RO: Novas denúncias apontam para torturas e privação de direitos durante ataque da PM

Chacina em Nova Mutum/RO: Novas denúncias apontam para torturas e privação de direitos durante ataque da PM

Na manhã do dia 28 de janeiro, em pleno sábado, o Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar (PM) de Rondônia assassinou dois camponeses e levou terror a mais de 100 famílias (300 camponeses) em um novo ataque aos camponeses do Acampamento Tiago Campin dos Santos, em Rôndonia. Em 31/01, a Associação Brasileira dos Advogados do Povo – Gabriel Pimenta (Abrapo) divulgou um Relatório e a Liga dos Camponeses Pobres (LCP) da Amazônia Ocidental publicou uma nota sobre a chacina. Os dois documentos dão conta da atuação covarde e terrorista neste que é o terceiro ataque desde a ocupação em 2020.

A macabra chacina perpetrada pela PM assassina do governador coronel Marcos Rocha ocorreu na área do Acampamento Tiago Campin dos Santos, localizado nas Fazendas Arco-íris e Norbrasil. Segundo a Abrapo, o suposto dono daquelas terras é a empresa Leme Emprendimentos, do latifundiário Antônio Martins. “Galo Velho”, como é conhecido na região, é citado no “Livro Branco da Grilagem de Terras” como um dos maiores grileiros do país, está sendo investigado pelas polícias Civil e Federal, em conjunto com o Ministério Público, pelo financiamento de pistoleiros na região para a grilagem de terra e expulsão de camponeses.

O ataque brutal contra as famílias camponesas ocorreu durante uma operação de reintegração de posse na sede da fazenda Norbrasil. Três batalhões da PM deslocaram-se no dia 28/01 com dezenas de viaturas e drones. As tropas militares reacionárias balearam três camponeses (dois morreram após torturas), agrediram fisicamente centenas de camponeses e roubou os pertences individuais dos camponeses. Marcos Rocha, governador do estado, é denunciado pela LCP por se posicionar ao lado dos latifundiários grileiros de terra. O movimento camponês afirma também que a operação foi para defender os “privilégios e interesses ilegais do Galo Velho”. 

A OCUPAÇÃO DA SEDE DA FAZENDA NORBRASIL

No mesmo local já havia ocorrido um ataque no dia 22 de janeiro. Segundo a LCP, bandos militares de pistoleiros do Galo Velho foram até a área em uma caminhonete preta e realizaram disparos em direção às famílias, homens, mulheres e crianças desarmados.

No dia anterior, aproximadamente 100 famílias (cerca de 300 pessoas) ocuparam a sede da fazenda Norbrasil, que fica na beira da BR-364. O interesse em ocupar aquela parcela de terra era compartilhado não somente pelas 100 famílias, mas por todos do Acampamento Tiago Campin dos Santos pois a única alternativa para se chegar às casas é dando uma volta de mais de 100 km. Além disto, aquela parcela de terra é o principal ponto para escoar a produção camponesa, pela proximidade com a  rodovia federal.

INVASÃO POLICIAL: POLÍCIA COMETEU CHACINA E SÉRIE DE ILEGALIDADES 

Os policiais chegaram pela BR-364 atirando e lançando bombas de efeito moral e gás lacrimogêneo. Outros grupos de policiais estavam em outros pontos, de tocaia. Junto a estes também estavam pistoleiros que prestam serviço ao Galo Velho, segundo as denúncias do movimento camponês e da Abrapo.

Os camponeses assassinados, Rodrigo Hawerroth (conhecido como “Esticado”), de 34 anos e Raniel Barbosa Laurindo (conhecido como “Mandruvá”) de 24, estavam no grupo de camponeses que se afastou das bombas. O grupo decidiu atravessar o Rio Cotia, fazendo a travessia de barco. Foi aí que foram rendidos pelos policiais. Três camponeses foram baleados (além de Rodrigo e Raniel, Kenedy também foi alvejado e levado para o hospital João Paulo II).

Os três camponeses atingidos foram levados ainda com vida pelos policiais, porém dois deles foram executados sumariamente após sofrerem severas torturas. O Relatório da Abrapo aponta que “os camponeses rendidos foram torturados, as marcas estão em seus corpos, tendo o Rodrigo apresentado hematomas no corpo e rosto condinzentes com coronhadas de armas, corte na boca, olho furado e língua cortada”. A Abrapo afirma que não há a certeza de que estas informações constarão no laudo cadavérico (documento que é de responsabilidade da Segurança Pública do governo do estado de Rondônia).

Após este ataque, os policiais iniciaram um cerco às famílias acampadas no Barracão das Máquinas, na sede da fazenda. As famílias presentes tentaram voltar em direção ao rio, mas foram impedidas pelos militares reacionários. Os camponeses resistiram, gritando que haviam mulheres, inclusive grávidas, e crianças no local, o que foi ignorado pela PM, que prontamente começou “a atirar bala de borracha, jogar bomba de efeito moral, onde crianças foram atingidas e apresentaram reação de sufocamento”, denuncia o Relatório. 

Os camponeses afirmam que os policiais estavam todos sem identificação nos uniformes e eram acompanhados por pistoleiros da fazenda. O responsável pelas tropas (tenente-coronel Pontes) insultou os camponeses de criminosos e os militares reacionários afirmaram que a orientação era de “matar todo mundo”. As famílias resistiram à tentativa de jogá-los em um ônibus sem informar do destino e  foram novamente agredidas. Bombas de efeito moral foram lançadas e as famílias recuaram, desta vez para a margem da BR-364 (na frente da fazenda). E ficaram ali no sol escaldante, sem acesso a água ou alimentos. Um camponês foi encaminhado ao mesmo hospital pois teve ataque cardíaco. Muitos ficaram feridos por balas de borracha e sufocados pelo gás lacrimogêneo. Mulheres desmaiaram e crianças ficaram sem alimentação.

Somente alguns camponeses conseguiram permissão para retirar uma bolsa de roupa de dentro do barracão. O restante das roupas, comidas, freezer com alimentos, botijões de gás, celulares, colchões, remédios e demais pertences pessoais não foram autorizados. A maior parte dos objetos dos camponeses ficaram nos barracões, que foram todos destruídos pelos policiais. Os camponeses denunciaram aos advogados que viram os militares reacionários roubando seus pertences (celulares e dinheiro). Além disso, os policiais também envenenaram cães e contaminaram poços de água, além de fotografarem os camponeses que estavam no local.

A fim de intimidar os camponeses, a polícia passou com os corpos dos camponeses assassinados à mostra nos carros. Também com o mesmo objetivo, alguns camponeses foram levados para a sede da fazenda e ameaçados e agredidos. As famílias que ficaram na beira da estrada também foram fustigadas pela PM e pistoleiros que ficaram no local fazendo rondas ostensivas. Alguns camponeses foram fichados e assinaram um termo circunstancial criminal e vão responder por desobediência no Juizado Especial Criminal (JEC).

No fim da tarde do dia 29/01, as famílias deixaram o local e foram para a Vila Alípio de Freitas, localizada dentro do Acampamento Tiago Campin dos Santos. De acordo com o relatório, os camponeses mostraram “muita indignação com as execuções e a forma de agir da PM em proteção ao latifúndio.”.

Leia o relatório da Abrapo e a nota da LCP.

Imagem de destaque: Camponeses assassinados em Nova Mutum (RO): Raniel Barbosa Laurindo (24) e Rodrigo Hawerroth (34). Foto: Reprodução

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