Líbano: Motoristas realizam greve e bloqueios contra os preços do combustível em ‘Dia de Fúria’

Líbano: Motoristas realizam greve e bloqueios contra os preços do combustível em ‘Dia de Fúria’

Protestos em massa realizados no ano de 2019 no Líbano. Foto: Anwar Amro

No dia 13 de janeiro, motoristas de caminhão, taxistas e outros setores de trabalhadores entraram em greve no denominado “Dia da Fúria” e realizaram bloqueios e barricadas em diversas estradas principais do país. O Banco Central na capital Beirute também foi alvo de protestos das massas que se reuniram ao redor da sede e enfrentaram a repressão da polícia e do Exército reacionário. Os manifestantes protestavam contra os preços dos combustíveis, a deterioração das condições de vida e a desvalorização extrema da libra libanesa (moeda nacional).

O “Dia da Fúria” acontece há anos e é convocado espontaneamente pelas massas e diferentes setores de trabalhadores para protestar contra os problemas que atingem o povo libanês. É também, no entanto, sempre aproveitado pelas forças oposicionistas reacionárias para desgastar o governo de turno com o propósito eleitoreiro.

Os protestos

As manifestações ocorreram após um chamado do Sindicato dos Transportes Terrestres, exigindo do velho Estado que subsidie os preços dos combustíveis e forneça compensações para que os trabalhadores possam lidar com as despesas e inflação crescentes. Entretanto, não apenas os trabalhadores do transporte terrestre se juntaram aos protestos, mas várias categorias e setores, tamanha a ira generalizada das massas libanesas.

Os manifestantes bloquearam todas as principais estradas e rodovias da capital, Beirute, e seus subúrbios. As estradas também foram bloqueadas em Trípoli, Sidon e Bekaa. As universidades, escolas e bancos se encontravam previamente fechadas em face da data.

O Banco Central na capital, por sua vez, foi cercado por manifestantes que protestavam contra a desvalorização absurda da libra libanesa, que em 2 anos perdeu 90% de seu valor, e a incapacidade das instituições dovelho Estado de manejar minimamente a situação em proveito dos interesses das massas populares. Os manifestantes foram brutalmente reprimidos pela polícia e o Exército libaneses, e mesmo assim não recuaram. As massas enfrentaram as forças do velho Estado libanês e, apesar das grandes e espessas grades ao redor da porta do banco, lograram atacar os vidros e incendiar parte da entrada.

Em uma entrevista concedida ao portal de notícias Beirute Today, o taxista Ahmad, casado e pai de um filho de nove anos de idade e que se encontrava em um dos bloqueios em Beirute, relatou as dificuldades enfrentadas: “Já não trabalho há algum tempo. As tarifas dos táxis não cobrem as despesas do combustível e não posso aumentar o preço do transporte, senão perderei os poucos clientes que me restam”.

Os preços do combustível e da gasolina continuam a aumentar, com o preço de um tanque de gasolina subindo duas vezes em uma semana, atingindo 390.600 libras libanesas. Isso equivale a mais da metade do salário mínimo do país. Sem mencionar que a alta no preço dos combustíveis eleva também o preço geral de todas as mercadorias básicas.

Ahmad diz que ele tem que escolher entre encher seu carro com gasolina ou fornecer alimentos para sua família. Hoje, ele não pode mais pagar as necessidades básicas. “Sou obrigado a dar água e açúcar a meu filho quando ele está com fome!”, gritou ele. “Água e açúcar!”.

“Digo a todos que se houver um protesto ou manifestação contra essa situação, vá para a rua. Se esperarmos por nossos políticos ou partidos, ninguém se importará”, disse Mohamed al-Muqdad, de 58 anos, em uma manifestação em um dos principais cruzamentos em um subúrbio de Beirute, ao monopólio de imprensa Reuters.

A situação no Líbano

Hoje, quase 80% da população do Líbano vive abaixo da linha da pobreza, com 36% na mais completa miséria. O preço dos bens de consumo cresceram 580% desde outubro, resultando na pior crise econômica em décadas.

A libra libanesa perdeu 90% de seu valor desde outubro de 2019, corroendo a capacidade das pessoas de acessar bens básicos, incluindo alimentos, água, saúde e educação, enquanto a escassez de combustível causou apagões generalizados de eletricidade. Os bancos, temendo a falência, chegaram a limitar o acesso das pessoas aos seus depósitos em moeda local e estrangeira. 

Os libaneses vivem atualmente com apenas algumas horas de eletricidade fornecida pelo velho Estado por dia e contam com uma rede de geradores privados que também dependem do óleo diesel. Isso geralmente deixa os bairros na escuridão total por horas. Enquanto isso, os moradores têm que pagar por vários serviços, incluindo contas caríssimas para operadores de geradores, que variam à medida que a crise piora.

O país, dependente de importações, também está sofrendo com a escassez de medicamentos, os mais básicos. Além disso, a falta de energia impossibilita a maioria dos tratamentos.

Crise do capitalismo burocrático

No Líbano, atualmente, o capitalismo burocrático se encontra na sua pior crise. A situação se agrava sobremaneira desde a Guerra Civil Libanesa, que ocorreu de 1975 a 1990, quando Israel enquanto enclave ianque tentava estabelecer sua hegemonia na região. Israel ocupou a parte sul do país entre 1982 e 1984, chegando a Beirute e mesmo bombardeando a capital. Após isso, houve a intervenção imperialista através da ONU. Os israelenses continuaram no sul do país até a sua retirada nos anos 2000.

As indústrias e infraestruturas do país foram destruídas após a guerra de agressão imperialista contra o Líbano e, na tentativa de controlar a crise, o valor da libra libanesa foi fixada artificialmente ao dólar em 1997: 1.507,5 libras libanesas equivalia a 1 dólar. Isso acentuou a desvalorização da moeda e agravou a sistemática transferência de renda ao capital financeiro internacional, dada a subjugação da economia produtiva do Líbano às potências imperialistas, em especial ao imperialismo ianque, das quais depende para reconstruir sua infraestrutura (tarefa até agora inconclusa) e restabelecer um parque industrial mínimo. As medidas do imperialismo, que reforçam o funcionamento da economia libanesa como fundamentalmente geradora de divisas ao capital financeiro (concentrada não no mercado interno, mas no externo), apenas agravam a situação da nação oprimida, em benefício dos setores rentistas das classes dominantes locais e do capital financeiro.

Durante a Guerra Civil, um dólar estadunidense valia cerca de 2.500 libras libanesas. No ano de 2021, 24 mil libras libanesas chegaram a valer 1 dólar.

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