Em ‘retreinamento’, instrutor diz que PM sempre cometerá abusos e aconselha driblar filmagens

Em ‘retreinamento’, instrutor diz que PM sempre cometerá abusos e aconselha driblar filmagens

31.mar.1997 – Reportagem no Jornal Nacional mostrou grupo de PMs extorquindo, espancando, torturando e matando inocentes em blitz na Favela Naval, em Diadema, na Grande SP. Foto: Banco de Dados AND

Um major da PM disse em uma palestra a uma das primeiras turmas dos 70 mil policiais militares em retreinamento em São Paulo que os abusos e brutalidades cometidos pela instituição ocorrem há 188 anos e sempre vão ocorrer e orientou policiais para que não fossem flagrados por filmagens.

O policial disse, no batalhão da zona sul da capital paulista, que “a PM faz isso há 188 anos e sempre vai fazer. Você, policial, tem que ficar atento porque sempre terá alguém filmando”.

Nesse retreinamento, segundo o governo, são aprimorados “os processos de atuação da instituição”. Os policiais participam de palestras sobre “polícia comunitária, direitos humanos e cidadania, abordagem policial e gestão de ocorrência”.

Nas instruções são analisadas ocorrências, assim como abusos (chamadas pela secretaria de “não conformidades”), para demonstrar como “os procedimentos devem ser executados corretamente”. Na palestra de treinamento foram exibidos os casos da Favela Naval (1997) e dos abusos cometidos no Jaçanã (junho deste ano).

O retreinamento foi ordenado no mês de junho pelo governador reacionário João Dória em meio a uma série de casos de violência policial e no período em que a letalidade policial bateu recorde no estado, diante do desespero do governador de que ocorressem outros levantamentos nas favelas em rechaço às matanças da juventude preta e pobre, como os que deixaram dez ônibus queimados e viaturas destruídas em junho deste ano. 

Ainda como candidato, em 2018, o grande burguês já afirmava que durante sua gestão a polícia iria “atirar para matar” e prometendo “os melhores advogados” aos policiais que matam no estado.

No primeiro semestre de 2020, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP), as polícias Civil e Militar mataram, juntas, 514 pessoas em supostos tiroteios em serviço e também durante a folga de janeiro a junho deste ano. O maior número desde 2001. No mesmo período, apenas 28 policiais foram assassinados.

Investigações de PMs travadas

O recorde da letalidade policial ocorreu no mesmo período em que o departamento jurídico da Polícia Militar (PM) fez uma interpretação na lei federal do “pacote anticrime” em que determinava a suspensão das investigações de policiais que matam caso eles não nomeassem um advogado em até quatro dias, conforme revelou o monopólio de imprensa UOL em 14 de julho deste ano. O Ministério Público, no entanto, orientou, após a exposição da imprensa, e com medo de represálias, que as investigações deveriam prosseguir.

Ao todo, segundo juízes civis e militares, mais de 300 inquéritos policiais militares envolvidos em ocorrências com mortes estavam travados.

Favela Naval e barbaridades no Jaçanã

O major exibiu, segundo as fontes ouvidas pela reportagem do monopólio de imprensa da UOL, imagens do caso da Favela Naval, ocorrida em 1997 em Diadema, e das agressões praticadas contra um pizzaiolo no Jaçanã (zona norte de São Paulo), em junho deste ano. A SSP confirmou que no treinamento estão sendo feitos estudos de ocorrências, mas disse que a “ideia” é “orientar a não praticar esses atos”.

A Favela Naval é um caso emblemático de abusos cometidos pela polícia em São Paulo. Em 31 de março de 1997, o monopólio de imprensa exibiu uma reportagem com vídeos que flagravam militares extorquindo dinheiro, torturando e matando uma pessoa em uma blitz em Diadema, na Grande São Paulo. 

No caso do Jaçanã, um pizzaiolo de 27 anos que estava a caminho da casa da namorada foi gravemente espancado por pelo menos oito agentes da PM no último dia 13 de junho. Os policiais obrigaram ele a mentir na delegacia, mas o vídeo expôs o abuso. Ficaram detidos cerca de um mês e foram liberados. Além do pizzaiolo, pelo menos mais 17 pessoas foram agredidas pelos militares no local.

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