Reproduzimos um artigo de Ramona Wadi para o portal Middle East Monitor.
Os debates eleitorais presidenciais do EUA expõem o fato de que não há escolha real, além de optar pelo menor dos dois males, quando se trata da política de Washington sobre a Palestina. Quando o presidente do EUA, Joe Biden, assumiu o cargo em janeiro de 2020, a narrativa dominante de se livrar de Donald Trump prevaleceu. Quem poderia ter previsto o genocídio na época? O genocídio de Israel em Gaza é uma das principais razões pelas quais a história deve sempre ser considerada.
Em um debate contra o candidato republicano e ex-presidente Donald Trump, a vice-presidente e candidata democrata Kamala Harris apenas recitou mais da mesma retórica que fez Biden parecer uma opção melhor para Trump. “Israel tem o direito de se defender, mas importa como”, disse Harris. “Vamos entender como chegamos aqui”, ela acrescentou, referindo-se a 7 de outubro como o ponto de partida, enquanto também afirmava que muitos “palestinos inocentes foram mortos”. Com relação a um cessar-fogo, no entanto, isso estava vinculado à libertação de reféns israelenses, não para impedir que Israel matasse mais palestinos.
O 7 de Outubro é realmente “como chegamos aqui”?
O genocídio não está acontecendo por causa do 7 de Outubro, mas porque Israel decidiu que queria limpar Gaza etnicamente, e a incursão transfronteiriça forneceu um momento oportuno para seu início de fato. Está acontecendo porque, após décadas de colonização, os palestinos ainda estão fazendo o possível para permanecer em suas terras. Gaza é o epítome da luta anticolonial palestina. É uma população de refugiados, uma população que suportou e resistiu — e ainda está resistindo — à aniquilação por Israel. A disseminação do entendimento limitado de Kamala é meramente paternalista e garante ainda que as pessoas não entendam nada.
Com base em quê Kamala será agora uma opção melhor como presidente do que Trump? Se ambos se recusam a acabar com o genocídio de Israel em Gaza pois ambos apoiam a noção distorcida de Israel sobre o que significa “autodefesa” (Israel não tem o “direito” inerente de se defender contra as pessoas que vivem sob sua ocupação militar), o que diferenciará Harris de Trump? E se alguma diferenciação puder ser feita, basta lembrar que um palestino morto por Israel com total cumplicidade dos EUA ainda será morto, independentemente de quem entrar na Casa Branca em janeiro.
Então, 7 de outubro não é a data em que Harris deveria estar pensando. Toda a história da colonização sionista na Palestina aponta para Israel cometendo genocídio em Gaza. O envolvimento e a cumplicidade dos EUA são longos.
Os presidentes do EUA fizeram concessões a Israel desde o reconhecimento inicial do estado de ocupação em maio de 1948
No entanto, agora que o governo Biden utilizou as concessões unilaterais de Trump a Israel e chegou ao genocídio, o que resta discernir além de expor o padrão emergente de crescente violência colonial e cumplicidade do EUA? Harris será vista como uma opção melhor porque seu principal oponente é Trump, e somente isso? Como a Autoridade Palestina, que se apressou em apoiar Biden após ser rejeitada por Trump, reagirá se Harris vencer a eleição em novembro? A AP apoiará um facilitador do genocídio? É isso que ela é, tanto quanto Trump será.
Harris está promovendo uma versão míope e confusa da história. Qualquer um que apoie qualquer candidato que encontre desculpas para um genocídio está se dissociando voluntariamente da história, o que é algo que os palestinos nunca fizeram. Serve aos interesses de um candidato presidencial, assim como de Israel, refutar conexões históricas e permanecer amarrado ao 7 de Outubro tanto quanto serve ao genocídio em Gaza. Harris não é uma alternativa melhor, ela é apenas uma extensão do governo Biden e parte da política externa dos EUA sobre a Palestina, da mesma forma que Trump era e é. Eles são dois lados da mesma moeda colonial imperialista.
Ramona Wadi é uma investigadora independente, jornalista freelance, crítica de livros e escreve para um blog. Os seus textos abrangem uma série de temas relacionados com a Palestina, o Chile e a América Latina.
Esse texto expressa a opinião do autor.
Texto traduzido por Alexandra K.