Manifestantes nas ruas de Bastia em apoio a Yvan Colonna, 13 de março de 2022. Foto: Pascal Pochard-Casabianca
As massas de Córsega se rebelam há uma semana contra o colonialismo francês após um herói nacional pela independência da Córsega, Yvan Colonna, ter sido espancado até entrar em coma em uma prisão francesa.
A tentativa de assassinato de Yvan Colonna (61 anos) na prisão francesa revoltou profundamente o povo córsego, que há sete anos negociava sua transferência para uma prisão na sua terra natal. O preso que o espancou já havia tido casos de violência contra si mesmo e outros presos nas primeiras cinco prisões por onde passou. Mesmo assim, ele foi colocado junto de Yvan Colonna.
Após a repressão do velho Estado contra as manifestações espontâneas, as massas intensificaram sua combatividade e atacaram prédios governamentais nas maiores cidades da ilha como Ajaccio, Calvi e Bastia, assim como resistiram à repressão policial. Durante todos esses dias, o povo tem marchado atrás de uma faixa escrita Estado francês assassino!
Na manifestação mais recente, na capital Bastia, no dia 13 de março, o manifestante Antoine Negretti, de 29 anos, disse ao Al Jazeera: “Qualquer violência será culpa do governo francês”. “Sete anos de negociações não deram resultado, mas as coisas mudaram graças a sete dias de violência. A violência é necessária”, afirmou.
Nesse protesto, que contou com 10 mil pessoas (na ilha há uma população de 339 mil), ocorreram grandes enfrentamentos de centenas de manifestantes com as forças de repressão, e as grades do Centro Departamental das Finanças públicas foram derrubadas e o prédio incendiado.
Multidão protesta na Córsega no dia 13 de março. Foto: AFP
Em entrevista com o Al Jazeera, uma manifestante relatou: “Você tem que ser violento para ser ouvido. Quando se sente com medo do confronto, o Estado cede. É infeliz que tenha chegado a esse ponto, em que esperamos um homem estar em coma para reagir”, disse. Outra manifestante declarou: “Em uma semana a juventude obteve o que ninguém, o que nenhum oficial eleito obteve por sete anos. O povo de Córsega está na rua, é isso que está acontecendo, e as ações devem continuar”.
Nesse dia, 67 pessoas ficaram feridas, entre 22 manifestantes, 44 policiais e um transeunte.
Nas manifestações multitudinárias que se antecederam, o Tribunal de Justiça de Córsega e a prefeitura de Ajaccio haviam sido atacados e queimados e dezenas de manifestantes foram presos; no dia 07/03, escolas foram fechadas pelos alunos e estradas foram bloqueadas em Aleria pela população local, cidade considerada o “local de nacimento do movimento nacionalista da Córsega”.
A associação para presos políticos da Córsega afirmou: “Estado francês assassino’, sim o proclamamos alto e bom som”, e declara: “a sociedade corsa, revoltada por anos de humilhação e desprezo, está redescobrindo o sentido do que se faz um povo”.
Como consequência das manifestações, o Primeiro Ministro da França, Jean Castex, retirou o status de “preso de guarda especial” de Yvan Colonna, podendo ser transferido para Córsega, assim como outros dois lutadores pela libertação nacional de Córsega que participaram da mesma ação que Yvan.
The protests have been triggered by French authorities allowing a vicious attack on a Corsican prisoner of war, Yvan Colonna, who was imprisoned in the South of France.
Solidarity with the Protesters! For a Free and Socialist Corsica!#statufranceseassassinu #yvancolonna pic.twitter.com/mjcBJpsXQd
— Anti Imperialist Action Ireland (@AIAIreland) March 11, 2022
A luta pela libertação nacional
A Córsega passou, durante o século XVIII, por um processo de independência da República Genovesa e da França. Após a conquista de sua independência, a França interveio novamente sob a ilha. Desde então, o jugo colonial da França tem se utilizado do povo córsego como bucha de canhão nas guerras imperialistas e deslocando-os para seus então territórios coloniais para exercer funções administrativas. Nas revoltas na Argélia por independência entre os anos de 1950 e 1960, os córsegos que lá se encontravam insurgiram juntos dos argelinos. A França tentou mesmo nos anos 60 utilizar a ilha como local para testes de suas bombas nucleares, mas foi impedida por grandes mobilizações populares, mudando de local para a “Polinésia Francesa”.
Foi nos anos de 1970, em meio à uma grave crise econômica e situação de grande desindustrialização e falta de infraestruturas nacionais básicas devido à crise do colonialismo francês, em que as massas da Córsega, principalmente as camponesas, se organizaram através da Frente de Libertação Nacional da Córsega, tomando uma série de latifúndios pertencentes aos franceses. Desde então, foram diversos os grupos e ações contra o colonialismo francês no Córsega.
Multidão marcha contra o colonialismo francês e em apoio à Yvan Colonna. Foto: Pascal Pochard-Casabianca
Yvan Colonna
Yvan Colonna foi um lutador pela libertação da Córsega que, de acordo com o Estado Francês, participou da ação de assassinato de Claude Érignac, então prefeito de Córsega e Córsega-do-sul (toda a “coletividade territorial do Córsega”, como é descrita a ilha pela França).
Ele havia se formado enquanto professor de educação física na França, mas havia retornado ao Córsega e trabalhava como camponês. Após participar da ação em 1998, a procura por Colonna foi considerada a maior procura por um militante político em toda a história da França: ele foi perseguido durante 5 anos. Colonna foi encontrado pelas forças de repressão francesas vivendo, novamente, como camponês na Córsega. Ele foi preso em 2003 e condenado à prisão perpétua pelo Estado Francês.
Veja, aqui, vídeos dos protestos na Córsega:
#Corsica: Molotovs and rocks thrown at the police area in Bastia just now. pic.twitter.com/kBTMu4DQGq
— Jake Hanrahan (@Jake_Hanrahan) March 13, 2022
Mass riots engulf Corsica again as separatists protest the assassination attempt of a leader held by the French state. You’re watching the Public Finance buildings in Bastia burning to the ground. Never forget, the power of the ppl lies in the streets.
pic.twitter.com/E2Eg0225Db— GhostofDurruti (@RobTheRich0001) March 13, 2022
Bàstia en aquests moments és un camp de batalla després de la manifestació nacional exigint justícia per #YvanColonna.
Els manifestants han cremat la seu d’Hisenda i continuen resistint als antiavalots.pic.twitter.com/4EMy89zvVP
— Carles Heredia (@CarlesHeredia) March 13, 2022