Os números da violência contra o povo do Rio de Janeiro cresceram vertiginosamente com a intervenção militar federal, atingindo índices que não eram vistos há mais de 15 anos. Segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública), no mês de outubro foram 127 ocorrências de mortes decorrentes de intervenção policial, um aumento de 30% em relação ao mesmo mês de 2017, e de 17,5% na comparação com setembro passado. Nestes noves meses, foram 1.151 mortes em todo o estado.
Segundo o Observatório da Intervenção — grupo que monitorou 584 operações policiais no Rio nos nove meses de intervenção — somente nesse período, 177 escolas e creches públicas na região metropolitana do Rio tiveram pelo menos um disparo de arma de fogo ou troca de tiros num raio de 100 metros de distância da unidade, colocando em risco a integridade de alunos e profissionais.
Os únicos índices que apresentaram redução percentual no quadro geral foram os de roubos de cargas, com queda de 28%. O que mostra o caráter de classe dessa intervenção, levada a cabo para levar segurança às operações de grandes empresas e transportadoras, em detrimento da morte de centenas de pessoas nos bairros pobres e favelas do Rio, incluindo crianças e idosos. No mês de novembro, mais ações criminosas das forças armadas em conluio com as polícias levaram o terror para a massa de milhões de trabalhadores pobres que vivem nas favelas da capital.
O mês de novembro começou com um fim de semana sangrento em Manguinhos e no Complexo da Penha, com ao menos dois registros de mortes de moradores nos dias 3 e 4 de novembro. No dia 5, moradores dessas localidades ficaram impedidos de deixar suas casas pela manhã por conta do rescaldo das operações do final de semana. um dia antes, PMs da UPP de Manguinhos balearam um jovem de 17 anos e fugiram do local sob protestos de moradores. Ele foi socorrido por vizinhos, mas não resistiu aos ferimentos. Na internet, a página Fala Manguinhos publicou várias denúncias dando conta de tiros e explosões de granadas na localidade Vila Turismo após a chegada do BOPE.
No mesmo dia, no Complexo da Penha, policiais do BOPE mataram um jovem de 15 anos, causando revolta e transformando em um caos o que seria um domingo de descanso. No dia seguinte (5), o sol ainda raiava quando PMs voltaram ao Complexo da Penha, dando início a um intenso tiroteio e deixando milhares de trabalhadores ilhados em suas residências. Casas foram invadidas e muitos moradores relataram pelas redes sociais que tiveram pertences furtados por policiais nas favelas Vila Cruzeiro, Morro da Fé e Morro do Sereno.
No Complexo do Alemão, uma ação criminosa de policiais militares repercutiu no monopólio dos meios de comunicação e nas redes sociais. Um jovem de 11 anos foi baleado na perna por PMs da UPP e teve que se atirar em um rio para não ser assassinado. Segundo relato de integrantes do Coletivo Papo Reto, PMs ainda jogaram granadas em direção ao menino, que conseguiu sobreviver. O amigo do jovem, que teria apenas 13 anos, foi torturado por policiais para que dissesse onde o garoto havia se escondido. De acordo com moradores que testemunharam o acontecido, PMs teriam disparado quando viram dois jovens negros em uma moto e, ao perceberem que não eram traficantes, correram para matar o garoto baleado com medo de serem denunciados.
No dia 6, o Rio acordou com as notícias de mais uma carnificina promovida pelo Estado e suas polícias no Complexo da Maré, zona norte do Rio de Janeiro. Policiais do BOPE e do Batalhão de Choque, contrariando uma decisão da justiça de 2016, começaram uma operação em algumas favelas da Maré durante a madrugada. A maioria dos moradores ainda dormia quando um caveirão (veículo blindado da PM) chegou às favelas Parque União e Nova Holanda, dando início a um violento confronto. Pelas redes sociais moradores relataram os momentos de terror vividos até o início da manhã, com ao menos cinco pessoas mortas, oito feridas, várias casas invadidas e reviradas, veículos arrombados e saqueados, além de toda ordem de violações contra a população, incluindo agressões e torturas. As informações são da página Maré Vive. Parceira do Jornal A Nova Democracia, a página informa com detalhes as atrocidades cometidas pelo Estado no Complexo da Maré, através de relatos, fotos e vídeos enviados por moradores.
Uma das vítimas fatais da ação foi o professor de física William Filgueira de Oliveira, 35 anos. Ele foi baleado na Nova Holanda por volta das 5h. Um homem identificado apenas como Tiago foi baleado na cabeça, socorrido por moradores e levado para o Hospital Federal de Bonsucesso, mas morreu no caminho. Uma mulher de cerca de 40 anos, ainda sem identificação, foi socorrida por moradores em um carrinho de mão depois de ser baleada no abdômen. Ela também foi levada para o HGB por um Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, mas não resistiu e morreu. Ainda de manhã, mais um corpo foi retirado da favela Nova Holanda por moradores, aparentemente um homem, com idade entre 20 e 30 anos, baleado no peito. Moradores fizeram protestos desde o início da manhã, bloqueando a Avenida Brasil e incendiando ao menos um ônibus. No início da tarde, moradores revoltados ainda bloqueavam a pista lateral da via observados por policiais encapuzados e armados de fuzis.
“Recebemos vários relatos de casas invadidas e reviradas, moradores agredidos, policiais disparando contra pessoas indefesas, com criança no colo, veículos estacionados destruídos pelos blindados, além das quatro mortes confirmadas até agora. Por muito tempo não vimos uma operação dessa a noite aqui, obviamente essa maldita ‘guerra às drogas’ nunca será benéfica para a favela, pois não passa de uma justificativa para oprimir ainda mais as favelas e periferias” – disseram os administradores da página Maré Vive.
No dia 19, policiais do Comando de Operações Especiais (COE) da PM realizam uma operação nos morros do Fallet, Fogueteiro e dos Prazeres, no bairro de Santa Tereza, região central do Rio de Janeiro. Desde as 6h da manhã, moradores relatavam pelas redes sociais um intenso tiroteio que teria deixado ao menos três pessoas feridas por estilhaços de balas, além de casas invadidas, furtos e roubos de objetos de moradores e agressões. No mesmo dia, policiais do BOPE foram ao Morro do Juramento para destruir uma piscina que, segundo a secretaria de segurança, foi construída pelo tráfico. No entanto, nenhuma prova foi apresentada pelos policiais. Desde 2015, a piscina era a maior área de lazer da região onde milhares de crianças se divertiam nos escaldantes dias de sol na zona norte do Rio.
Comando de Operações Especiais (COE) da PM realizam uma operação nos morros do Fallet, Fogueteiro e dos Prazeres, no bairro de Santa Tereza