Indígenas Guarani-Kaiowá resistem ao deslocamento forçado e prisão a céu aberto em Dourados

Reportagem de AND revela como latifundiários atacaram indígenas e cavaram fosso de dezenas de metros ao redor de área para impedir saída de indígenas
Pequenos guerreiros Guarani Kaiowá observam a tenda montada pelos latifundiários na área que foram expulsos. Foto: AND

Indígenas Guarani-Kaiowá resistem ao deslocamento forçado e prisão a céu aberto em Dourados

Reportagem de AND revela como latifundiários atacaram indígenas e cavaram fosso de dezenas de metros ao redor de área para impedir saída de indígenas

O clima de guerra imposto pelos latifundiários contra os indígenas Guarani-Kaiowá ganhou novo capítulo na cidade de Dourados, em Mato Grosso do Sul (MS). A retomada Pakurity, localizada às margens da BR-463, na saída para a cidade fronteiriça de Ponta Porã, foi atacada por latifundiários e pistoleiros. A retomada existe há 15 anos e encontra-se em disputa judicial em segunda instância da Justiça Federal.

Uma equipe de reportagem de AND foi até a retomada Pakurity para averiguar a situação. Ao chegar, o repórter foi seguido por um trator que acompanhava os movimentos da retomada, em uma tentativa de intimidação. Segundo as informações dos indígenas, o trator também serve de transporte para os latifundiários que criaram uma base de campana na região. 

Trator usado por latifudiários para transportar pistoleiros e monitorar Guarani-Kaiowá. Foto: AND
Trator usado por latifudiários para transportar pistoleiros e monitorar indígenas. Foto: AND

Os indígenas contam que os primeiros ataques visaram empurrar os Guarani-Kaiowá para uma área menor do que aquela em que eles se encontravam. O assalto começou com a chegada de dezenas de camionetes pilotadas por latifundiários e pistoleiros. “Era uma verdadeira multidão de pistoleiros, vários homens armados”, relatou uma fonte ao correspondente local de AND em Dourados. 

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Os indígenas foram forçados a recuar do território e se refugiar na mata, mas um indígena foi baleado na perna pelos pistoleiros e uma criança quebrou o braço enquanto corria para não ser baleada. 

Deslocamento forçado e prisão a céu aberto

Depois do deslocamento forçado, os latifundiários cavaram um poço de aproximadamente três metros de profundidade por uma extensão de dezenas de metros para garantir que os Guarani-Kaiowá não iriam retornar ao território original. Em outras palavras, uma tática de guerra escancarada, com o objetivo de isolar os indígenas arbitrariamente na forma de um cerco para controlar as suas movimentações.

Poço cavado por latifundiários para impedir o retorno dos indígenas a parte de sua área. Foto: AND

A trincheira feita pelos latifundiários impede que os indígenas retornem às suas antigas casas, impedindo o acesso a roupas e comida. O fosso também interrompeu o fluxo de um rio que servia de fonte de água para os indígenas. Para contornar a situação, os moradores da retomada cavaram um poço, mas a água que sai dali – o único meio possível de hidratação na área – é amarronzada e imprópria para consumo.

Além disso, durante o crime contra os povos originários, os latifundiários romperam fios de fibra ótica e fizeram com que quase meio milhão de pessoas ficassem sem internet, segundo a imprensa local. 

‘A PM se aliou aos latifundiários’

Revoltados contra o cerco, cerca de 20 guerreiros Guarani-Kaiowá se organizaram para atravessar o buraco de isolamento. Contudo, a saída da prisão forçada foi impedida pela Polícia Militar (PM), que foi até a região acionada pelos latifundiários e disparou balas de chumbo, borracha e spray de pimenta contra os indígenas. Durante o ataque, uma Guarani-Kaiowá entrou em trabalho de parto forçado por conta do estresse, tendo um filho prematuro. “É difícil, porque a Polícia Militar se aliou aos latifundiários”, comentou uma Guarani-Kaiowá. 

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Do outro lado do fosso, uma tenda branca indica o local onde latifundiários e pistoleiros se revezam na observação de quem se aproxima. Os indígenas, por sua vez, aproveitam para ocupar seus próprios pontos de observação e tentar identificar os seus inimigos. De acordo com eles, o vereador bolsonarista Sargento Prates – o mesmo que era presença constante na região do conflito em Douradina e que utilizou o ataque contra Guaranis Kaiowás como forma de propaganda eleitoral – é um dos visitantes mais assíduos da base pistoleira. Além dele, o filho do ex-vereador Atílio Torraca Filho, chamado de “Atilinho”, também visitou os pistoleiros. Um terceiro identificado é Allan Kruger, conhecido por estar envolvido em outros ataques contra indígenas Guarani-Kaiowá, como no tekoha Avae’te e na aldeia Bororó em Dourados, e Nivaldo Kruger, arrendatário da fazenda.

Tendas usadas por latifundiários e pistoleiros. Foto: AND

‘Podem me matar, mas não saíremos daqui’

A campana também serve para que os latifundiários possam acionar a PM em caso de qualquer sinal de revolta e como base para as constantes intimidações e ameaças contra os indígenas. Segundo os Guarani-Kaiowá, as ameaças se intensificam durante a noite, quando os latifundiários e pistoleiros enchem a cara. Em uma madrugada, os latifundiários seguiram uma indígena e ameaçaram os moradores da retomada de morte. “Essa vala foi aberta para vocês. Vocês vão todos morrer. Não querem terra? Vocês vão ter a terra debaixo da terra”, disse o candidato a assassino. 

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Apesar da situação de guerra, os indígenas se recusam a abandonar a área. “Podem me matar, mas não vamos sair daqui”, comentou uma indígena Guarani-Kaiowá à reportagem. 

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