‘É preciso greve de ocupação para barrar os cortes’: entrevista com estudantes que ocupam a UFSC

‘É preciso greve de ocupação para barrar os cortes’: entrevista com estudantes que ocupam a UFSC

Faixa é estendida em frente à ocupação do Centro de Convivência na UFSC. Foto: Reprodução

O Comitê de Apoio de Florianópolis (SC) realizou uma entrevista com estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que estão mobilizados desde o início de outubro e que, em 19/10, ocuparam o Centro de Convivência. O prédio que estava fechado desde 2019 (última vez em que o prédio foi aberto, também devido a mobilização estudantil) era conhecido como “Conviva”, ou “Convivência”, e atendia aos estudantes em suas diversas atividades, entre tarefas pedagógicas, culturais e políticas. Agora, como fruto da mobilização e organização dos estudantes, o espaço está novamente aberto à comunidade acadêmica. 

Faixa estendida na UFSC reivindica o Restaurante Universitário para os estudantes. Foto: Reprodução

A atual ocupação que reabriu o prédio e o colocou para funcionar foi precedida de uma vitoriosa paralisação no dia nacional de lutas, 18/10, contra os cortes de verbas promovido pelo governo genocida de Bolsonaro e generais.

A mobilização na UFSC

Estudantes realizam a limpeza do prédio do Centro de Convivência, antes abandonado. Foto: Rafaella Whitaker

As condições precárias do prédio, que estava completamente abandonado e fechado, indica o descaso das sucessivas gestões da reitoria e do Diretório Central dos Estudantes (DCE), dirigido por organizações estudantis imobilistas. A ocupação reuniu estudantes dos mais diferentes cursos. Rompendo com o imobilismo, o movimento estudantil da UFSC retoma, agora, o caminho da luta combativa e independente do oportunismo eleitoreiro.

Estudantes realizam a limpeza do prédio do Centro de Convivência, antes abandonado. Foto: Reprodução

Antes da ocupação, estudantes insatisfeitos com o imobilismo reuniram-se a partir de reuniões ampliadas e mobilizaram estudantes de diversos cursos e também os trabalhadores da educação (professores e funcionários terceirizados). No desenvolvimento da luta, ficou claro aos estudantes a necessidade de mobilizar, politizar e organizar os estudantes na luta por uma educação pública, gratuita e a serviço do povo. Neste contexto, surgiu a Rede Independente de Articulação (RIA), movimento que participou ativamente da paralisação do dia 18/10 e da Ocupação do Convivência.

Estudantes realizam a limpeza do prédio do Centro de Convivência, antes abandonado. Foto: Reprodução

A mobilização em todo o país

Estudantes se organizam para confeccionar cartazes e faixas durante ocupação na UFSC. Foto: Reprodução

Iniciada em 19/10, a Ocupação estudantil do Convivência da UFSC ocorreu em meio a grandes mobilizações em mais de 70 cidades do país.

A Executiva Nacional de Estudantes de Pedagogia (ExNEPe), em 05/10, lançou um chamado aos estudantes de todo o país a levantarem uma onda de Greve de Ocupações tão logo foram anunciados os cortes: “São mais de 328,5 milhões de reais contingenciados, 5,8% do orçamento de todas as IFES. Este é mais um crime contra o povo brasileiro. Após sucessivos cortes muitas universidades não terão dinheiro para manter seu funcionamento mínimo este ano. É a sina do caminho privatista percorrido pelo MEC que deseja destruir a gratuidade do ensino superior público para atender aos grandes monopólios da educação privada!”, denunciou a entidade, que também convocou: “a juventude tem o dever de levantar um poderoso movimento de greve de ocupação por todo o país! Todas as universidades, federais, estaduais, IF’s e colégios públicos devem preparar assembleias, debates, manifestações e desencadear a ocupação de seus locais de ensino para reafirmar a força do movimento estudantil combativo e barrar o corte de verbas!”.

Por décadas os estudantes brasileiros têm lutado de forma incansável contra o plano de privatização da educação pública imposto pelo Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI). Através da privatização – levada a cabo pelos sucessivos governos –, tais organismos buscam implementar uma educação tecnicista e distanciada dos interesses do povo. Ao longo das últimas duas décadas, o movimento estudantil combativo denunciou os ataques à educação durante os governos Lula e Dilma (2003-2016), que promoveram repasses bilionários de verba para instituições privadas de ensino: até o ano de 2013, instituições privadas de ensino superior haviam deixado de pagar R$ 3,97 bilhões em impostos federais. Entre 2010-15, as principais empresas de ensino privado lucraram R$ 28 bilhões a partir dos recursos públicos. Em 2016, mais de 1.100 escolas e universidades foram ocupadas contra os ataques do governo de Michel Temer e, em 2019, protestos gigantescos em mais de 220 cidades denunciaram os cortes do governo militar de Bolsonaro/generais.

O Comitê de Apoio de Florianópolis (SC) acompanhou a mobilização dos estudantes da UFSC e defendeu com grande entusiasmo o desenvolvimento das atividades da RIA. Para falar com mais detalhes sobre a ocupação do Convivência, foi realizada uma entrevista com alguns estudantes da RIA que estão participando diretamente das últimas ações realizadas.

Confira abaixo a entrevista:

– Como surgiu a questão da paralisação e da ocupação? Quais conquistas já foram alcançadas?

A Rede Independente de Articulação defende a tática histórica do movimento estudantil de greve de ocupação como a ação mais apropriada e combativa para barrar ataques do governo. É preciso ir além de manifestações que se resumem a atos-passeio. Ocupamos o Centro de Convivência de nossa Universidade e construímos coletivamente atividades para mobilizar os estudantes para uma eventual deflagração de greve. 

Barramos alguns Centros de Ensino com piquetes para apoiar a manifestação dos estudantes dia 18/10, conscientizando os estudantes que o momento é de luta e os chamando para a luta combativa. Em relação à ocupação, esta foi organizada e levada a cabo por estudantes independentes. Foi realizada uma limpeza ostensiva no local, além dos estudantes solucionarem os problemas hidráulicos e elétricos do prédio. Não se tinha água e energia no prédio até a manutenção dos estudantes. Após os consertos provisórios, cineclubes foram exibidos e os estudantes puderam permanecer no prédio até tarde da noite com iluminação adequada. Atualmente, após a primeira Assembleia de Ocupação, comissões foram criadas e funções delegadas, tendo em vista desenvolver a organização da ocupação.

A maior conquista do movimento é justamente sua criação. Após tantos anos, se levanta uma organização estudantil como alternativa ao governismo e a mornidão das organizações que revezam entre si o poder do DCE e dos Centros Acadêmicos na UFSC e em Florianópolis. 

– Quais seriam as principais demandas dos estudantes da UFSC e como o RIA atua?

Nós nos propomos a atuar ligados ao conjunto dos estudantes e inferimos que eram abundantes os problemas pontuais que cada Centro ou curso enfrentavam, nomeadamente: o pleno funcionamento do Restaurante Universitário, a garantia das bolsas de permanência estudantil, a manutenção da moradia estudantil, a revisão de infraestrutura dos centros de ensino (desde banheiros, pisos se rompendo, até iluminação) e o acesso livre e democrático dos estudantes no campus. Seria politicamente impraticável atender a todas as demandas de uma só vez, e por isso deliberamos conjuntamente a defesa de uma bandeira central de mobilização, que se concentrava contra a precarização e na defesa de nosso Restaurante Universitário. A Universidade vinha sendo sistematicamente afetada pelos cortes de verbas impostos pelo governo federal, e, em vista disto, o RU foi então a intersecção por nós encontrada para atrair diferentes cursos de diferentes Centros, afinal, o Restaurante enfrenta um delicado cenário de corte de alimentos, redução do quadro de funcionários, sobrecarga de trabalho, equipamentos quebrados, diminuição do horário de funcionamento, extensas filas e muito mais. No desenrolar da luta, nos defrontamos com mais um corte do governo federal e, deste modo, passamos a nos centrar mais em sustentar e defender a construção de uma greve de ocupação. A greve de ocupação é uma tática histórica e efetiva do movimento estudantil, além de mais do que necessária dada a conjuntura atual de cortes. Nossa forma de atuação se dá em mobilizar os estudantes para se levantarem e resolver por si mesmos os seus problemas, a exemplo da atual ocupação do Centro de Convivência, composta por grande parte dos integrantes da Rede, promovendo limpeza, consertos e a necessária revitalização negada pela reitoria por tantos anos.

– O que é a Rede Independente de Articulação (RIA)? Como surgiu esse movimento e qual linha defende?

A RIA é uma frente estudantil composta por aqueles que advogam a linha combativa do movimento estudantil, se contrapondo ao oportunismo e ao burocratismo. Combatemos com veemência a luta única e exclusivamente institucional enraizada em algumas entidades estudantis por organizações majoritariamente pelegas, avaliamos que esta tática de luta apenas nos afastaria das massas e não demonstraria efetividade política. Portanto, nossos objetivos se centram em mobilizar os estudantes para organizá-los e levá-los à prática aguerrida e combativa. Em relação ao seu surgimento, a Rede se desenvolveu a partir do descontentamento de estudantes que repudiavam o parasitismo oportunista no movimento estudantil. Consequentemente, entendemos que havia uma linha demarcada de dois caminhos a serem seguidos no movimento estudantil: o oportunista, que não nos levaria a nada senão à bancarrota, representado sobretudo na atual gestão do DCE, e o combativo, no qual estamos fundamentados. A linha defendida pela RIA é a linha classista e combativa, que rompe com as amarras da UNE [União Nacional de Estudantes] e busca depositar na força do próprio estudante a resolução das demandas estudantis.

– Como podemos apoiar o movimento?

Para apoiar o movimento, considerando a principal frente do movimento agora sendo a Ocupação do Convivência, priorizamos a participação presencial dos estudantes aqui da UFSC, doações materiais e doações financeiras para financiar a manutenção do espaço e dos estudantes. Nosso pix é [email protected] e necessitamos de alguns matérias, que podem ser doados, como: luvas, sabão em pó, água sanitária, álcool, baldes, panos de chão, fita isolante, água, vassoura, pá e sacos de lixo, e suprimentos em geral.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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