Editorial semanal – Choque de ordem terrorista

Na semana passada, operações policiais simultâneas levaram terror para mais de 200 mil trabalhadores que vivem em algumas favelas do Rio de Janeiro, deixando um rastro de sangue e violações.
Após chacina no Salgueiro, caveirão com sangue do povo escorrendo na lataria chega ao Hospital Estadual Alberto Torres (Heat). Foto: Cleber Mendes/Agência O Dia

Editorial semanal – Choque de ordem terrorista

Na semana passada, operações policiais simultâneas levaram terror para mais de 200 mil trabalhadores que vivem em algumas favelas do Rio de Janeiro, deixando um rastro de sangue e violações.

Na semana passada, operações policiais simultâneas levaram terror para mais de 200 mil trabalhadores que vivem em algumas favelas do Rio de Janeiro, deixando um rastro de sangue e violações. No Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, 11 pessoas foram executadas e duas idosas foram feridas durante a operação. Na Maré, 21 escolas foram fechadas diante do cenário de guerra imposto, cerceando o direito à Educação para mais de 7 mil crianças.

Esse é o modelo de “segurança pública” aplicado à chamada “guerra às drogas” (que nunca chega aos grandes fornecedores…), cujos dois alicerces fundamentais são: primeiro, incremento sem precedentes das expedições punitivas nas regiões pobres das grandes cidades; segundo, encarceramento em massa da juventude pobre. Os últimos anos demonstram que ele é um fracasso completo em seu anunciado objetivo de conter o crescimento em espiral da criminalidade. Fracassou em todo o País, em especial, no Rio de Janeiro.

Os dados o demonstram. Cerca de 67% (dois terços) de todos os eventos violentos ocorridos no Rio de Janeiro são causados pela polícia. A informação é do relatório da Rede de Observatórios da Segurança Pública divulgado no ano de 2022. De 2006 a 2021, a polícia realizou 482 chacinas – chamadas de “operações de alta letalidade” – nas quais foram ceifadas as vidas de 2 mil pessoas, segundo levantamento do Grupo de Estudos de Novos Ilegalismos. Isso, sem contar os outros muitos milhares de pessoas mortas em operações de “média letalidade” e “baixa letalidade”.

No que tange ao encarceramento em massa, os números não são menores: de 2000 a 2014, a população carcerária cresceu quase 200%. Já de 2010 a 2019, o crescimento da população carcerária foi quase 100%, segundo o ministério da segurança pública do passado governo. Hoje, o número de presos é superior a 900 mil, dos quais, mais de 40% se encontra sem julgamento sequer.

Se o objetivo de tal política genocida é frear o crescimento da delinquência, basta observar o que ocorre, agora, no Rio Grande do Norte, para atestar seu malogro. A verdade é que a criminalidade cresce tanto mais quanto mais se aprofunda a aplicação dessa medida.

O propósito dessa política de “guerra às drogas” não é o combate ao “crime organizado” – para cujo fim tem sido muito mais eficientes as apreensões fora das favelas que, em geral, tem participação ativa de policiais e gente rica nos crimes. Tal política é, na verdade, uma sinistra estratégia contrainsurgente, presente nos manuais ianques de “guerra de baixa intensidade”.

A questão é essa: como é possível dar sobrevida a um regime de exploração e opressão, cuja sociedade é fraturada por uma endêmica crise geral, que lança periodicamente milhões de pobres ao desemprego permanente? Que teve, em 2022, 33 milhões de brasileiros e brasileiras passando fome? Como uma sociedade dessa feita não explodiu ainda em sublevação geral? Aos reacionários, em tal contexto, só é possível manter os pobres nos eixos com um violento choque de ordem; com uma volumosa mobilização militar com objetivo de dissuadir a fúria das massas; que as faça recordar, todos os dias, que os fuzis e blindados em frente às suas casas, hoje para “combater o crime”, podem e irão ser empregados contra elas quando se rebelam. Que elas, assim, se resignem a obedecer e serem gratas à “democracia” das baionetas que a reação lhes concede.

Vale lembrar: tal política é executada pelas polícias militares, que respondem – além do governador – à Inspetoria Geral das PMs, órgão do Alto Comando do Exército que dita tal política, independente de quem é eleito.

Do governo eleito sob a escusa de salvar a democracia, não há indignação e nem tampouco uma medida efetiva sequer para barrar o morticínio horrendo contra os pobres. Quando da chacina ocorrida em RO, no início do ano, na qual o latifúndio e a PM executaram sob tortura dois camponeses da LCP, não houve nem uma nota; agora, pelo ocorrido no RJ, também não. Na verdade, não surpreende: tal política foi uma constante nos governos anteriores do PT; trata-se de um governo que defende a “democracia”, sim, a democracia das chacinas.

Tão certo quanto o genocídio que essa política gera, é o ódio acumulado e represado que ela produz. No Brasil já não se pode conter as massas como se pôde há 20 anos atrás, com choques de ordem terroristas e meia-dúzia de aparentes “conquistas”, leia-se, migalhas dos banquetes da grande burguesia e do latifúndio, serviçais do imperialismo, principalmente ianque. As massas já não creem na democracia – 41% da população crê que a democracia funciona mal ou muito mal, os pobres são imensa maioria – e já não aceitam nem a fome, nem o genocídio. Mais cedo do que tarde, esse barril de pólvora explodirá. Para tanto, basta uma faísca.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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