Um tenente-coronel do Exército reacionário está sendo investigado por vazar informações sobre operações policiais a grandes garimpeiros na região do Japurá, no Norte do Amazonas, próximo à divisa com a Colômbia. Segundo um relatório da Polícia Federal (PF), Abimael Alves Pinto recebeu R$ 930 mil entre 2020 e 2022. O militar era lotado no subcomando do Batalhão de Selva e era responsável pelo controle operacional de ações na fronteira.
O caso evidencia a leniência do Exército reacionário na defesa dos grandes garimpeiros, colocando a ocupação militar da Amazônia a serviço do latifúndio e sua exploração predatória, como mais uma ação contrainsurgente contra a luta pela terra.
De acordo com o relatório da PF, o militar reacionário (e, ao que tudo indica, corrupto) também atuava pela instituição no estado de Rondônia (RO), e os pagamentos foram efetuados por uma empresa de importação e exportação de minérios sediada em Porto Velho (RO).
No início de 2020, a PF rastreou mensagens em que um primo do militar oferece os “serviços” do tenente-coronel pelo preço de R$ 20 mil por mês. “Vamos livrar ele [os donos do garimpo] todo santo dia de ser pego”, diz. Do outro lado da linha, o garimpeiro “Pedrinho Marcondes” responde: “Pode deixar certo com ele então todo dia 20 (…). Todo dia 20 vai estar na conta, tá bom?”. Na residência do militar reacionário, em Ponta Grossa (PR), foram apreendidos relógios e jóias em valores milionários.
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Operações dirigidas pelo Exército foram canceladas para acobertar criminosos
O relatório descreve a interferência direta do militar reacionário no deslocamento da equipe de fiscalização, alteração na rota dos locais que seriam fiscalizados e até mesmo cancelar fiscalizações em locais específicos, em operações do Exército reacionário, PF e Ibama. Algumas eram repassadas e respondidas em tempo real, enquanto ocorriam as ações.
Em um dos áudios, o garimpeiro pede informações sobre a presença de militares em determinada região de onde as dragas se encontravam próximas, e recebe do tenente-coronel informações detalhadas, que são repassadas para que o grande garimpeiro explorador do povo se tranquilize: “Ele tá aí, pelo que eu tô vendo, a poucos quilômetros da cabeça do cachorro. Do rio Traíra. É uma área onde a gente atua bastante, entendeu? (…) Exatamente essa alça aí do rio Juami também é um dos pontos onde a nossa brigada faz muitas operações, entendeu? E agora ainda com a Operação Verde Brasil 2 essa é uma área que vai ser muito batida”, disse. As tropas do Exército e PF, apesar de presentes na região, não fizeram nenhuma abordagem no local.
Em outro momento dos áudios é possível ouvir o tenente-coronel falando em “mudar a direção” de operações e “dar uma atrasada” no deslocamento das tropas. Ele estava em contato com outros militares envolvidos no esquema: “Eu pedi pra ver se ele consegue dar uma atrasada, tá? Inventar alguma coisa lá pra tornar o deslocamento mais lento da tropa. (…) Eu já mudei a direção, tá? Só que a gente ia chegar lá mais ou menos na sexta-feira próxima e o pessoal que tá lá chega na quarta, tá? E essa que a gente ia fazer não vamos fazer mais, tá? Então fala pra ele que ele tem aí uns três… dois dias e meio. Fala que ele tem dois dias e meio para tirar as coisas dele lá”.
Para além de interesses econômicos
A Amazônia, região de fronteira com diversos países, de extensa mata virgem e de intensa atuação do movimento camponês em luta por terra aos pobres do campo, é estratégica sob vários aspectos para o velho Estado brasileiro de grandes burgueses e latifundiários. Casos como o do tenente-coronel Alves Pinto não ocorrem, de forma alguma, somente enquanto “eventos de corrupção isolados”. Diante do perigo de agudização da contradição entre camponeses pobres/indígenas versus latifundiários, as Forças Armadas reacionárias atuam militar e politicamente.
Ou seja: para garantir que o latifúndio siga matando, explorando e sugando as riquezas da Nação impunemente, as genocidas Forças Armadas brasileiras são, de maneira coordenada, empregados para atuar na região. Tal defesa se faz tanto politicamente, atendendo tanto aos interesses econômicos (aos quais a corrupção generalizada é a regra) do latifúndio, como também militarmente com o emprego de militares na coordenação de mega-operações genocidas.
Hamilton Mourão, por exemplo, em 2019, recebeu o grande minerador José Altino Machado, conhecido como “rei do garimpo”. José Altino foi o responsável pelas três maiores invasões nas TIs Yanomamis, nos anos 70, 80 e 90. Dirceu Frederico Sobrinho, agente financeiro acusado de lavagem de dinheiro e “danos ambientais” em Itaituba (PA), e que comanda a Associação Nacional do Ouro (Anoro), também foi recebido em reuniões diversas pelo general.
Nos anos de 2020 e 2021, cerca de 800 famílias camponesas se levantaram para defender suas terras, conquistadas junto da Liga dos Camponeses Pobres (LCP). Uma operação de despejo coordenada pelo Exército reacionário e que mobilizou Polícia Militar e Força Nacional visava um grande massacre contra os mais de 3 mil camponeses. O resultado foi o assassinato de dois camponeses e muitas violações de direitos básicos, torturas e agressões por parte dos agentes das forças de repressão do velho Estado. Porém, foi com uma heroica mobilização, enfrentando um aparato de guerra, que os camponeses garantiram a sua permanência na terra.