Exército finge punir iniciativa militar de carta que pressionou para golpe em 2022

Exército reacionário indiciou três dos quatro militares redatores da carta. Investigação não encostou nos outros milhares de assinantes do documento.
Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Exército finge punir iniciativa militar de carta que pressionou para golpe em 2022

Exército reacionário indiciou três dos quatro militares redatores da carta. Investigação não encostou nos outros milhares de assinantes do documento.

Através de um corporativo Inquérito Policial Militar (IPM), instrumento jurídico herdado do regime militar para impedir que militares sejam julgados na justiça civil, o Exército reacionário brasileiro indiciou três dos quatro coronéis apontados como autores de uma carta, redigida em 2022, para pressionar por um golpe militar no País. As investigações não tocaram nos outros milhares de assinantes da carta.

Os coronéis indiciados são Anderson Lima de Moura, da ativa, e Carlos Giovani Delevati Pasini e José Otávio Machado Rezo Cardoso, ambos atualmente na reserva. Quando escreveu a carta, Pasini ainda estava na ativa. O quarto redator, Alexandre Castilho Bitencourt da Silva, da ativa, não foi indiciado porque ele conseguiu suspender os atos da sindicância que deu origem ao IPM por meio de uma liminar.

A 2° Procuradoria da Justiça Militar em Brasília vai analisar o inquérito e decidir se cabe denunciar os três coronéis. O Ministério Público Militar também pode requisitar diligências.

Ao todo, a sindicância do Exército investigou somente 37 militares envolvidos na assinatura, produção ou disseminação do documento. Um número bem abaixo do total de envolvidos. A branda punição de “penalidade administrativa” foi dada para 12 coronéis, 9 tenentes-coronéis, 1 major, 3 tenentes e 1 sargento. Outros 11 militares não receberam nenhuma punição por “justificativas consideráveis”, segundo o Exército.

Exército mentiu sobre carta

A carta foi escrita e divulgada após o processo eleitoral de 2022, quando bolsonaristas se organizavam em acampamentos pelo País e promoviam ações explosivas e bloqueios de ruas para pressionar uma ruptura institucional.

Altos oficiais da ativa redigiram carta para pressionar comandante do Exército à ruptura institucional aberta – A Nova Democracia
Em 2022, generais do Exército buscaram descredibilizar a carta ao considerá-la “apócrifa” e assinada majoritariamente por militares da reserva. Agora, a primeira evidência sobre a carta comprova que a redação da carta, ou seja, a principal iniciativa por trás do documento, na verdade o documento foi obra de altos oficiais da ativa.
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Quando tornada de conhecimento público, o Exército buscou diminuir a importância da empreitada, taxando-a de “apócrifa”, assinada por “militares da reserva” e incompatível com “o pensamento majoritário hoje na tropa”. Todas as informações reveladas posteriormente desmentiram essas impressões iniciais do Exército reacionário.

O que está por trás?

O inquérito, portanto, busca desviar as atenções do que verdadeiramente está por trás da carta.

Primeiro, a participação massiva de militares, dentre eles gente da ativa, na divulgação e assinatura do documento “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, diferente do que o Exército reacionário afirmou de início.

Segundo, como a carta não foi o único exemplo de militares reacionários da ativa na empreitada golpista. Outros altos oficiais, como Estevam Theophilo, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres, estavam por dentro dos planos e dispostos a comandar tropas durante a ruptura. Os próprios comandantes das Forças sabiam dos intentos de Jair Bolsonaro e outros golpistas do núcleo-duro, mas agiram com leniência à época.

Terceiro, como a carta, assim como todos os outros esforços golpistas da extrema-direita foram consequência das práticas intervencionistas do Exército reacionário no País desde 2015. Caso emblemático foi o tweet do ex-comandante do Exército, Villas-Bôas, escrito por todo o Alto Comando do Exército (como revelado pelo próprio ex-comandante em um livro), inclusive o atual comandante Tomás Paiva, para pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a negar o habeas corpus de Luiz Inácio antes das eleições de 2018.

Quarto, como o Exército reacionário, em 2022, ciente da disputa acirrada na caserna entre os planos da direita militar (de intervir veladamente nas instituições) e da extrema-direita (uma ruptura institucional aberta), tentou cooptar a base da extrema-direita encabeçada por Bolsonaro através do próprio intervencionismo, a exemplo do monitoramento do pleito eleitoral e funcionamento das urnas (com um diagnóstico ambíguo sobre a validez dos equipamentos eletrônicos) e da legitimidade ao movimento da extrema-direita, pela redação de uma carta que elogiava as manifestações em frente aos quartéis e do apoio logístico aos acampamentos.

Exército, Marinha e Aeronáutica aprovaram manifestações golpistas
Trecho de carta do Exército, Marinha e Aeronáutica sobre manifestações golpistas. Foto: Reprodução

E quinto, como o Exército reacionário estava disposto a fazer a ruptura institucional, e só não a concretizou por conta do veto do Departamento de Estado ianque.

Intervencionismo continua

Se o Exército reacionário pune, hoje, algumas poucas cabeças mais diretamente envolvidas na empreitada golpista, não é pelo abandono dos planos de um golpe militar velado, como revela o recente “Plano 40”, de caráter intervencionista, elaborado pela instituição.

O motor desses movimentos é a posição mais defensiva em que os generais reacionários foram colocados e para retomar a hegemonia dos planos da direita militar tradicional sobre as tropas.

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