Editorial semanal – Servir a deus e ao diabo?

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As ocupações do MST das terras do monopólio latifundiário Suzano, no Sul da Bahia, mesmo que se retirando delas logo em seguida, já foi suficiente para deixar o governo da coalizão reacionária de ‘saia curta’. Lula está pressionado, por um lado, até mesmo pela direção oportunista no movimento camponês – que exige um “plano de reforma agrária” – e, por outro, pelo latifúndio e sua extensa bancada parlamentar, que exigem que se varra, novamente, a questão agrário-camponesa da agenda política nacional.

No dia 8 passado, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, afirmou, em declaração à imprensa e em recado que seria aos dois lados do conflito: “Nós queremos paz no campo”, referindo-se ao governo; ao arrematar sua fala, no entanto, deixa claro que o recado era para tranquilizar o latifúndio e ameaçar o movimento camponês: “O respeito ao direito à propriedade será uma tônica”. Esse é o ministro que deveria ser o responsável pela “reforma agrária”.

Em reunião entre a Suzano, a direção do MST e o dito ministro, a resposta foi de que não há dinheiro para “reforma agrária”. A apuração do monopólio de imprensa CNN Brasil revelou que o governo destinou apenas R$ 2,4 milhões para o Incra, responsável pela “reforma agrária” de fancaria. Apenas os latifúndios da Suzano ocupados pelas massas camponesas custariam R$ 40 milhões, em gordas “indenizações”, que apenas servem para capitalizar os latifundiários em valores inflados pela especulação. Ressalta-se que, frente a isso, a direção do MST apenas mostra os dentes, como cão intimidado, deixando as massas camponesas as quais dirige a deriva em barracões em beira de estrada.

Se falta dinheiro para a falida “reforma agrária”, para o latifúndio sobra. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, pediu, no mesmo dia, um aporte do Tesouro Nacional para encher as burras dos latifundiários com altos valores. O valor destinado ao “agronegócio”, na forma de linhas de crédito de curto prazo com juros subsidiados, pode chegar ao montante de R$ 1 bilhão. O notável ministro de Luiz Inácio afirmou ainda que esse recurso é necessário e permitirá ao agronegócio arrecadar mais de R$ 30 bilhões em empréstimos bancários. Os objetivos são dois: primeiro, mostrar que o governo não pretende fazer nada contra o agronegócio; segundo, apaziguar a base parlamentar latifundista, da qual depende para aprovar suas medidas que buscam reformas a economia para aprofundar a penetração do capital imperialista no País, e cujo insucesso seria um salto ainda mais de crise no governo, sua instabilidade, desestabilização, pressões por sua renúncia ou impeachment.

Surpresa? Absolutamente nenhuma. Nos três mandatos do oportunismo em nosso país – 2003 a 2015 –, o crédito rural aumentou de R$ 32,5 bilhões para quase R$ 190 bilhões, e o latifúndio abocanhou cerca de 85% disso, enquanto a agricultura camponesa de milhões de famílias na ruína ou a beira dela, e outros milhões de famílias sem terra e sem nada, disputaram entre si a sobra, atoladas em dívidas. Essas famílias tiveram partes suas arrastadas pelos “gatos” para grandes cidades do Sudeste/Sul do País, para serem escravizadas na construção civil e no “agronegócio”, e outros tantos dos filhos tendo que abandonar o campo. Graças a isso, as exportações do latifúndio (“agronegócio”) cresceram de 25 bilhões de dólares (2002) a 120 bilhões (2021), um boom de 380%. Crédito rural infinito e ruína permanente: isso é o que o governo tem a oferecer, respectivamente, ao latifúndio e aos camponeses pobres, ao gosto do establishment.

Foi a resistência camponesa e os embates mais consequentes da luta pela terra que puseram novamente a questão agrário-camponesa na ordem do dia; foram os grandes combates dos camponeses pobres, em Rondônia, contra o governo militar genocida de Bolsonaro e do Alto Comando das Forças Armadas. Luiz Inácio, em sua demagogia barata, terá que lidar com isso. O centro de sustentação da economia vem sendo, cada vez mais, o agronegócio; isso aprofundará a busca por terra, elevará seu preço e, portanto, o latifúndio aprofundará a pistolagem para açambarcar as terras públicas, onde vivem camponeses pobres posseiros, e buscará atacar o seu movimento de luta pela terra; os camponeses já demonstraram ao longo da história do País que sabem reagir, e saberão fazê-lo hoje melhor do que o fizeram ontem. Luiz Inácio, cuja natureza de empedernido manipulador a serviço do latifúndio e da grande burguesia não muda, conforme cresça as exigências do agronegócio e a luta camponesa será desmascarado.

À cabeça do governo de coalizão reacionária, Luiz Inácio só faz jogo de cena, e nem o latifúndio e nem a direção do MST são deus ou diabo. Luiz Inácio só serve a um lado, do latifúndio, grande burguesia e imperialismo. Mas o diabo para eles é o movimento camponês combativo!

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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