Em meio à crise, povo argentino levanta ondas de confiscos

Povo argentino confisca mercados contra a fome e a crise. Foto: Bruno Cerimele / AP

Em meio à crise, povo argentino levanta ondas de confiscos

Nas últimas semanas, uma grande onda de confiscos de produtos em grandes redes de supermercados e lojas têm ocorrido em diversas cidades na Argentina. A maior parte desses episódios estão ocorrendo nas cidades da região metropolitana de Buenos Aires, sobretudo na própria capital, mas também nas províncias de Córdoba, Mendonza, Neuquéne e Rio Negro. Esses casos têm ocorrido em meio a uma grave crise econômica e política que assola a Argentina. O país hoje tem uma das maiores inflações do mundo, que acumulada nos últimos 12 meses atinge o número de 115,6%. Dados do Instituto Nacional de Demografia e Censos (Indec), apontam também que 38,7% da população argentina vive hoje abaixo da linha da pobreza. 

Com o agravamento dessa grave crise, saques como estes têm se tornado cada vez mais frequentes, e os produtos confiscados são principalmente alimentos tomados de grandes redes de supermercados. Tal situação expressa a pauperização crescente das massas que não têm tido garantidas as suas condições mínimas de subsistência.

Um ativista que participou dos confiscos, Raúl Castells, declarou à imprensa que “o fato criminoso aqui é que o quilo de bife a milanesa custe 4.200 pesos (R$32) e um quilo de batata custe mil pesos (R$7,60), e um quilo de açúcar também custe mil pesos, que digam que estamos cometendo crime é uma afronta ao povo”. Tal declaração expressa que a fome é o fato que motiva as centenas de massas argentinas a se somar a essa onda de confiscos.

Em resposta a essa situação, o velho Estado argentino têm recrudescido a repressão contra as massas famintas. Sendo assim, muitos dos confiscos se converteram em verdadeiros protestos e rebeliões, com a ocorrência de enfrentamento do povo contra forças policiais. Para tentar se prevenir de uma maior escalada da rebelião inevitável das massas, diversas prisões têm ocorrido, tendo sido já registradas mais de 200 em todo o país.

A crise e a farsa eleitoral

Prevista para ocorrer em outubro deste ano, reacionários que disputam a farsa eleitoral na Argentina tentam impactar a opinião pública referente aos saques. O governador de Buenos Aires, Axel Kicilloff, do partido oportunista do gerente de turno Alberto Fernández, afirmou que “os moradores e moradoras [de Buenos Aires] não participaram de forma expressiva”, buscando negar a massividade dos confiscos e que o motivador destes é a grave crise econômica e a consequente pauperização das massas. Não admitindo portanto a responsabilidade do atual governo de turno de dar alguma resposta aos principais problemas econômicos que colocam o povo em situação de pobreza.

Os partidos e movimentos ligados ao atual governo de turno acusam também uma suposta ligação entre a extrema-direita e o aumento dos confiscos, afirmando que se trataria de uma patranha do candidato ultrarreacionário Javier Milei a fim de desestabilizar o atual governo oportunista para enfraquecê-lo eleitoralmente. Discurso que ignora que a alta da inflação, da pobreza e do desemprego é o que motiva massas de todo o mundo a se rebelarem e realizarem esse tipo de confisco.

O aumento da violência decorrente dos enfrentamentos das massas contra a repressão do velho Estado têm colocado em pauta a possibilidade de se impor um estado de sítio no país, para que se garanta a “segurança” da farsa eleitoral. Neste sentido, a tendência que se aponta é de que as eleições na Argentina sejam tão militarizadas como foram as eleições no Brasil (2022) e no primeiro turno no Equador (agosto de 2023), convergindo na América Latina as mesmas tendências: graves crises políticas e econômicas e a escalada da repressão e militarização do velho Estado nestes países.

A crise também atinge o Brasil

Não é por mera coincidência que confiscos como estes também tenham ocorrido no Brasil. Os preços dos alimentos citados por Castells em sua declaração são praticamente idênticos aos dois países, o que aponta que há uma crise geral que atinge de forma mais aguda os países de capitalismo burocrático, como os países da América Latina. Ao consultar o encarte de um supermercado do Rio de Janeiro no dia 25/08 foi observado o quilo do acém bovino pelo valor de R$35,90, o quilo da batata no valor de R$6,80 e o açúcar a R$5,00. Sendo assim, além de poder se apontar uma tendência para que tais fatos também se desenvolvam no Brasil, é possível observar já aumento nas ocorrências desse tipo de confiscos nos últimos meses.

Em outubro de 2022, por exemplo, o portal de AND noticiou as multidões famintas que confiscaram alimentos no Centro Estadual de Abastecimento do Rio de Janeiro (Ceasa), localizado na Zona Norte do Rio de Janeiro, um dos maiores centros de abastecimento da América Latina. Em abril do mesmo ano, 200 trabalhadores confiscaram também uma franquia da rede de supermercados Inter, em Inhaúma, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Em 2023, foi também noticiado o confisco de um caminhão de galinhas ocorrido na Cidade de Deus, zona oeste do Rio de Janeiro. Fatos que, com intervalos de menos de um ano entre eles e somados a muitos outros, mostram que a agudização da miséria e fome é o fator que empurra as massas a realizarem esse tipo de ação. Sendo assim, ondas de confiscos que hoje ocorrem em grandes proporções na Argentina tendem atingir  também o Brasil em grandes proporções.

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