Nestes últimos dias do mês de maio de 2024, os estudantes e professores do estado do Paraná foram surpreendidos pela notícia de que o governo de turno do estado, chefiado pelo Sr. Ratinho Jr., apresentou um Projeto de Lei à Alep (Assembleia Legislativa Estadual do Paraná), com o cínico nome de “Parceiro da Escola”, que visa privatizar os colégios da rede pública de ensino do estado. O Projeto irá para votação ainda na última semana do mês, e tem gerado revolta geral de todo o corpo estudantil e docente, secundarista e universitário estadual, que começa a se mobilizar para impedir o avanço do PL.
Sobre o Projeto de Lei
O Projeto de Lei “Parceiro da Escola”, conforme anunciado pelo governo, trata da privatização da gestão escolar de 200 colégios estaduais do Paraná. Tal projeto teria por objetivo, segundo alega o governador do estado, desburocratizar as escolas, ou seja, para tirar a sobrecarga do trabalho dos diretores, as empresas farão toda a gestão administrativa, financeira, de infraestrutura e de desenvolvimento acadêmico de professores e alunos, dada a alegada “incapacidade” do governo de estado de gerir as 2,1 mil escolas estaduais da rede pública estadual de ensino.
Na prática, todo o corpo escolar estará submetido aos mandos da empresa “parceira” que, por sua vez, ganhará quantias exorbitantes de dinheiro para aumentar os índices educacionais do estado paranaense, como o índice de presença. No entanto, esses mesmos gestores farão de tudo para expulsar do ambiente escolar aqueles que possam representar uma “queda” nesses dados, visto que a evasão escolar não é um problema apenas subjetivo da juventude, mas é, sobretudo, um problema material, de uma juventude que não tem como nem por onde sobreviver sem se entregar ao mercado de trabalho desde cedo, abdicando de sua formação escolar, ou, quando muito, dada a completa falta de perspectiva de vida engendrada pelo nosso sistema, buscando saída no tráfico, por exemplo.
Além da parte burocrática, professores contratados como PSS (temporários) também serão terceirizados, assim como terão seus contratos rescindidos para logo serem substituídos por professores pertencentes à empresa que assumir os colégios. Na prática, isso significará uma demissão em massa generalizada de todos os professores democráticos, que tentarem qualquer tipo de prática pedagógica emancipadora, ou representarem qualquer incômodo aos interesses do governo e do capital privado monopolista da educação. Como decorrência disso, haverá um aumento qualitativo no grau de exploração dos professores e na supressão dos seus direitos fundamentais de organização, mas primordialmente, um controle ideológico rigoroso sobre o conteúdo ensinado nas salas de aula, o qual eliminará completamente a autonomia dos professores no ensino e sua respectiva liberdade de cátedra.
A empresa “parceira”, de acordo com a proposta, será implementada na instituição mediante consulta pública junto à comunidade escolar, dentro de um processo de fachada “democrática”, em um modelo semelhante ao das consultas das escolas cívico-militares. Na prática, deve seguir o mesmo modus operandi que se operou com estes últimos, boicotar as reuniões de votação que encontrarem impasse até conseguir aprovar a implementação.
Somado a isto, o governo do Paraná fará de tudo para impedir a organização estudantil no âmbito escolar, por meio de Grêmios Estudantis por exemplo, os quais já têm escassa autonomia e espaço dentro das instituições de ensino. Além disso, a vigilância sobre os alunos será intensificada, monitorando todas as suas atividades dentro da escola. Quaisquer discussões que possam representar um risco para a empresa ou para o Governo serão reprimidas. Este é o cenário que nos espera se permitirmos que esse governo privatista avance com o projeto “Parceiro da Escola”. Na prática, o que se busca é, principalmente, pisotear completa e violentamente os direitos democráticos e políticos dos estudantes e professores secundaristas.
NEM: a lei maior do “Parceiro da Escola”
Vale destacar aqui que, em primeiro lugar, o presente Projeto não é decorrente de um fascismo corporativista privado personalíssimo do governo de turno do estado do Paraná. Na realidade, é o desenvolvimento natural de uma legislação anterior, da pedra angular da crise educacional dos colégios públicos brasileiros, o “Novo” Ensino Médio (NEM), sua lei maior.
Como é de conhecimento amplo de todos os ativistas envolvidos na luta pela educação no país, a implantação do NEM foi longe de ser pacífica, e enfrentou o protesto e a rebelião de milhões de massas no país, ilustrada principalmente pelas gloriosas greves de ocupação secundaristas de 2016 e 2019, onde milhares de estudantes de diversos estados, como no Paraná e em São Paulo, tomaram suas escolas nas mãos e lutaram contra toda a truculência do velho Estado brasileiro e de suas forças policiais, na justa reivindicação de seu direito à uma educação pública, gratuita, de qualidade e emancipadora.
Diante deste cenário, o tal Projeto de Lei se adequa perfeitamente aos interesses do capital privado, uma vez que a gestão privada dos colégios tornará a implantação do NEM num simples ato administrativo, pois as políticas e práticas pedagógicas contidas nesta nefasta lei são inerentes ao próprio caráter da educação privada do país.
Experiência fracassada: o histórico educacional privatista dos governos do Paraná
É importante que se ressalte que essa política absurda de privatização dos colégios públicos não surge do nada, muito pelo contrário, é um desenvolvimento do processo contínuo pelo qual passa o estado do Paraná, assim como demais estados do país, como é o caso de São Paulo e Minas Gerais, onde os atuais governadores já estão encaminhando medidas no mesmo sentido.
Em meados de 2023, o mesmo governo do Sr. Ratinho Jr. encabeçou um projeto praticamente idêntico ao atual, visando a privatização da gestão de 27 colégios da rede pública estadual, dos quais 2, o Colégio Estadual Aníbal Khury, em Curitiba, e o Colégio Estadual Anita Canet, em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), sofreram de fato a implementação, que perdura até os dias de hoje.
Ainda em 2023, o próprio Ministério Público do estado do Paraná, numa peça de mais de 50 páginas, denunciou à Justiça a ilegalidade do projeto, especialmente pelo governo ter sido incapaz de demonstrar a necessidade da privatização dos colégios públicos. Meses após a implementação da privatização destes 2 colégios, não faltaram denúncias sobre deficiências na estrutura e funcionamento, principalmente no que tange à falta de professores e aumento considerável de violência dentro e fora das escolas.
Monopolização privada da educação: Unicesumar, grupo Vitru e imperialismo ianque
Fato é que o Brasil, e o estado do Paraná de forma especial, se tornou um refém de conglomerados monstruosos de educação privada, gestados principalmente durante os governos de Luiz Inácio e Dilma Rousseff, com suas políticas de precarização do ensino público e financiamento desmedido de empresas privadas no ramo. No Paraná, a Unicesumar, maior empresa privada de educação no estado, que possui filiais a nível nacional e internacional, que já em 2023 foi reconhecida como uma das 2 maiores empresas de educação privada do país, junto à Uniasselvi – com a qual se fundiu –, e mais recentemente foi comprada pelo grupo Vitru – diretamente financiado e controlado por capital ianque –, tem funcionado como verdadeiro parasita na educação do estado, interferindo diretamente na rede pública de ensino, mediante privilégios concedidos pelo governo em suas medidas sucateadoras e privatistas.
À título de exemplo, no ano de 2022 houve uma série de manifestações em colégios públicos no estado, contra uma política implementada pela Secretaria Estadual de Educação (Seed), que, seguindo a cartilha do Novo Ensino Médio, passou a fomentar o formato de aulas EaD nos colégios estaduais, minando as aulas presenciais, que eram substituídas por aulas televisionadas, às quais os alunos assistiam passivamente. Os professores que ministravam as aulas, eram da mesma Unicesumar, que ganhara à época a licitação do governo do estado, e passou a lucrar massivamente com o sucateamento do ensino público estadual, travestido de modernização. A revolta em alguns colégios foi tão ampla que uniu inclusive os pais de alunos, o que fez o governo recuar na medida.
Não há dúvida alguma de que, uma vez implementado com vigor o projeto “Parceiro da Escola”, uma vez sucedida a privatização dos colégios públicos do estado, serão estes mesmos conglomerados, todos financiados cada vez mais pelo capital estrangeiro e imperialista, principalmente ianque, que lucram bilhões em cima do sucateamento do ensino público estadual, e nacional. O imperialismo, e seus tentáculos nacionais empanturrados de verba pública pelos governos vende-pátria da falsa esquerda eleitoreira lulo-dilmista, e posteriormente, de modo mais descarado, pela extrema-direita, é o verdadeiro parasita sanguessuga, que se não cansa de sugar o sangue dos filhos e filhas do povo.
Educação paranaense: uma história de descaso e repressão violenta
30 de agosto de 1988, o então governador do estado do Paraná, o Sr. Álvaro Dias, cuja família até hoje é uma das que hegemoniza o cenário político-eleitoral no estado, envia a cavalaria da Polícia Militar, armada inclusive com cães de guarda, para reprimir violentamente os professores que protestavam no Centro Cívico de Curitiba, por melhores condições de trabalho e de salário.
Este fatídico episódio, que deixa marcas até hoje, em especial na categoria docente, é apenas a ilustração facínora daquilo que é o pão-com-ovo da política paranaense para com seus professores e estudantes, para com o ensino público como um todo. Na prática, o estado do Paraná, independentemente de seus eventuais governos de turno, em que pese as diferenças quantitativas da violência e da repressão exercidas, é um exemplo caricato de estado policialesco e inimigo de morte da educação pública, gratuita e de qualidade.
Por vezes, cotidianamente, esta repressão se dá de modo mais “brando”, através de ações institucionais que visam impedir até mesmo que as pautas mais particulares, simples, democráticas e emergenciais sejam levantadas à frente no estado, como é o caso do recente episódio de repressão, por parte da Seed, aos estudantes de um colégio estadual de Sarandi, onde os estudantes, de forma pacífica, divulgaram um vídeo denunciando a situação de extremo abandono e insalubridade em que se encontra seu colégio.
Entretanto, sempre que necessário, o mesmo governo estadual, seja lá sob qual mando partidário – apesar da notória hegemonia da direita no estado –, não pensa duas vezes nem mede esforços para usar de toda a sua truculência reacionária contra seus estudantes e professores. Tal foi o caso em 29 de abril de 2015, quando a Tropa de Choque da Polícia Militar de Curitiba, a mando do à época governador Beto Richa, violentou, espancou e agrediu, por meio de cassetetes, balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo, os milhares de estudantes e professores que encontravam-se em protesto em frente à Alep, para barrar uma votação que ali acontecia, cujo conteúdo era o sequestro descarado do fundo de aposentadoria dos professores da rede pública estadual.
Este é o caráter do governo do estado do Paraná. Este é o caráter do atual governo de turno e de seu cabecilha, Ratinho Jr., assim como seus ministros de estado e aliados na Alep. Portanto, neste momento em que se insurge um novo movimento democrático na educação paranaense, em razão do projeto privatista que visa a destruição completa do sistema público de ensino do estado, é de extrema importância ter isto em mente: que as massas democráticas paranaenses não se enganem nem se iludam, não há conciliação possível com estes Senhores.
Não há conciliação
Seguindo a tendência histórica que se assinala em todo o país, com as diversas greves nos IFs e nas universidades federais e estaduais que vêm se dando, especialmente, do último ano para cá, os estudantes paranaenses seguem no mesmo passo e na mesma direção. É assim que têm se insurgido as inúmeras greves estudantis, assim como a de técnicos e docentes, nas universidades e IFs do Paraná. Como é o caso da greve de estudantes, professores e técnicos do IF de Londrina, assim como de muitos outros, e da recente ocupação da reitoria da UFPR.
Em nota, a Executiva Paranaense dos Estudantes de Pedagogia apontou para a necessidade de lutar contra os ataques:
“Pois bem, este é o momento de exercer a vontade estudantil, se o governo privatista de Ratinho Jr. quer acabar com a escola como a conhecemos, devemos preparar as barricadas, chamar nossos colegas, pais, professores, funcionários, realizar debates, manifestações, aulas com todos, assembleias, enfim, tomar em nossas mãos a direção do colégio, impedir a sua privatização e acabar de uma vez por todas com os ataques que esse governo reacionário tem feito!”
Aos estudantes e professores secundaristas paranaenses, cabe a tarefa histórica de protagonizar a luta sem tréguas pela derrubada completa deste projeto, bem como de sua lei maior, o “Novo” Ensino Médio. Aos estudantes e docentes universitários, aos demais profissionais da educação, assim como à todas as massas democráticas, cabe o apoio incondicional. Urge mobilizar a juventude paranaense, bem como de todo o país, em greves de ocupação, de secundaristas até universitários, para barrar a privatização do ensino público e derrubar de uma vez por todas o “Novo” Ensino Médio. Os estudantes paranaenses já demonstraram, nas ocupações estudantis de 2016, sua força e caráter democrático e revolucionário, através das sucessivas greves de ocupação de colégios no estado, e com certeza, uma vez mais, o demonstrarão.