Depois do fiasco bolsonarista no Rio, ato “contra o golpe” revela limites dessa velha democracia

É difícil mobilizar as massas para a defesa de um governo que não atende aos interesses mais básicos e de um regime cujas “garantias democráticas” são desconhecidas para as massas populares mais empobrecidas
Foto: Ricardo Yamamoto/The New S2/Estadão conteúdo

Depois do fiasco bolsonarista no Rio, ato “contra o golpe” revela limites dessa velha democracia

É difícil mobilizar as massas para a defesa de um governo que não atende aos interesses mais básicos e de um regime cujas “garantias democráticas” são desconhecidas para as massas populares mais empobrecidas

Ontem, ocorreram protestos em algumas cidades contra o projeto de lei da “anistia” aos galinhas verdes bolsonaristas – um artifício político montado por Bolsonaro para tentar enfraquecer o processo que tende a levá-lo à prisão e fortalecer a mobilização da base social fascista do ex-presidente.

Os atos, organizados pela falsa esquerda cerca de duas semanas depois do fiasco do bolsonarismo na Orla de Copacabana, no Rio de Janeiro, revelam os limites de se pretender mobilizar as massas contra a extrema direita ancoradas na defesa da velha democracia. O maior dos atos, em São Paulo, teve 6,6 mil pessoas presentes, segundo o monitor da Universidade de São Paulo (USP). O número foi bem abaixo da expectativa de 20 mil de Guilherme Boulos (Psol) e bem reduzido para uma manifestação organizada pelas principais centrais sindicais dirigidas pelo oportunismo e por movimentos de falsa esquerda e governistas como a Frente Povo Sem Medo e a Frente Brasil Popular.

A dificuldade da falsa esquerda em mobilizar as massas para um ato com este caráter não surpreende. Acima da pauta anti-anistia dos galinhas verdes, o protesto foi regido pela defesa da “democracia” burguesa e pela equiparação do governo de Luiz Inácio a essa democracia.

Mesmo com o aparato sindicato e estatal nas mãos, é difícil para o oportunismo mobilizar as massas – afora o círculo de ativistas engajados nas organizações – para a defesa de um governo e de um sistema político que não atende aos interesses mais básicos, como a queda do preço dos alimentos, a entrega das terras aos camponeses pobres, a baixa das taxas de juros e do endividamento em massa, dentre outros, e de um regime cujas “garantias democráticas” são desconhecidas para as massas populares mais empobrecidas, cujas liberdades são defendidas não pela letra da lei, e sim pela combativa luta popular, e que passa por uma violenta crise de legitimidade justamente por não atender aos interesses dessas massas. 

Alguns dados que elucidam a questão são que, em 2024, o governo só assentou 5,8 mil famílias (4% da demanda total de acampados no país), um dado criticado até mesmo pelo governista Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em três anos de governo, a equipe federal não tomou nenhuma medida concreta para encerrar os índices crescentes de violência que parte de forças de repressão oficiais contra os pobres, seja na cidade ou no campo; antes, a PEC da Segurança Pública pretende militarizar e dar funções ostensivas à Polícia Rodoviária Federal, justamente como fizeram Bolsonaro e sua equipe. As forças paramilitares do latifúndio no campo também ficaram intocadas ao longo dos últimos dois anos. De modo que o ano de 2023 registrou um recorde de conflitos no campo e os 6 primeiros meses de 2023 foram o 2° colocado na lista de primeiros semestres com mais conflitos desde 2015. 

No âmbito econômico, o governo não conseguiu conter a alta dos alimentos, da energia elétrica e dos combustíveis – grupos que mais subiram nas últimas altas, segundo o IBGE –, simplesmente porque se recusa a confrontar os interesses de latifundiários, de magnatas do setor elétrico e de acionistas e bilionários do ramo do petróleo, conforme já mostrado extensivamente por AND. A taxa básica de juros sofreu novas altas mesmo sob a gestão do indicado de Luiz Inácio no Conselho de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), chegando ao patamar de inacreditáveis 14,25% – uma das maiores do mundo, só ficando atrás da Turquia, Argentina e Rússia. 

Por outro lado, isso não significa que as massas não estejam mobilizadas pelas defesas de seus interesses e pelos direitos e liberdades democráticas. Nas últimas duas semanas, protestando contra o “marco temporal” e a “mesa de conciliação” no Supremo Tribunal Federal (STF) montada por latifundiários e pelo STF para fingir uma legitimidade indígena à tese, os indígenas do povo Munduruku bloquearam uma importante avenida no Pará – enfrentando tiros e tentativas de atropelamento –, indígenas Xokleng lançaram um manifesto contra o STF e contra as posições do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) sobre a questão, e indígenas de 24 povos fizeram uma reunião nacional em Douradina, Mato Grosso do Sul.  Também nas últimas semanas, a União das Comunidades em Luta (UCL) do Vale do Rio Gurupi protestou contra o uso do judiciário pelo latifúndio, manifestações em Betim (MG), Carminha (AL) e Londrina (PR) denunciaram os crimes da Polícia Militar (PM) contra o povo pobre, estudantes da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) ocuparam a reitoria da instituição para denunciar o sucateamento do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e petroleiros fizeram uma greve de 24 horas por melhores condições de trabalho.

Enfim, os acontecimentos demonstram que as massas básicas, mobilizadas em defesa de seus direitos em lutas atomizadas, repelem a extrema direita, como também se desinteressam – no mínimo – pela velha democracia.

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