Editorial – Uma aula sobre como cavar a própria cova

Aos democratas e revolucionários, a situação nos requer máxima potência na mobilização das massas empobrecidas, por desmascarar toda e qualquer ilusão e combater a extrema-direita em todos os termos, sobretudo no campo, ecoando os enfrentamentos armados entre revolução e contrarrevolução, entre massas em luta e as hordas paramilitares bolsonaristas, e tomando firme posição pelos primeiros

Editorial – Uma aula sobre como cavar a própria cova

Aos democratas e revolucionários, a situação nos requer máxima potência na mobilização das massas empobrecidas, por desmascarar toda e qualquer ilusão e combater a extrema-direita em todos os termos, sobretudo no campo, ecoando os enfrentamentos armados entre revolução e contrarrevolução, entre massas em luta e as hordas paramilitares bolsonaristas, e tomando firme posição pelos primeiros

Superado o primeiro turno, os cálculos são desanimadores para a falsa esquerda. Apenas em duas capitais o PT foi para o segundo turno, sem contar Boulos, em São Paulo; delas, em que pese que a disputa esteja aberta, por ora tende a perder em todas. Nas prefeituras em geral, o PL, partido de Bolsonaro, fez 510 eleitos, logo no primeiro turno – o dobro do que o PT – e, nas capitais do Nordeste em particular, também superou o PT (PL venceu em Maceió e está no segundo turno em Aracaju, João Pessoa e Fortaleza). Aqui, não estamos calculando os bolsonaristas ferrenhos de outros partidos (o que há, e muito) e nem tampouco os caciques do poder oligárquico, fortemente vinculados ao “centrão” no Congresso que, não sendo exatamente do grupo de Bolsonaro, partilha de todos os seus valores de reação extrema, sobretudo no que tange à repressão na luta pela terra e aos pobres, de modo geral, apenas diferenciando-se por desejá-la pela via parlamentar: considerando estes, o estrago é ainda maior. Afinal, 98% dos prefeitos que mais receberam emendas parlamentares foram reeleitos no primeiro turno – emendas cedidas pelo governo oportunista e fortemente controladas, sobretudo, pelo bolsonarista moderado, senhor Arthur Lira.

Temos aqui uma aula, ministrada pelo senhor Luiz Inácio, de como fortalecer a direita. Ceda-lhe emendas parlamentares à exaustão; entregue-lhe os mecanismos de governar; governe, portanto, segundo ordene o chantagista, e dissuada toda e qualquer possibilidade de crise política cedendo ainda mais. Lira tem, hoje 17 “afilhados” políticos no alto escalão do Executivo; as emendas, destinadas ao “centrão”, superam, e muito, o “orçamento secreto” de Bolsonaro… O resultado está aí.

O erro de cálculo é óbvio: o PT pensa que se pode isolar o bolsonarismo do “centrão”, comprando a este. Erra, na medida em que o “centrão” tem a mesma base social que o bolsonarismo: o latifúndio. O bolsonarismo, como fenômeno político e social, tem ali suas raízes, fincadas em séculos de predomínio da servidão ainda vigente sob novas formas e da escravização dos pretos por longos 350 anos, e é uma reação visceral à luta popular, particularmente camponesa (o que mais enfurece o bolsonarismo que não os movimentos de luta pela terra?); e o “centrão” e seu sistema de poder “municipalista” e regional, isto é, oligárquico, são a expressão institucional e parlamentar dessa mesma base social, de onde surgiram, por exemplo, as hordas paramilitares da antiga UDR (quem não se recorda?). Portanto, embora divirjam, hoje, de qual a solução programática para a crise profunda do País – o bolsonarismo e a extrema-direita pugnam por um regime militar, da qual ora discorda a direita tradicional parlamentar –, de resto, partilham os mesmos valores, inclusive a repressão brutal às massas em luta e o aprofundamento da exploração máxima; e, mesmo no plano tático, embora cada qual por um motivo específico, também convergem em retirar funções do STF, como a PEC recentemente aprovada por ambas as forças o demonstra (e da qual falaremos mais adiante). Não a toa, como se pode ver nas movimentações já em curso para as eleições de 2026, a direita parlamentar (“centrão”) tende a se unificar em torno de um candidato bolsonarista, que não pugne imediatamente pela ruptura institucional, o que chamam o “bolsonarismo moderado”: e usarão, para elegê-lo, num esforço coordenado, toda a máquina do Estado para a qual se elegeram, com o generoso contributo do atual governo.

Ao fortalecer a direita parlamentar tradicional e que levou a reforçar a bancada da extrema-direita, como fez desde a sua posse e primeiro dia de governo, Luiz Inácio prepara, de forma monumental e com notável competência, o retorno do bolsonarismo, e o seu próprio fracasso.

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Por falar no STF, a PEC que lhe retira funções é uma excrecência: desconhece-se, na história dos Estados burgueses, algum tipo de controle supervisório do judiciário pelo legislativo, deste modo. É fato que tal projeto, muito improvavelmente, verá a luz do dia; se o ver, será porque estamos a pouco tempo de uma nova constituição, formalmente ou de fato. Porque, realmente, se tal projeto se impor, significará, na prática, o colapso deste regime político vigente, não apenas no sentido de horizonte político-institucional, mas imediato prático.

Ainda assim, o fato de tal projeto ser escrito, apresentado e votado na Comissão de Constituição e Justiça – ainda que com o fim de chantagear o STF – é sinal do esgotamento mesmo desse regime político. Todos concordam que não há mais consenso, entre os “poderosos”, sobre como “regrar o jogo” que eles mesmos controlam. Mas o caso é pior se levarmos em conta que o projeto, que visa dar ao Congresso interferência no judiciário, não é um caso isolado: as Forças Armadas reacionárias vêm, de fato, intervindo, não apenas no Congresso (ver a GLO, de 2017, imposta sabe-se lá por quem, para pressionar os parlamentares a aprovar a “Reforma Trabalhista” e reprimir os protestos que ocorriam), no STF (lembrar do tuíte de Villas-Bôas, dando “bons argumentos” que fizeram Rosa Weber mudar seu voto e impugnar, na prática, a candidatura de Luiz Inácio em 2018) e até no Executivo (cujo governo Bolsonaro é a expressão máxima dessa tutela, ao termo mais ministros militares do que após o golpe civil-militar pró-ianque de 1964). Por sua vez, o Congresso usurpa o orçamento do Executivo; o judiciário legisla e, enfim, todos ultrapassam os limites uns dos outros. É o que Lenin dizia: “os de cima já não podem seguir governando como antes”. Os índices de boicote eleitoral, que nestas eleições chegaram a certamente um terço do eleitorado – contando abstenções, incluídos os não cadastrados, os votos nulos e brancos –, combinados com os levantamentos populares atomizados e a descrença reinante mesmo entre os votantes, demonstram que temos, aqui também, a continuação da sentença de Lenin: “os de baixo não aceitam seguir como antes”. É a situação revolucionária, que se desenvolve. Aos democratas e revolucionários, a situação nos requer máxima potência na mobilização das massas empobrecidas, por desmascarar toda e qualquer ilusão e combater a extrema-direita em todos os termos, sobretudo no campo, ecoando os enfrentamentos armados entre revolução e contrarrevolução, entre massas em luta e as hordas paramilitares bolsonaristas, e tomando firme posição pelos primeiros.

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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