Corredor Interoceânico: Um crime contra o povo e a Nação mexicanos

Corredor Interoceânico: Um crime contra o povo e a Nação mexicanos

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Nas últimas semanas, militantes e ativistas realizaram dezenas de ações no Brasil e no mundo para denunciar a construção do Corredor Interoceânico do Istmo de Tehuantepec (CIIT), um megaprojeto do imperialismo ianque atualmente em construção no México pelo governo oportunista de Andrés Manuel López Obrador. Com as obras iniciadas no ano de 2020, o CIIT tem sido alvo de sucessivas críticas pela subjugação que irá impôr ao país latino-americano e pelas ações de despejo, desaparecimento forçado e assassinato que rondam sua construção desde o início. 

Dia de Luta em Defesa da Vida e dos Direitos dos Povos organizado pela CP-SV exige liberdade para camponês preso na luta contra o CIIT. Foto: Reprodução/CP-SV

O presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, o imperialismo ianque (USA) e o monopólio de imprensa seguem a promover a construção como um necessário passo para o “desenvolvimento” do México. Investigações sobre o projeto, por sua vez, demonstram que as denúncias contra o CIIT não são infundadas, e evidenciam o caráter vil, imperialista e saqueador do megaprojeto.

O Corredor Interoceânico do Istmo de Tehuantepec foi anunciado oficialmente no dia 14 de junho de 2019, como um dos vários megaprojetos que pretende realizar López Obrador. O objetivo da construção é conectar os mares do Atlântico e do Pacífico por meio de rodovias e ferrovias de alta velocidade que integrem o porto de Salinas Cruz, localizado no estado de Oaxaca e com desembarque no Atlântico, com o porto de Coatzacoalcos, no estado de Veracruz, e que possui plataforma no Pacífico. 

Para cumprir este objetivo, o projeto ampliará e reformulará ferrovias já existentes, onde rodará o chamado Tren Transístmico, e construirá autopistas. Os portos serão “modernizados” e terão os equipamentos e infraestrutura alterados. Uma rota fluvial também deverá ser estabelecida no rio Coatzacoalcos. A construção dessas estruturas e a gestão delas, quando prontas, ficarão a cargo do imperialismo: as autopistas serão geridas por empresas imperialistas e, das cinco empresas envolvidas na construção das ferrovias, quatro são ianques e uma é canadense. O projeto tem, ainda, estreita relação com o Tren Maya, um outro megaprojeto ferroviário, localizado na península de Yucatán.

Todo o projeto deve abarcar uma área de mais de 300 quilômetros (distância entre o Atlântico e o Pacífico no Istmo), que ultrapassa pelo menos 79 municípios (46 em Oaxaca e 33 em Veracruz) e 11 comunidades indígenas, além da floresta Chimaplas, uma das áreas mais ricas em biodiversidade do mundo. 

Mapa do Corredor. Foto: Reprodução

Além das ferrovias, autopistas, portos e rotas fluviais, o megaprojeto pretende implantar diversas zonas industriais na região de Oaxaca e Salinas Cruz. Essas áreas serão “Zonas Econômicas Especiais”, e as empresas que ali atuarem receberão diversos “incentivos econômicos” (medidas de subsídios, isenção de impostos e outras benesses concedidas à burguesia imperialista) para explorar a região. Minerais (em especial o urânio), madeira, petróleo (a regiaõ do Istmo de Tehuantepec concentra o maior número de reservas de petróleo da América do Norte) e recursos hídricos são algumas das riquezas disponíveis em abundância na região. 

A ‘ Quarta Transformação’ de Andrés Manuel López Obrador 

Todo esse projeto do CIIT está dentro daquilo que López Obrador propagandeia como a “Quarta Transformação” do México, ou 4T. De acordo com a campanha oportunista de López Obrador, a 4T seria uma “pacífica e ordeira transformação, mas não menos profunda que a Independência, a Reforma [Guerra da Reforma, de Benito Juárez] e a Revolução”.

Além do Corredor, o já referido Tren Maya, a Refinaria dos Bocas, o Projeto Integral Morelos, o Aeroporto General Felipe Ângeles e gasodutos que conectem o México com outros países da América Central são alguns dos projetos do presidente mexicano.

Dentro da campanha de Obrador, esses projetos são propagandeados como o caminho para o “desenvolvimento” e a “soberania nacional” do México. Para o povo, sobretudo camponeses pobres e indígenas, e para diversos especialistas que estudam os projetos, eles são sinônimo de terror para as massas populares, militarização das regiões pobres do país, divisão territorial do México e entrega absoluta das riquezas naturais do país para o imperialismo, principalmente ianque. 

Oaxaca, uma das regiões afetadas pelo mega-projeto, tem sofrido um forte processo de militarização que visa conter a resistência empreendida por movimentos populares, camponeses pobres e indígenas contra a obra do Corredor. Em outubro de 2022, dois ativistas de Oaxaca foram assassinados por pistoleiros: Jesús Martínez, da Corrente do Povo – Sol Vermelho (CP-SV), e Filogonio Merino, do Conselho de Povos Unidos pela Defesa do Rio Verde (Copo Dever). Ambos eram aguerridos opositores ao CIIT.

Jesús Martínez. Foto: Reprodução/ CP-SV

Jesús Martínez e Filogonio Merino não são exceção. Enquanto López Obrador propagandeia “o respeito aos direitos humanos” como uma das conquistas de sua 4T, o estado de Oaxaca registrou a morte de dez ativistas somente no ano de 2021. Em todo o México, foram 54 ativistas assassinados. Em 2018, o advogado Dr. Ernesto Sernas García, foi sequestrado após comprovar a inocência de ativistas da CP-SV em um processo farsesco de porte de armas de uso exclusivo do exército. Em 2019, o ativista da CP-SV Luís Armando Fuentes Aquino, o “Comandante Gato”, foi assassinado. O que sucedeu essas mortes foi o aprofundamento ainda maior da militarização: em outubro de 2022, o estado de Oaxaca foi o primeiro do México a ampliar o tempo que o exército reacionário do país continuará a exercer a função de força de segurança nas ruas (isto é, assumir a função da polícia). 

Marcha camponesa exige justiça para Jesús Martínez. Foto: Reprodução/CP-SV

Por mais que os mandantes destes assassinatos não tenham sido culpados, os movimentos populares e especialistas afirmam todos que as evidências apontam para o mesmo lugar: para as empresas imperialistas, o latifúndio e o velho Estado mexicano. Na ocasião do assassinato de Martínez e Merino, a CP-SV afirmou que o ataque se tratava de uma “estratégia de contrainsurgência do velho Estado para impor políticas e governos antipovo, bem como megaprojetos imperialistas de despejo e morte”.

A acusação da CP-SV coaduna com o que Victor Cabral, mestre em geografia e especialista no Corredor, aponta: “Em alguns desses casos de resistência, não é incomum encontrar relatos de assassinatos e chacinas contra líderes comunitários opositores às obras. Tanto o Estado como seus agentes e as corporações, afastam primeiro as pessoas para que seu trabalho sujo não seja feito com grande resistência”. E completa: “Sai mais fácil para o Estado e as empresas gerarem medo nas pessoas e matar algumas do que tentar negociar e expor publicamente seus interesses com a terra”. 

Assim, a militarização do México, e de Oaxaca em particular, elimina ativistas mais avançados da luta pela terra e contra os megaprojetos como parte da estratégia preventiva às rebeliões das massas em defesa de seus direitos.

Elevar a militarização

Militares da Marinha mexicana no terreno onde ocorrem construções para o CIIT. Foto: Reprodução/CP-SV

Dessa forma, a militarização caminha de mãos dadas com a subjugação e balcanização do México. E as construções como o CIIT e o Tren Maya revelam o caráter entreguista do “desenvolvimento transformador” de Obrador. Além das empresas imperialistas envolvidas na construção (e posterior gestão) das autopistas e ferrovias, a imensa maioria das vias ferroviárias dos Tren Transístmico e do Tren Maya só permitirão o uso de trens que sejam produzidos no USA ou no Canadá. Ferrovias construídas e geridas pelo USA e Canadá que só abrigarão (e, portanto, só financiarão) empresas ferroviarás do USA e do Canadá. 

Está em debate no Congresso do USA para intervir militarmente no México sob a justificativa de “combate ao narcotráfico”. A proposta de janeiro de 2023 foi apresentada por dois parlamentares republicanos e busca “autorizar o uso das Forças Armadas do USA contra os responsáveis do tráfico de fentanilo ou uma substância relacionada com o fentanilo nos USA ou levar a cabo outras atividades relacionadas que causem desestabilização regional no Hemisfério Ocidental”. A medida foi denunciada pelo portal Sol Rojista e pode ser lida aqui.

O caminho da subjugação nacional também é trilhado nas reuniões preparatórias ao lançamento das licitações que serão abertas para o estabelecimento de indústrias na região do Istmo. Em fevereiro de 2023, López Obrador se reuniu com legisladores ianques na região do Istmo para conversar sobre os investimentos e licitações na região. Durante a reunião, o presidente oportunista afirmou que quatro dos dez parques eólicos na região serão financiados por bancos ianques. No ano de 2021, após Kamala Harris visitar o México, o Estado imperialista ianque, sob gestão de Joseph Biden, afirmou que o USA tinha interesse de realizar investimentos de 250 milhões de dólares em investimentos e vendas no sul do México, região onde fica localizado o Istmo de Tehuantepec. 

Para as empresas imperialistas do USA, o Istmo de Tehuantepec é a oportunidade perfeita para voltar a consolidar sua hegemonia na região do Caribe. Atualmente, o Canal do Panamá, zona historicamente dominada pelo imperialismo ianque (e criada por ele, a partir da divisão forçada do território colombiano, onde antes ficava o Panamá), apresenta um alto nível de competição principalmente com o social-imperialismo chinês, que nos últimos anos tem aprofundado seus investimentos na região. O Canal também está saturado com o nível de mercadorias que são ali embarcadas e desembarcadas. Por fim, além do novo mercado de matérias-primas e da oportunidade de manter a sua hegemonia na região. Por isto, o CIIT é estratégico para o imperialismo ianque ao oferecer uma forma de integrar ainda mais suas indústrias e investimentos no Leste Asiático (no Mar do Pacífico) com a América Latina e o próprio território norte-americano. 

O imperialismo ianque pretende aprofundar a dominação militar da região do Istmo de Tehuantepec. Com a militarização e o estabelecimento de suas empresas, ferrovias e estradas no país, consolida pouco a pouco a própria divisão do México. De um lado, as áreas do país mais abundantes em riquezas naturais, amuralhadas por ferrovias, autopistas e zonas industriais do imperialismo. De outro, o resto do México.

O caminho da resistência

Tamanho saqueio da Nação mexicana, bem como os crimes contra o povo, não passam impunemente pelas massas populares do México, nem pelo olhar vigilante dos movimentos populares e revolucionários de todo o mundo. No Brasil, ativistas do Rio de Janeiro realizaram uma manifestação em frente ao Consulado do México para repudiar o Corredor Interoceânico e o governo de López Obrador. Na Europa, ativistas alemães e franceses têm realizado diversas ações em solidariedade à CP-SV e à luta dos camponeses pobres e indígenas no México.

No México, cada vez mais movimentos populares se aglutinam em amplas frentes de luta contra o Corredor Interoceânico e em defesa dos direitos do povo. Essas frentes (das quais se destacam a Frente de Organizações de Oaxaca/Foro, composta por ao menos 12 organizações diferentes), bem como os movimentos que as compõem, empreendem de maneira constante e crescente, bloqueios, manifestações, encontros e fóruns contra os megaprojetos do imperialismo. 

Faixa escrita ‘O Istmo é nosso! Desenvolver a Revolução Agrária e Antiimperialista!’. Foto: Reprodução/ CP-SV

Os protestos na região onde passará o Corredor estão se desenvolvendo há mais de 20 dias. Em Oaxaca, no dia 20 de março, ativistas denunciaram a visita de John Kerry, outros congressistas e empresários que estão em visita ao México para “supervisionar” a construção do Corredor. Há bloqueios realizados pelas massas em luta de um trecho de uma ferrovia no istmo de Tehuantepec que já dura 21 dias. Os manifestantes mexicanos têm reafirmado a sua indignação com os planos de construção de gasodutos com investimento ianque.

Assembleia de Autoridades Democráticas, dirigida pela Corrente do Povo – Sol Vermelho. Foto: Reprodução/CP-SV
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