Fotos: Comitê de Apoio ao Jornal A Nova Democracia – São Paulo
Na grande São Paulo, o dia 14 de junho, como dia de lutas e expressão dos interesses de amplas massas na Greve Geral – ao contrário do que tentou vender o monopólio de imprensa e apesar das artimanhas dos grandes empresários e governantes operadas na direção de ‘sindicatos-chave’ -, foi bastante vitorioso e combativo, e também deixou mais escancarado a tendência de incremento na repressão às lutas populares por parte do velho Estado das classes dominantes em plena crise.
Bloqueio de vias e prisões na USP
Recém amanheceu e já era possível notar que a Greve Geral não só paralisou as principais fábricas da cidade, mas também o centro operário do ABC. Em diversas regiões da capital e da Região Metropolitana ocorreram bloqueios de avenidas por manifestantes. No corredor Norte-Sul, na altura das avenida 23 de Maio e Francisco Morato, pneus foram queimados e a pista bloqueada totalmente. O mesmo ocorreu na Radial Leste, na altura de Itaquera.
Nos bloqueios, em casos em que foi capaz de abordar os manifestantes, a atuação da polícia, assim como nas demais concentrações, foi de realizar a repressão indiscriminada. Na Avenida Vital Brasil, próximo à entrada da USP, onde os estudantes bloqueavam as entradas, ocorreram confrontos e 10 pessoas foram presas, sob alegação de que teriam incendiado um veículo. Detidos e agredidos pela polícia, sete estudantes e três funcionários da universidade foram levados pela polícia ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) – procedimento nada usual –, e foram acusados de associação criminosa, dano qualificado, desacato, resistência e incêndio.
Na Região Metropolitana, manifestantes também bloquearam vias. Em Santo André, na Avenida dos Estados, o fluxo de veículos foi completamente interrompido por dezenas de pneus em chamas que foram depositados nos cruzamentos. Os manifestantes já haviam se dispersado ao chegarem as viaturas da polícia. Em Guarulhos, a Avenida Hélio Smith, próxima ao aeroporto ,também foi bloqueada.
Paralisação nos transportes
Apesar da orquestrada atuação do judiciário, das grandes empresas e do executivo paulista, o fundamental dos transportes centrais ficou parado, ainda que, violando as garantias legais do direito à greve, tenha se fixado multas aos sindicatos que poderiam alcançar um milhão de reais no caso de paralisações, autorizando também penalização com advertência e demissões aos funcionários.
O próprio secretário dos transportes teve de admitir o evidente fracasso dessas medidas draconianas ao anunciar que, no metrô, 84% dos passageiros não circularam no dia da Greve Geral. Por outro lado, mesmo com a manobra realizada no sindicato dos motoristas de ônibus para que a adesão anteriormente chancelada pelos trabalhadores não se efetivasse, com uma “greve até às 6 horas da manhã”, somente esse meio de transporte em funcionamento foi incapaz de garantir a circulação de pessoas a níveis normais. Sobre isso, como a reportagem do AND verificou, o sentimento entre muitos motoristas e cobradores era de que haviam sido traídos pela jogada da cúpula sindical: “Que diabo de sindicato é esse que não organizou devidamente a greve?”, argumentou indignado um motorista, que perguntou: “Greve até às 6 horas da manhã?”.
De toda forma, com a adesão de parcela significativa dos trabalhadores em geral, muitas linhas de ônibus normalmente abarrotadas de gente permaneceram vazias, revelando que não se tratava somente de uma greve de transportes, mas de milhões de pessoas que deixaram de ir ao trabalho de forma consciente.
Manifestação na Avenida Paulista e enfrentamentos
Desde o início da tarde, na Avenida Paulista, o principal ponto de concentração das manifestações, dezenas de milhares de pessoas estiveram mobilizadas, no principal ato do dia contra a “reforma” da Previdência e os ataques aos direitos do povo. Palavras de ordem como “Doutor, eu não me engano, Bolsonaro é miliciano” e “Nem Bolsonaro e nem Mourão, o que o povo quer é Revolução!” foram entoados em diversos pontos da manifestação, revelando que não se tratava somente de protestar contra as medidas econômicas do governo, mas contra o sistema de opressão e exploração impostos.
Um importante e massivo bloco combativo composto por jovens independentes e por organizações combativas como a Unidade Vermelha – Liga da Juventude Revolucionária (UV-LJR) e o Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR) também denunciou a utilização da mobilização popular pelos partidos e organizações políticas que enxergam a mobilização do povo com suas lentes eleitorais. Era possível ler uma faixa com as seguintes consignas: “Greve Geral não é palanque Eleitoral!”. Outra faixa, por sua vez, denunciava todo o sistema de opressão e exploração e dizia “Nem Bolsonaro, nem Mourão, nem Congresso de Corruptos e fora Forças Armadas reacionárias!”.
Na Avenida Paulista também era visível a ostensividade do policiamento. Em certos pontos, policiais portavam até submetralhadoras, com clara intenção de intimidar os manifestantes, o que, no entanto, não surtiu o efeito pretendido.
Em dado ponto da manifestação, um ousado grupo de manifestantes de rostos cobertos arrastou pelo chão da avenida um boneco de estatura humana com duas cabeças (uma de Bolsonaro e outra de Mourão). O boneco, enrolado em bandeiras dos Estados Unidos e Israel, foi malhado pelos manifestantes com socos e ponta-pés em todos os cantos em que desfilava. O ato simbólico foi aplaudido por centenas de pessoas. Ao final, o boneco foi queimado e converteu-se em uma fogueira, junto às bandeiras das nações imperialistas. A ação foi ovacionada pelo povo aos gritos de “Fora ianques da América Latina!”, e “Fora de Gaza, Israel Fascista!”.
Foto: Professores Antifascismo
O ato, que saiu do MASP, dirigiu-se até a Avenida da Consolação, onde um grupo de policiais deteve alguns manifestantes arbitrariamente, sem motivos aparentes. Tal atitude, entendida como provocação pelo povo, foi prontamente respondida pelas massas com os gritos de “Não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da Polícia Militar!”. Então, desmoralizados, os policiais dispararam bombas de gás, spray de pimenta e balas de borracha contra as massas.
Em pouco tempo, espontaneamente, como legitima defesa, centenas de pessoas se lançaram a responder a repressão policial. Em um verdadeiro enfrentamento campal, as balas de borracha foram respondidas com garrafas e pedras; as bombas de gás e spray de pimenta com rojões; e os agrupamentos da tropa de choque foram impedidos de avançar em função de barricadas improvisadas com canteiros de plantas ou com objetos em chamas. O confronto durou cerca de 30 minutos, e, durante todo de resistência dos manifestantes os policiais atuaram escancarando seu caráter antipovo e repressor das massas populares.
Até mesmo um Defensor Público que atuava no exercício de sua função ao acompanhar uma abordagem policial foi atacado pela polícia e preso. O defensor Rafael Português, conforme informou ao UOL, ao ver uma abordagem violenta da polícia, disse que a acompanharia imediatamente. O policial que a realizava, no entanto, ordenou que o Defensor saísse do local e, em seguida, o “engravatou” por cerca de 20 minutos, sob o argumento de “desacato e resistência”. O Defensor Público, depois de agredido, foi arrastado e levado para a 78º DP e só deixou a delegacia na madrugada do dia seguinte.
Além dele, na esquina com a Avenida Consolação, três jovens foram presos, dentre eles dois estudantes, acusados por supostamente tentarem incendiar um ônibus, também sendo levados ao DEIC, onde já estavam os presos no bloqueio da Avenida Vital Brasil.
A repressão da luta popular e a criminalização da juventude
Na manhã do sábado (15/06), em frente ao Fórum Criminal da Barra Funda, quase 100 pessoas aguardavam a realização da audiência de custódia dos presos no dia anterior. Até a última informação recebida pelo jornal AND, os 10 manifestantes presos em frente a USP haviam sido liberados em audiência de custódia, sob condição de ter de comparecer trimestralmente em juízo.