Milhares de pessoas foram às ruas do país exigir liberdade para o artista. Foto: redfishstream.
No dia 16 de fevereiro, o artista catalão e democrata de 32 anos, Pablo Hasél, foi levado à força por policiais que invadiram a Universidade de Lleida, onde o artista estava entrincheirado, protegido por estudantes que ocuparam o espaço. Entretanto, de 30 de janeiro até os dias que se seguiram ao seu encarceramento, milhares de pessoas tomaram as ruas em toda a Espanha para denunciar o mandado de prisão arbitrário. Em dezenas de cidades espanholas, moradores organizaram marchas e protestos exigindo anistia ao artista, além de condenarem a perseguição do Estado espanhol contra artistas do povo e ativistas.
De acordo com um estudo da organização não governamental Freemuse, a Espanha é um dos países mais repressivos no que diz respeito à liberdade artística, com o país classificado em n °. 1 em enviar músicos para a prisão em 2018.
Os protestos se fundiram com demais lutas, tais como as de independência catalã e galega, além de sentimentos republicanos e anti-monárquicos em todo o país. Além da capital (Madrid), outro grande foco dos protestos foi a cidade de Barcelona, onde os Mossos d’Esquadra (os policiais catalães) estiveram ativos para atacar as massas.
Vídeos divulgados na internet mostram a repressão brutal da polícia, com manifestantes sendo espancados com cassetetes, sendo presos arbitrariamente, além de diversos outros abusos graves.
Mais recentemente, no dia 19/02, milhares se manifestaram no centro de Barcelona para exigir a libertação do rapper em meio a uma ostensiva presença policial, em um quarto dia consecutivo de protestos combativos. Vários contêineres foram queimados e diversos manifestantes invadiram uma agência bancária em Pla de Palau.
Pela manhã na cidade de Cerdanya, manifestantes montaram uma barricada em chamas cortando o acesso ao túnel de Cadí-Andorra, em solidariedade ao artista.
Na cidade de Lleida (capital catalã), bombeiros usaram um caminhão guindaste para prestar uma homenagem a Hasél na prisão de Ponent, onde o Rapper se encontra preso. Os trabalhadores utilizaram grandes alto-falantes para tocar as músicas do rapper.
Através de uma conta na internet feita para divulgar atos em solidariedade ao rapper, também foram divulgadas pichações em protesto à prisão de Hasél em paredes de prédios bancários, do monopólio de imprensa e sedes de partidos eleitoreiros, entre outros lugares.
Diversos protestos multitudinários também ocorreram no dia 18/02, em apoio a Pablo Hasél. Em Barcelona, um jovem foi gravemente ferido pela polícia e convulsionou durante as manifestações, não sendo oferecido assistência médica após. Além disso, vídeos mostram a polícia utilizando vans em alta velocidade e jogando-as contra os manifestantes.
Em Madri, 19 manifestantes, incluindo 6 menores de idade que haviam sido presos nos protestos anteriores foram soltos no dia 18 e denunciaram que sofreram agressões e maus-tratos por parte da polícia. Foi-lhes negada também assistência médica. Eles também declararam que voltariam às ruas novamente para demonstrar apoio a todos os presos políticos e a Pablo Hasél.
Manifestantes protestam combativamente contra a prisão de Hasél e a repressão policial durante as manifestações. Foto: redfishstream.
Já em 17/02, dois dias após sua prisão, milhares tomaram as praças de dezenas de cidades do Estado espanhol. Durante a tarde, foi reportado forte atividade de agentes da Polícia Nacional Espanhola em cidades como Lleida, Girona, Barcelona e Vic. Em Lleida e Barcelona, os Mossos d’Esquadra montaram dispositivos para revistar as pessoas que compareciam aos protestos minutos antes do seu início.
As sedes dos partidos eleitoreiros PSC (o PSOE regional da Catalunha, oportunistas de “esquerda”) e do PP (“Partido Popular”, da direita) em Lleida foram atacadas com o lançamento de ovos e tinta durante os protestos enquanto entoavam Vocês, fascistas, vocês são os terroristas!. Em seguida, várias centenas de pessoas foram para a Subdelegação do Governo em Lleida, onde foram jogados fogos de artifício contra algumas vans dos Mossos.
Os manifestantes seguiram então para a prisão onde Hasél cumpria pena há um dia. Barricadas foram incendiadas próximas ao presídio e palavras de ordem contra as forças de repressão do Estado espanhol foram entoadas.
Em Girona também foram atirados objetos contra a polícia após ataques brutais aos manifestantes, e queimados contêineres no final da manifestação, que contou com a presença de cerca de 5.000 pessoas. A porta de um banco também foi queimada. Em Vic, manifestantes atacaram a delegacia de polícia dos Mossos, para quebrar vidros jogando pedras. Em Reus também aconteceram enfrentamentos.
Segundo os Mossos d’Esquadra, oito pessoas foram presas em Lleida, três em Barcelona e quatro em Vic, as cidades catalãs onde, junto com Girona, houveram grandes enfrentamentos durante as manifestações que foram realizadas em muitas cidades da Catalunha.
Os protestos também deixaram 30 manifestantes feridos, das quais oito necessitaram de transferência hospitalar. De acordo com fontes dos Mossos d’Esquadra os enfrentamentos deixaram quatro mossos feridos em Barcelona, onze em Vic e dois em Lleida.
Já as denúncias contra os ataques das forças de repressão do Estado espanhol no dia 16/02 foram inúmeras. Em Barcelona, uma pessoa perdeu um olho em consequência do impacto de uma bala de borracha disparada pelos Mossos. O advogado das sete pessoas presas na primeira noite de protestos em Lleida, no dia 15/02, também denunciou que todos estão feridos pelos espancamentos durante a prisão.
Manifestantes protestam combativamente contra a prisão de Hasél e a repressão policial durante as manifestações. Foto: redfishstream.
Entretanto, manifestações já ocorriam desde a intimação à prisão do artista pelo Estado espanhol.
No dia 30/01, dois dias após Pablo ser intimado, cerca de mil pessoas tomaram as ruas de Barcelona, exigindo o fim da perseguição ao artista. Os manifestantes marcharam com bandeiras e símbolos em defesa do rapper e pela independência catalã, ou contra a Monarquia espanhola.
Em frente à Delegação do Governo, manifestantes derrubaram as grades de segurança, além de lixeiras, que usaram para atear fogo. Confrontando os policiais que protegiam o prédio, eles atiraram garrafas de vidro e outros objetos. No ato, contêineres foram queimados e ao menos um ônibus alvejado. Além disso, uma barricada foi formada. Por fim, os bombeiros foram acionados para conter os focos de incêndio e as forças de repressão só puderam dispersar os manifestantes com o uso de veículos policiais. Ao menos uma pessoa foi detida.
Já na cidade de Lleida, 500 pessoas marcharam da Praça da Catedral, passando pelas sedes do PSC e do PP, denunciando ambos partidos burgueses com palavras de ordem, até alcançarem a subdelegação do governo, onde leram um manifesto em apoio a Hasél.
Outros protestos foram registrados em Girona, Manresa e outras cidades.
Após o dia 30/01, os protestos se difundiram e alcançaram diversas cidades do país, como Madrid, Alicante, Zaragoza, Valencia, Bilbao, Segóvia e Granada.
Em 06/02, centenas de pessoas se reuniram na praça Jacinto Benavente, no centro de Madrid. Iniciou-se, então, uma marcha pelas ruas da cidade, na qual os participantes cantavam palavras de ordem como Anistia total para o Pablo Hasél! e Abaixo à perseguição política!. Os manifestantes começaram então a bloquear as ruas com lixeiras, contêineres e grades das calçadas.
Pabo Hasél divulga comunicado sobre sua prisão e conclama massas à luta
No dia 12/02, Pablo Hasél divulgou seu último comunicado antes de sua prisão. Divulgamos aqui o comunicado em tradução livre:
“Hoje às 20:00 o prazo para entrar voluntariamente na prisão termina. Seria uma humilhação indigna andar por conta própria diante de uma sentença tão injusta, então eles terão que vir para me sequestrar. Tem havido muita solidariedade, mas ainda não o suficiente para impedir este grave ataque às nossas liberdades. A grande importância das numerosas e concorridas manifestações tem levado o Governo a prometer que vai reformar os pontos do Código Penal com os quais nos aprisionam, procurando assim desmobilizar e frear a solidariedade face ao lógico escândalo gerado por este nível de repressão. Mas sem mais pressão nas ruas, tudo vai virar fumaça como tantas de suas promessas, como a revogação da Lei da Mordaça, que eles também ampliaram com a “Lei da Mordaça Digital”. Além disso, eles proibiram e reprimiram as manifestações com a desculpa da pandemia enquanto permitiam as de fascistas ou outras aglomerações. Se a liberdade de expressão importasse para eles, eles já teriam agido há muito tempo, então se no final eles recuarem e me liberarem, será uma vitória do movimento de solidariedade porque não vou implorar por perdão ou qualquer coisa que implique arrependimento. Mais mobilizações foram convocadas quando me prenderam e o que é mais importante: assembleias para organizar a luta. Para que a solidariedade tenha continuidade e seja mais efetiva, é fundamental que haja uma organização. A batalha não estará perdida quando me prenderem, pelo contrário, será hora de intensificar a divulgação, mobilização, etc. Se você responder de forma enérgica, eles pensarão duas vezes antes de prender outros por denunciarem os culpados das políticas que sofremos. Se não retrocedermos o Estado no plano repressivo e outros, estaremos perdidos. Portanto, é isso, é hora de dizer basta e ir para a rua.
Não serei o único prisioneiro político, as prisões estatais estão cheias de revolucionários que nos representaram lutando pelos pelos direitos e pelas liberdades democráticas. Na verdade, parte da minha condenação é por explicá-lo e ser solidário com eles. Por isso é importante vincular a reivindicação da nossa liberdade, da minha liberdade, à da Anistia Total. Sob este regime a repressão contra nós não vai parar e é urgente não só fortalecer o movimento de solidariedade com esse ponto, entre outros, como a dissolução dos tribunais fascistas que nos condenam como Tribunal Nacional (herdeiro direto e com a mesma função como Tribunal de Ordem Pública franquista), também organizam a luta para acabar com a raiz do problema. Precisamos caminhar para a conquista de uma República Popular na qual, ao tomar o poder, tenhamos garantido os direitos e as liberdades que este Estado nos nega, seja qual for o governo. Todos podemos contribuir para aproximar o fim de tanta barbárie e conquistar vidas dignas, fiz e continuarei a fazer desde a prisão. 12 de fevereiro de 2021, Pablo Hasél.”
Quem é Pablo Hasél?
Pablo Hasél é levado à força da Universidade de Lleida pela polícia. Foto: Reuters.
Pablo Rivadulla Duró, ou Pablo Hasél, é um rapper, poeta, músico e ativista catalão, que, em sua arte, denuncia o Estado espanhol (“fascista em disfarce”, nas suas palavras), enquanto presta homenagens a personagens históricos revolucionários e prestigia as lutas dos povos oprimidos.
Na última década, Hasél foi alvo de diversas investidas por parte do Estado espanhol, seja por suas músicas denunciando crimes deste, ou de sua família real, até menções elevando a luta por liberdade e democracia populares travadas por grupos armados locais como o ETA e o GRAPO. Assim, com acusações de “exaltação ao terrorismo” ou prints de publicações do artista nas redes sociais, diversos processos ainda recaem sob o artista.
No conteúdo dos tweets utilizados como prova constavam coisas como denúncias a guerras de rapina imperialistas e à violência policial.
Em 28/01, o Judiciário espanhol deu 10 dias a Hasél para se apresentar voluntariamente à prisão, após ter um recurso de sua defesa negado. Após ser notificado, o rapper reafirmou através de denúncias o caráter fascista do Estado espanhol e declarou que não iria preso voluntariamente.