Centenas de mulheres contra a impunidade do abusador em cinco casos de estupro em frente ao tribunal de Temuco, no Chile. Foto: Agencia Uno
Milhares de manifestantes, principalmente mulheres, se rebelaram nas regiões de La Araucanía, Biobío e metropolitana após a condenação à prisão domiciliar de um homem culpado pelo estupro de no mínimo cinco mulheres, mas condenado por apenas um (de acordo com o juiz, os outros crimes já haviam prescrito), em que a vítima mais tarde se suicidou. Em diversas cidades, barricadas foram erguidas e a polícia foi combatida em suas tentativas de reprimir os protestos, no dia 22 de julho.
Na cidade de Temuco, centenas de mulheres se reuniram em frente à casa do estuprador, Martín Pradenas, para protestar contra os brutais crimes. A casa era guardada pela polícia militar do Chile (os Carabineros) para evitar ações combativas das mulheres contra o local em que ele se encontrava, mas que mesmo assim aconteceram.
As manifestantes ergueram barricadas em chamas em volta da sua casa, sendo reprimidas com bombas de gás lacrimogêneo, e, em frente ao tribunal da cidade (onde foi julgado o caso) queimaram um boneco com uma foto do estuprador em seu rosto.
Da mesma forma, no Biobío, várias manifestações e marchas foram registradas no centro de Concepción e Talcahuano.
Enquanto em Santiago, também aconteceram protestos em diversos bairros e em Villa Francia, sete pessoas (seis mulheres e um homem) foram detidos por “conduta desordeira”, em protesto à impunidade do caso. Barricadas também foram erguidas em duas avenidas da cidade de Peñalolén.
Manifestantes erguem barricadas em La pintana contra a impunidade na condenação de um abusador em cinco casos de estupro. Foto: @Primeralineare1 via Twitter
O julgamento de Martín Pradenas
O caso de Antonia Barra teve grande repercussão do país devido à tamanha impunidade com que o caso foi tratado pelo velho Estado espanhol. Durante a audiência, o canal digital do poder judiciário chileno atingiu um número recorde: um milhão de conexões.
Foram dois os principais argumentos para a rejeição da prisão preventiva de Pradenas, de 28 anos: o “bom comportamento do acusado”, que é investigado por cinco casos de abuso sexual e estupro de outras jovens mulheres, e a “falta provas suficientes” para comprovar o crime.
Além desta decisão, o juiz responsável pelo caso, Federico Gutiérrez, definiu que duas das cinco acusações – ocorridas entre 2010 (contra uma jovem de 16 anos) e 2014 ( outra jovem de 19 anos) – estão prescritas. No Chile, esse tipo de crime prescreve após cinco anos.
Durante a audiência, transmitida ao vivo, também foi exibido um vídeo de Antonia e Martín, mostrado posteriormente na televisão nacional, no qual ele empurra e conduz a jovem alcoolizada. Ao ver o vídeo em que o acusado aparece ao lado da vítima, que mais tarde será estuprada e que tirará a própria vida, o juiz diz: “Só vejo um casal andando”.
Além disso, o juiz, para rejeitar as outras queixas contra o acusado, alegou que em um dos casos uma das vítimas havia utilizado a “pílula do dia seguinte”, sendo que, para ele, isso demonstraria que a relação não teria sido contra a vontade da vítima.
O caso de Antonia Barra
Manifestantes carregam faixa com foto de Antonia Barra erguem barricadas contra a impunidade na condenação de um abusador em cinco casos de estupro. Fonte: Banco de Dados AND
Na manhã de 18 de setembro de 2019, Antonia Barra acordara em um alojamento turístico em Pucón, no sul do Chile. Pradenas estava deitado sobre ela. Depois de gritar para ele sair, vestiu-se e saiu. Ela viajara para a cidade com uma amiga, Consuelo, e o namorado dela, com quem Antonia foi a uma boate. Lá teria começado o assédio de Pradenas, registrado nas câmeras de segurança.
As mensagens de texto e áudio que a jovem enviou a vários amigos pelo WhatsApp, depois publicadas pelo Ministério Público, ajudam a contar sua história. Nelas, ela diz que foi estuprada por Pradenas e que não queria denunciá-lo por medo da reação de seus pais.
Antonia não falou sobre o caso até 12 de outubro de 2019. Naquele dia, ligou para seu ex-namorado, Rodrigo Canario, e contou sobre a agressão sexual que havia sofrido. Ele a insultou, gravou a chamada e a encaminhou a outras pessoas.
Um dia depois, ela mandou a ele uma mensagem de despedida e se matou.