A briga no seio do governo entre os diversos grupos de poder das classes dominantes locais, em especial das duas frações da grande burguesia – a compradora e a burocrática – toma já dimensões claras. Ela se erige sobre a crise geral do capitalismo burocrático, agônico, cujo debacle econômico se revela na brutal queda em 9,7% do Produto Interno Bruto (PIB) apenas no segundo trimestre! Isto é absurdamente impactante, reflexo mesmo de um país em frangalhos, governado por essa generalada americanófila amestrada. Essa crise está lançando novos milhões à pobreza e ao terror do desemprego.
Agora, há outras facetas da crise, e sua dinâmica política precisa ser observada. Desde o início afirmamos que este governo reacionário está fadado à divisão. Paulo Guedes e companhia, apologistas da “austeridade fiscal” e dos cortes de direitos, só tem uma perspectiva em sua cabeça: “segurança fiscal”. Ou seja, só lhe importa mandar o seguinte recado ao capital financeiro internacional: “invistam” aqui que nós vamos garantir seu rentismo mórbido, nem que seja obrigando o povo a passar fome e sem nenhum direito. Como parte disso esses sequazes exigem manter o “teto dos gastos”, medida draconiana ditada ao bandido Temer, em 2017, para que se imponha ao país, dentre outras coisas, o congelamento por 20 anos nos investimentos em saúde, educação etc., além de reduzir gastos com obras e outros monopólios estatais.
Por sua vez, os generais, com sua política contrarrevolucionária de tentar desarmar a radicalização da luta de classes e deter a rebelião das massas, buscam como eixo central da política econômica tentar atenuar a crise, apostando no receituário da fração burocrática da grande burguesia local, o surrado “desenvolvimentismo” antioperário e vende-pátria. Baseado no endividamento público para gerar ocupação extensiva de força de trabalho, “empregos rápido”, “recuperar o poder de compra”, embalados por massivo assistencialismo corporativizador e eleitoreiro, pretendem manter grande parte das massas empobrecidas e miseráveis encabrestadas. Não por outros motivo e objetivo impuseram, no grito, o auxílio emergencial, temendo profundamente a explosão de saques e de grandes instabilidades diante da fome que grandes contingentes das massas já experimentavam e na qual iriam afundar subitamente. Com o auxílio, embora o valor não dê para assegurar o sustento e ainda se passe fome, se pôde mitigar momentaneamente o sentimento de abandono e desprezo, abandono e desprezo reais que dispensam ao nosso povo esses governos e velho Estado. Toda essa política tem por preocupação central a inevitável degradação social, a cada dia agravada e prestes a converter-se, num salto, em caos social e grandes rebeliões de massas.
Por certo, ambos os planos não rompem e nem podem romper a crise mesma do capitalismo burocrático, cuja base essencial está na fuga dos lucros máximos aqui extraídos para as potências imperialistas, por meio do latifúndio – que transfere sistematicamente valor ao estrangeiro às custas da miséria da exploração servil e outras das massas camponesas – e da própria grande burguesia em ambas as frações, associada e subalterna, de um modo ou de outro, ao imperialismo, principalmente ianque (Estados Unidos, USA). Para solucionar tal crise, apenas a Revolução Democrática, Agrária e Anti-imperialista, como dizemos à exaustão.
Por ora, a fração burocrática está se impondo de tal modo no governo – sobretudo no “Plano Marshall” do general Braga Netto – que, no dia 11 de agosto, Paulo Guedes alfinetou, dizendo que se o governo furar o “teto de gastos” – gastar num ritmo superior ao crescimento da inflação – pode ir para a “zona sombria do impeachment”. Isto ocorreu após o governo consultar a possibilidade de liberar créditos extraordinários para obras de infraestrutura.
Apesar das pugnas, ambas as frações convergem em que é preciso retirar tudo das massas populares, ao passo que veem tal tarefa como muito difícil e indigesta por legitimar-se via farsa eleitoral. Por isto Bolsonaro, que advoga por um regime militar fascista, vai se desmascarando como mais um “salvador da pátria” que se rende ao sistema político putrefato, pisando sobre suas próprias promessas demagógicas de mudanças. O simples pensar nas massas rebeladas fazem os reacionários terem dores de cabeça para alcançar seus objetivos, que consistem em aumentar a superexploração das massas populares e rapina da Nação – o que deve ser feito diminuindo os gastos públicos com saúde, educação etc. e redirecionando-os para os monopólios – e, ao mesmo tempo, evitar que o povo se rebele diante da superexploração e restrição de direitos. Trata-se, pois, de uma encruzilhada, e dela saem as mais curiosas contradições em termos, como o de “neoliberais” defendendo um orçamento maior para saúde, educação e “programas sociais”, ao mesmo tempo que reclamam atenção ao teto de gastos!
Na proposta do governo dos generais e Bolsonaro, a Saúde terá redução de verba discricionária de 13%, e a Educação, de 8%. Para agricultura, pecuária e abastecimento – principalmente ao latifúndio – houve aumento de 16,53% em verba discricionária (de R$ 2 bilhões para R$ 2,4 bilhões). Trata-se de um escárnio.
Mas, que ninguém se engane achando que não há plano B caso os reacionários não consigam “desarmar a bomba” da rebelião popular ou início de uma Revolução. A proposta de orçamento total do governo para as Forças Armadas reacionárias – defensoras do sistema de exploração e opressão e que promovem hoje operações intimidatórias contra os camponeses na Amazônia – aumentará 48,8% em 2021. Pulou de R$ 73 bilhões para R$ 108,56 bilhões. Em que pese o fato de que 91% são gastos com salários (sobretudo com o alto oficialato e generalato), é preciso constatar que se trata de um preparativo similar aos que se faz antes de uma guerra. Não nos enganemos, a guerra para a qual se preparam – não a atual guerra cotidiana, mas outra, de maior vulto – será contra as próprias massas. Elas saberão responder, a seu modo e quando melhor lhes convier, é o que indica a história. O tempo em que transitamos nos dirá, mais cedo que tarde.