Marcha realizada por estudantes no Chile exigindo aumento nas bolsas para alimentação. Foto: Reprodução
O governo do presidente do Chile, Gabriel Boric, governo oportunista natimorto, tem enfrentado a rebelião de importantes setores do povo chileno. Camponeses mapuches e as massas de estudantes e jovens levantam-se em protestos, deixando claro que o atual governo não serve aos interesses do povo.
Nas últimas semana, entre fins de março e abril, isto foi o que ficou evidenciado nas ações diárias dos mapuches contra o latifúndio em que os camponeses realizaram denúncias ao governo Boric, assim como nas grandes manifestações combativas estudantis pela libertação dos presos políticos da rebelião de 2019 e pelo Dia do Jovem Combatente.
Além disso, elemento importante na crise política chilena é o fato da tão propagandeada “solução” para o constante estado de revolta popular no Chile, a “nova” constituinte, teve um recorde na sua taxa de rejeição, ultrapassando a aprovação. Em uma pesquisa semanal constatou-se que 46% dos chilenos rejeitam a legitimidade da constituinte, contra cerca de 40% que a aprovam. O governo Boric, em apenas 15 dias, teve um acréscimo de 15% em sua rejeição (de 20% à 35%).
No dia 01/04, a Praça da Dignidade, principal centro de protestos na capital do país, amanheceu com uma gigante pichação escrita: Governo amarelo, traidores!
Mapuches intensificam ações
As ações armadas organizadas pelos mapuches têm sido diárias desde a posse de Boric. Elas ocorrem antes e após de 25 de março, data em que o subsecretário do interior Manuel Monsalve chegou a Araucanía para anunciar mais contingentes policiais e também novas viaturas e equipamentos especiais para continuar reprimindo a luta pela terra mapuche.
Em 4 de abril um grupo de estudantes mapuches ocupou as instalações da emissora TVN Red Araucanía, localizada no Fundo El Carmen da cidade de Temuco, em protesto contra as sentenças declaradas contra oito presos políticos mapuches que se encontram na prisão da cidade de Lebu.
No dia anterior, a Coordenadoria Arauco Malleco (CAM) afirmou que não iria dialogar com aqueles cujo objetivo final é a aniquilação de seu povo, citando Manuel Monsalve, o subsecretário do interior, e demais reacionários.
“A nosso ver, a eleição de Boric insere-se num contexto marcado pela reciclagem de uma velha institucionalidade assimilacionista que fracassou em Wallmapu [terra mapuche]. A presença indígena na Assembleia Constituinte e a suposta aspiração multinacional do próximo governo, ambos fatores com claras limitações políticas e ideológicas, indicam que o propósito institucional não é transformar a correlação de forças entre as duas nações, questão que nos obrigaria a enfocar a questão da desapropriação territorial e os interesses do grande capital que atuam em Wallmapu”, declara.
Eles reiteram que em meio à confusão, reafirmam “o caminho político-militar do nosso weychan [luta] como fizeram Leftraru, Pelontraro e nosso weychafe [guerreiros] caído em combate na época, que não está focado em obter migalhas burocráticas do inimigo, mas sim em lançar as bases de nossa proposta de libertação nacional mapuche, para a qual é necessária a expulsão de toda expressão capitalista e colonial do Wallmapu.”
Em 02/04, a Resistencia Mapuche Lafkenche (RML) reivindicou o incêndio de pelo menos 15 cabanas de empresas florestais no setor de Paillawe e declarou que em 20 dias após assumir o governo o governo, Boric se manteve completamente à parte da luta pela terra Mapuche, enquanto utilizava demagogicamente palavras como “Wallmapu” – representando, portanto, traição aos anseios pela terra e territórios por parte dos mapuches. Após a declaração, a RML deu ao governo 48 horas para cumprir com uma série de exigências sobre a liberdade para os mais de 50 presos políticos mapuches que, se não atendidas, teriam como respostas novas mobilizações organizadas em todos os territórios.
Nos dias 01/04 e 31/03, a CAM reivindicou quatro ações de sabotagem de caminhões de empresas florestais. A mensagem deixada no local era: “Fora as [empresas] florestais e os yanaconas [mapuches servis ao velho Estado]! Galvarino Reiman aos weichafe [guerreiros] não enganarás! O.R.T. nagche Pelontraru. Liberdade a Daniel Canio e Luis Vasquez Tramolao.”
Em 24/03, o Lof Carmen Colipi e a CAM anunciaram a tomada da fazenda Antofagasta grilada, pela florestal Arauco. Um dia antes, os presos políticos mapuches Luis Tralcal Quidel e José Tralcal Coche conquistara, através de uma greve de fome de 22 dias, saídas aos domingos da prisão.
? AHORA | Lof Carmen Colipi y la #CAM anuncian control territorial completo del fundo Antofagasta ursurpado por forestal Arauco. pic.twitter.com/p0pHqDdtla
— Werken Noticias (@info_werken) March 24, 2022
Em 14/03, em decorrência da viagem da ministra do interior Iskia Siches a Ercilla, a comunidade Mapuche de Temucuicui pendurou uma faixa que exclamava: Enquanto houver presos políticos mapuches não haverá diálogo!
Estudante é baleado em manifestação por melhores bolsas
Na segunda semana após a posse de Boric, em 25/03, também ocorreram uma manifestação de estudantes por melhores bolsas e dos jovens pela liberdade dos presos políticos. Um manifestante foi baleado pela polícia durante a greve nacional dos estudantes sendo que, após o crime, o policial foi atacado pelas massas de estudantes.
A bárbara repressão policial contra os estudantes acontece enquanto o histórico de Boric é retratado como o de um estudante que iniciou sua vida política “liderando” as manifestações estudantis de 2011 e 2012, como presidente da Federação de Estudantes do Chile.
Na manifestação, os estudantes exigiam que, diante da crise, a Bolsa de Alimentação do Ensino Superior (BAES), que há 10 anos foi fixada em 31.000 pesos chilenos por mês (cerca de R$ 180) e não mudou desde então, subisse para R$ 280, assim como que ela se estendesse aos meses de janeiro e fevereiro, nas férias, pois nesses dois meses continuam na condição de estudantes e precisam comer.
Após o protesto dos estudantes, dezenas de jovens tomaram a Praça da Liberdade em Santiago para exigir a libertação dos presos políticos da rebelião popular de 2019. Os policiais já se encontravam em alvoroço após a manifestação dos estudantes, e tentaram desmobilizar a manifestação brutalmente. A manifestação ocorreu dias após o Congresso receber da presidência um projeto de lei para o indulto dos prisioneiros políticos, na tentativa de afogar os ânimos de revolta no burocratismo estatal. Os manifestantes provaram que a única forma de garantir a aplicação de tal medida é continuando a lutar.
Valezca Garcés, um senhor de 65 anos, era um dos presentes na manifestação, ele declarou: “Vou [lutar] até que os presos sejam libertados, até que eles aprovem a quinta retirada [de 10% de suas economias de aposentadoria] e que eles dêem aos mapuches o que eles querem, porque eles lutam há mais tempo do que nós”.
Ele manifestou seu rechaço à declaração de Boric, que afirmou, sobre os protestos de sexta-feira: “as atividades criminosas que acontecem às sextas-feiras não podem continuar sendo permitidas”. “Não somos criminosos, somos cidadãos”, disse Garcés. Questionada sobre “atos de vandalismo” pelo monopólio de imprensa, ele afirmou que “a violência faz parte do DNA da revolução”.
As manifestações semanais ocorrem toda sexta-feira na Praça da Liberdade (rebatizada como tal pelos manifestantes de 2019). Na primeira sexta-feira após a posse presidencial, na costumeira repressão policial contra a manifestação, o idoso de 65 anos foi detido pela polícia.
Dia do Jovem Combatente é comemorado com manifestações combativas
No dia 29/03, Dia do Jovem Combatente, jovens por todo o Chile saíram às ruas para honrar a memória dos irmãos Rafael e Eduardo Vergara Toledo pelas mãos de Carabineros (1985), assassinados pelo regime de Augusto Pinochet.
Os Carabineros (polícia militarizada chilena) realizaram uma série de cortes e desvios de tráfego para tentar impedir uma marcha da juventude na Capital, Santiago. Eles também iniciaram o dia com um ataque contra o Instituto Nacional, fazendo com que os manifestantes fechassem a estação do metrô Universidade do Chile. Na Alameda, ocorreram confrontos entre a Polícia de Controle da Ordem Pública (COP) e manifestantes. No bairro de Peñalolén, um ônibus foi incendiado pela juventude em rebelião.
No município de San Bernardo, confrontos aconteceram entre a juventude que protestava contra a repressão policial em frente à delegacia do município e os policiais. O princípio de um incêndio foi iniciado contra a prefeitura do município.
Em Valparaíso, grandes marchas foram registradas nas proximidades da Plaza Victoria e também na Plaza Aníbal Pinto. Na cidade de Concepción, uma grande marcha foi realizada nas proximidades da Universidad del Biobío, precisamente no setor Collao.
Os Carabineros enviaram quase três mil militares com armas de fogo para várias cidades do país para impedir as manifestações da juventude. Apesar das denúncias de repressão contra manifestantes e jornalistas, a ministra do Interior, Izkia Siches, declarou que “os carabineiros contam com nosso total apoio para continuar seu trabalho”.
Para justificar sua total falha em impedir a realização de protestos combativos, só restou ao governo soltar um balanço dos protestos da juventude combatente chilena. Nele, o governo reacionário de Gabriel Boric afirma que“nesse ano houve uma diminuição de 50% de atos de violência”, e que de 154, este ano foram 78 ações de massas em todo o país.
Rejeição à capitulação
Como apontado na matéria A Eleição do Candidato “amarelo” no Chile, de AND, a eleição de Boric, através de um discurso modernizante, busca reformas necessárias para reimpulsionar o capitalismo burocrático no país e, em segundo lugar, sucede os levantes combativos de massa contra o governo de Sebastián Piñera. Nessas circunstâncias, “os oportunistas se alçam, fazendo da luta de massas seus trampolins políticos, apresentando-se como intermediários entre as massas e o velho Estado, como elementos apaziguadores”.
Boric, durante as manifestações de 2019, o tempo todo manejou para uma “via institucional” do “Acordo pela Paz e a Nova Constituição”, proposta negociada entre a direita liberal reacionária e o novo e velho oportunismo chileno. Enquanto aos “violentos”, ou seja, às massas que permanecem em revolta e os movimentos revolucionários de massas, Boric promete “fazer cumprir a ordem pública” e espera que “esses setores sejam cada vez mais minoritários”. A “ordem pública” no Chile, como se sabe, são as centenas de manifestantes presos ilegalmente e cegados pela polícia após 2019.
A “Nova Constituição”, aqui, aparece para moralizar e aperfeiçoar o velho Estado, na aparência de democracia absoluta, mas funcionando como uma verdadeira ditadura de grandes burgueses e latifundiários.
O caminho do povo, por sua vez, como afirma a matéria, permanece o mesmo: rejeitar a chantagem do oportunismo e o seu apodrecido caminho burocrático.