O ex-comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, ordenou no dia 29 de dezembro de 2022 que os acampamentos bolsonaristas continuassem intocados. A ordem foi dada contra as atitudes do general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, ex-comandante militar do Planalto, que havia dado instruções para desmontar o acampamento em frente ao Quartel-General de Brasília.
Segundo o colunista do Estadão Marcelo Godoy, a justificativa do general Freire Gomes foi a “ausência de ordem” do então presidente Jair Bolsonaro, e um “receio” frente a qual seria a reação do ex-presidente. Todavia, as justificativas “oficiais” escondem que o mesmo imobilismo do generalato da ativa frente aos acampamentos observado no “apagar das luzes” do governo Bolsonaro foi registrado no início de janeiro, já sob o novo governo, quando Bolsonaro nem mais estava no país. Ou até mesmo no dia 07/01, quando as Forças Armadas já conheciam, por meio de seus próprios serviços de inteligência, da preparação da segunda bolsonarada.
O que a omissão revela é que os generais buscavam a manutenção dos acampamentos para atingir seus próprios interesses em um contexto de agitação da extrema-direita. No momento em que Freire Gomes cancelou a ordem do general Dutra, ele já conhecia de perto os planos por uma ruptura institucional. Isso porque ele, junto dos comandantes das outras duas Forças, participou no dia 24 de novembro de uma reunião com o próprio Bolsonaro na qual o ex-presidente declarou expressamente sua vontade de seguir à deflagração de um golpe aberto.
Mesmo assim, Freire Gomes e os outros generais faziam questão de dar voo livre às agitações golpistas. No dia 10/12, os mesmos comandantes que reuniram-se com Bolsonaro lançaram o comunicado intitulado “Às instituições e ao Povo Brasileiro”, uma nota oficial das Forças Armadas assinada pelos três comandantes onde assumiram a defesa aberta dos acampamentos, tentando diferenciar das ações de violência política da extrema-direita bolsonarista e, ao mesmo tempo, contemplar as expectativas da extrema-direita para evitar a desmoralização do ACFA. Após a publicação do documento, o número de acampados em frente ao Quartel-General de Brasília quase triplicou, com aumento de 30 mil no dia 2 de novembro para 100 mil em 15 de novembro. Serviu, na prática, para aprofundar a agitação golpista.
Além disso, alguns dos generais das Forças Armadas reacionárias haviam embarcado na agitação pela ruptura institucional aberta feita pela extrema-direita. Era o caso do próprio almirante Almir Garnier (Comandante da Marinha), que afirmou que as suas tropas estavam prontas para os planos de Bolsonaro, mas também de generais do Comando de Operações Terrestres (Coter), força na qual, segundo Godoy, concentravam-se parte dos generais da ativa arrastados pela extrema-direita.
A mesma postura foi registrada por parte de generais da reserva, que demonstraram seu apoio de forma ainda mais escancarada (motivo, inclusive, de pugna entre os dois setores, da ativa e da reserva). No mês de novembro, Braga Netto fez sua famigerada visita ao acampamento de Brasília para exortar os acampados a não “perderem a fé”. Já em dezembro, um dia antes de Dutra dar a ordem cancelada por Freire Gomes, a esposa do general Villas-Bôas visitou o acampamento e deu a entender, com gestos, que seu marido estaria com ela.