Dezenas de munduruku realizaram um protesto em frente ao Palácio da Justiça, sede do ministério da Justiça, em Brasília, na manhã de 24 de abril. Os indígenas exigiam a demarcação da Terra Indígena (TI) Sawré Muybu, situada entre os municípios de Itaituba e Trairão, no Pará.
Placas com a identificação da TI Sawré Muybu foram instaladas no gramada do Palácio.
“Estamos na frente do Ministério da Justiça, pois desde 2016 está publicado o relatório [de identificação] da nossa terra, e até hoje não foi declarada. E nós lutamos, lutamos e lutamos, e nada. Então como eles não querem declarar a nossa terra, nós viemos cobrar o ministério”, afirmou o cacique da aldeia Sawré Muybu, Juarez Munduruku, em entrevista a agência Amazônia Real.
O processo de demarcação da TI Sawré Muybu vem sendo arrastado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) desde 2007, quando foi criado um grupo de trabalho para realizar o estudo de identificação e delimitação da área com 178 mil hectares. Este estudo foi concluído em abril de 2016 e desde então o processo se encontra estagnado no ministério da Justiça.
Como o AND tem denunciado nos últimos anos, os munduruku, que se concentram principalmente na região do alto e médio rio Tapajós, em unidade com os camponeses resistem as ameaças e ataques de latifundiários, mineradoras, das empresas responsáveis pela construção de hidrelétricas e portos, grileiros, madeireiras e garimpeiros em conluio com o velho Estado.
Luta pela território e pelo modo de vida munduruku
Os munduruku que realizaram a manifestação participam também do Acampamento Terra Livre, no qual divulgaram o “Mapa da Vida: A Visão do Povo Munduruku sobre seu Rio e seu Território”. Este documento, lançado no dia 24 de abril, chama atenção para a luta travada pelos indígenas para permanecerem ocupando, vivendo e trabalhando em seu território tradicional.
“O rio Tapajós, no Pará, está ameaçado pelos planos de construção de hidrelétricas que podem alagar grandes áreas de floresta e destruir o modo de vida de seus povos indígenas e populações tradicionais. Os Munduruku, que vivem na região, estão lutando, há décadas, para impedir que isso aconteça.”, frisa trecho do documento.
Existem 42 hidrelétricas planejadas ou em construção, de diferentes portes, na região do rio Tapajós, que abriga uma população de mais de 12 mil indígenas do povo Munduruku. Empresas como General Eletric e Siemens têm manifestado interesse em participar destes projetos em conluio com o velho Estado.
“É importante para nós continuarmos nossa luta até chegar à demarcação de nossa terra. Esta é a terra de todos nós, Munduruku. É para ser usada de forma respeitosa, garantindo a criação de nossos filhos em nossas aldeias. A terra é nossa mãe. A terra que cria os nossos filhos. Se não fosse ela, não existiríamos. Por isso essa demarcação é importante. Nós não estamos fazendo caminho em terra alheia, não estamos invadindo a terra de outros. Nós estamos fazendo o nosso caminho.”, explicou o cacique da aldeia Sawré Muybu, Juarez Munduruku, em relato reproduzido no documento.
Cartografia a serviço da luta indígena
“O mapeamento é para fortalecer nossa luta e para mostrar onde estão os lugares que não podem ser destruídos, onde estão nossas coisas sagradas, tudo que não pode ser tocado”, pontuou a coordenadora do Movimento Iperegayu, Ana Poxo Munduruku.
De acordo com a liderança Bruno Kaba, o mapeamento é um instrumento fundamental na luta do povo Munduruku contra a invasão de seu território, principalmente pelos projetos de construção de hidrelétricas no rio Tapajós.
“O mapeamento é para nos defendermos, para defender tudo, para que o rio possa continuar do jeito que está, vivo, para a awaidip (mata) continuar viva. Para os que moram na mata continuarem do jeito que estão. O mapeamento é uma arma que temos para nos defender. De todas as formas, o governo tem tentado nos atrapalhar, nos enganar. Por isso que somos muitos: os pajés estão com a gente, os velhos, os contadores de história, aquele que sabe para que serve o rio, os professores, os alunos, as mulheres grávidas. Todos estão aqui. A mulher vai criar seu filho onde? Tem que ser em cima da ipi (terra). Agora que terminamos o mapeamento, vamos andar para defender isso. É por causa disso que andamos. Assim, esse mapeamento não vai ficar aqui, mas vai se ligar a todos, vai conectar todos os lugares para onde a gente existe. Partimos daqui para defender o Idixidi (rio Tapajós) inteiro. Não podemos parar com a demarcação. É dessa forma que temos que nos defender. Vamos esperar de braços cruzados, sentados, a água encher para alagar nossas terras? Não, nós temos que lutar, nos articular, ouvir nossos companheiros. Defendemos não só pra gente, mas para todos, não só na terra de Sawre Muybu, mas todo o território Munduruku.”, explicou a liderança em relato reproduzido no “Mapa da Vida”.
Falência da política de demarcação de terras indígenas
O gerente de turno Michel Temer/PMDB não homologou nenhuma terra indígena em quase dois anos a frente do genocida Estado brasileiro, sendo a homologação a última etapa do processo demarcatório.
Existem três processos de demarcação concluídos que aguardam apenas a assinatura de Temer: a Terra Indígena Rio Gregório, dos povos Katukina e Yawanawá, no Acre; a Terra Indígena Uneiuxi, dos povos Maku e Tukano, no Amazonas; e a Terra Indígena Baía dos Guató, do povo Guató, no Mato Grosso.
De acordo com dados do Instituto Socioambiental (ISA), o “ranking” dos gerentes de turno que menos homologaram terras indígenas está distribuído da seguinte maneira:
- Michel Temer/PMDB com zero homologações, sendo considerado o período de 12 de maio de 2016 até 26 de abril deste ano;
- Itamar Franco/PMDB com 16 homologações;
- Dilma Rousseff/PT com 21 homologações, sendo considerado o período de 1º de janeiro de 2011 a 12 de maio de 2016;
- José Sarney/PMDB com 67 homologações;
- Luis Inácio da Silva/PT com 87 homologações;
- Fernando Collor de Mello/PRN com 112 homologações;
- Fernando Henrique Cardoso/PSDB com 145 homologações.