Editorial semanal – Só a luta popular pode derrotar o vírus golpista

Editorial semanal – Só a luta popular pode derrotar o vírus golpista

O PSOL acionou o STF, no dia 14, para que faça, enquanto instituição, uma “interpretação cabal” do artigo 142 da Constituição Federal; passo seguinte, começam a surgir movimentações no Congresso para revisar a redação do artigo, tentativa autorizada pela cúpula do PT e por Luiz Inácio. O artigo 142 é ponto de tensão das provocações golpistas e da tutela das Forças Armadas reacionárias: é unanimidade entre os altos oficiais a interpretação segundo a qual o artigo dá um mandato às forças para intervir para “defender a Pátria” e “os poderes constitucionais”, ainda que sem ser acionadas por um dos “três poderes”, ao contrário do que o referido artigo  condiciona. Recentemente, o próprio Gilmar Mendes, ministro do STF, revelou que o ex-comandante do Exército, Villas-Bôas, questionou se ele tinha acordo com a interpretação golpista.

Por sua vez, Luiz Inácio e a bancada do PT no Senado tem trabalhado arduamente para esvaziar e impedir o trabalho da CPI que investigaria os graves acontecimentos do dia 8 de janeiro, quando a turba de extrema-direita, atiçada por declarações ambíguas de generais, invadiu a sede dos “Três Poderes” crentes de que aquilo desataria a “intervenção militar”. Vale lembrar, estranhamente, que nem as tropas do Batalhão da Guarda Presidencial e nem os órgãos competentes da presidência da república, ninguém acionou o “Plano Escudo”, para impedir a ação dos fascistas. Por que Luiz Inácio não quer investigar isso? Por que está colocando panos quentes e pedra sobre esse assunto tão grave para a Nação, em que há indícios fortíssimos de golpismo entranhado entre altos mandos da reserva e da ativa?

De nada adiantará tentar mexer no artigo 142 da constituição. O buraco é muito mais embaixo.

Primeiro, é preciso esclarecer que, mesmo constando que a iniciativa de decretação da “Garantia da Lei e da Ordem” deve ser de um dos “três poderes”, há sim ambiguidade na redação do artigo 142 e que esta não foi erro de um desatento. Houve grande mobilização da caserna durante a Constituinte de 1988 – inclusive com persuasão e ameaças permanentes de interrompê-la caso ela ultrapassasse certos limites –, e os generais impuseram, no artigo, o termo “defesa da lei e da ordem, dos poderes constitucionais”, sem mencionar, nem no dito artigo nem em nenhum outro da Carta, que as Forças Armadas jamais poderiam intervir por iniciativa própria. Como relatou o então ministro do Exército, general Leônidas Pires Gonçalves: “Consegui dar uma melhorada [no artigo 142]… O Exército conseguiu tudo o que queria na Constituição” (eis aí, a “constituição cidadã”!). Tratava-se de deixar a ambiguidade como uma porta aberta para que retornassem, sendo chamados ou não, caso a velha ordem fosse ameaçada pela revolução.

Segundo, que a imposição de um “Poder Moderador” militar ao País, como força contrarrevolucionária preventiva e permanente, é o elemento mais revelador da natureza de classe exploradora e opressora, presente em todas as constituições, resultado de nunca haver triunfado a Revolução Democrática no País. Na monarquia, isso realizava-se no imperador, que dispunha das forças; e nas outras seis, já da República, se expressou no fato de as Forças Armadas terem como atribuição legal a “defesa da lei e da ordem” e a “defesa dos poderes constitucionais”. As classes dominantes, em suma, sempre tiveram como preocupação central ter à mão um dispositivo contrainsurgente, uma vez que a revolução sempre esteve na ordem do dia, ora mais, ora menos.

Terceiro, como expressão do dito acima, se vê que os porta-vozes de primeira linha das classes dominantes se posicionaram contrários à “correção” do artigo. O Globo e Estadão, para ficar em dois monopólios de imprensa onde está parte da intelligentsia reacionária, em editoriais recentes, caracterizam como um “grande erro” esse movimento, porque a Constituição seria cristalina em definir as funções das Forças Armadas. Será mesmo?

Mas não deixa de ser uma infeliz ilusão crer ser possível barrar o movimento golpista com deliberações de instituições que só possuem poder porque estão enganchadas em baionetas das Forças Armadas. Por essa razão, inclusive, o espírito desta iniciativa tende a não prosperar. O vírus do golpismo é uma constante na história do País, porque é uma constante a emergência de uma Revolução Democrática. Para derrotar essa ofensiva contrarrevolucionária só há um caminho: levantar o movimento de massas, em defesa dos seus interesses imediatos e gerais, dos quais são partes os direitos e liberdades democráticos duramente conquistados, ora ameaçados e os demais nunca alcançados; unindo-o, passo a passo, com a luta por um regime de nova democracia. Ao contrário de atiçar, essa é a única barreira que pode dissuadir os intentos golpistas e, no limite, derrotá-lo ainda que se imponha.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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