Iraque: Rebelião popular completa quase dois meses

Iraque: Rebelião popular completa quase dois meses

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Um manifestante carrega a bandeira iraquiana enquanto faz o “sinal da vitória” com as mãos. 4 de novembro de 2019. Thaier Al-Sudani / Reuters

Desde 1º de outubro, o heróico povo iraquiano tem se rebelado contra o sistema e exploração, o governo fantoche do imperialismo ianque, as eleições farsantes e a pilhagem de seus recursos naturais. Eles exigem demandas básicas como saúde, educação e empregos de qualidade para o povo, e denunciam o fato de ser um dos países mais rico em petróleo no mundo, mas ser uma nação miserável economicamente e ter, por exemplo, constante falta de energia.

Contra o grande levantamento de massas, o velho Estado iraquiano, dominado completamente pelo imperialismo ianque após a invasão em 2003, tem despendido uma brutal repressão que tem sido heroicamente combatida pelo povo iraquiano, mas que já tirou a vida de 300 pessoas.

Bloqueio no principal porto do Golfo

Manifestantes iraquianos, no dia 18 de novembro, bloquearam estradas que levam aos campos de petróleo e ao principal porto do sul do país, de acordo com as “autoridades”. Enquanto isso, em Bagdá, manifestantes forçaram o fechamento do Banco Central do Iraque.

Os manifestantes bloquearam a entrada para o porto de commodities Umm Qasr, próximo a Basra, impedindo que funcionários e petroleiros entrassem e impedindo também o funcionamento do porto em 50%.

“Se o bloqueio continuar, as operações serão completamente interrompidas”, disseram as fontes ao monopólio da imprensa Reuters. O porto foi anteriormente bloqueado de 29 de outubro a 9 de novembro com uma breve retomada das operações entre 7 e 9 de novembro. O bloqueio custou ao governo lacaio mais de 6 bilhões de dólares apenas na primeira semana de fechamento, disse um porta-voz do governo na ocasião. Umm Qasr, o principal porto do Golfo do Iraque, recebe importações de grãos, óleos vegetais e açúcar que alimentam o país colonial.

Grande greve é deflagrada novamente

Milhares de iraquianos inundaram as ruas da capital e as cidades do sul no dia 17 de novembro em uma greve geral que reforçou o movimento de semanas a fio contra o sistema de exploração e o velho Estado iraquiano.

Nos focos de manifestação ao sul de Kut, Najaf, Diwaniyah e Nasiriyah, escolas e escritórios do governo foram fechados enquanto multidões marchavam às ruas. Manifestantes cortaram estradas na cidade portuária de Basra, rica em petróleo, queimando pneus, e em Hillah, ao sul de Bagdá, estudantes e outros ativistas se reuniram em frente à sede do governo.

“Vamos manter nosso protesto e greve geral com todos os iraquianos até forçarmos o governo a renunciar”, disse Hassaan al-Tufan, advogado e ativista.

Em Bagdá, centenas de estudantes faltaram às aulas para se reunirem na praça Tahrir (“Libertação”) de Bagdá, o lugar símbolo dos protestos. Eles agitavam a bandeira iraquiana, marchando para o norte de Tahrir até a vizinha praça Khallani.

Em dado momento da manifestação os trabalhadores e jovens montaram tendas em um primeiro segmento da ponte Al-Sinek, de frente para a polícia de choque estacionada atrás de duas camadas de paredes de concreto grosso. Um pouco além dessas barreiras estava a embaixada do vizinho Irã, que os manifestantes criticaram por apoiar o governo que querem derrubar.

“Nós, estudantes, estamos aqui para ajudar os outros manifestantes, e não vamos recuar um único passo”, disse um adolescente ao jornal Al Jazeera.

O governo propôs uma lista de reformas nas últimas semanas, mas as massas as rejeitaram. “Essas reformas são apenas um opiáceo para as massas. Nada mais, nada menos”, disse outro manifestante no dia 17.

Estado fantoche promove perseguição e banho de sangue

O número de mortos durante as manifestações no Iraque subiu para mais de 300, no dia 17 de novembro, quando mais seis pessoas foram mortas pelas forças de repressão e mais dezenas ficaram feridas durante confrontos nos protestos da greve geral.

O chefe da Comissão de Direitos Humanos do Parlamento iraquiano disse à Al Jazeera que 319 pessoas morreram desde 1º de outubro, com mais de 15 mil feridos. A maioria das vítimas foram manifestantes populares, mas oficiais da repressão também foram feridos ou mortos pelos manifestantes. 

As forças da repressão iraquianas em Bagdá têm de se utilizar  gás lacrimogêneo, balas de borracha e munição letal contra os manifestantes, e ergueram barreiras de concreto para bloquear a mobilização popular.

Médicos iraquianos que trataram os feridos durante os protestos dizem que estão sendo atacados por membros da repressão enquanto tratam os manifestantes: “Eles estão nos alvejando para evitar o tratamento dos feridos”, disse Mustafa Fawzi à Al Jazeera. “Há dois dias, em uma ponte, eles estavam nos perseguindo. Estávamos nos escondendo nas ruas laterais e eles estavam atirando em nós do Humvees. Quem eles são e de quem recebem ordens, não sabemos”.

Uma fonte médica disse que cerca de 30 pessoas foram feridas na área de al-Khulani no dia 17, enquanto o médico voluntário Azhar Qassem disse que os médicos ficariam na praça Tahrir para tratar qualquer ferido. “Não vamos desistir”, insistiu ele.

O que está por trás dos protestos

Os enormes protestos que se arrastam por meses têm como base a grave situação econômica do país, a ocupação colonial do país por tropas do imperialismo ianque (ocupação “legitimada” por farsas eleitorais através das quais conformam-se “governos” de capitulacionistas) e a briga entre setores das classes dominantes iraquianas.

As massas populares marcham e combater as forças de repressão por seus direitos, e é isto que as move, principalmente. No entanto, ao mesmo tempo, tal luta popular ocorre em meio à divisão entre os latifundiários semifeudais e grandes burgueses iraquianos. Governa o país desde 2018 Adil Abdul-Mahdi, um político xiita diretamente ligado ao Irã. Embora manifeste-se contra o ingresso de novas tropas ianques no país, ele e outros capitulacionistas são coniventes com a ocupação existente. Em oposição a ele está o clérico xiita Moqtada al-Sadr, que dirigiu uma milícia que combateu a invasão ianque de 2003, porém foi desmobilizada reiteradamente em 2005 por ele mesmo num ato capitulacionista, sendo praticamente dissolvida em 2008 após combates incessantes com o “Exército iraquiano” (diretamente controlado pelos imperialistas do USA).

Moqtada al-Sadr tem instado as massas às ruas. Embora al-Sadr utilizou-se sempre da ajuda iraniana no combate ao imperialismo ianque taticamente, ele é contra o crescimento demasiado de presença iraniana no aparelho de Estado e das “forças de segurança”, sendo este o motivo que o levou a inflar os manifestantes contra o atual “governo”, diretamente vinculado ao Irã e conivente com a ocupação militar ianque. A presença de milícias xiitas iranianas no Iraque cresceu exponencialmente com o pretexto de combater o Estado Islâmico, que cumpriu o papel de resistir à ocupação colonial do USA.

A retórica anti-Irã dos manifestantes é resultante desse apelo de al-Sadr, que é reconhecidamente tido como um líder político, religioso e militar radicalmente anti-USA, porém que capitulou da tarefa de combater a invasão militar com a guerra de Resistência Nacional. Seu objetivo é derrubar o “governo” e minar o crescimento de influência iraniana no Estado fantoche.

O imperialismo ianque, que domina de modo completo a nação através das armas enquanto encena um “jogo democrático” via eleições, pronunciou-se favorável à renúncia de Abdul-Mahdi e a convocação imediata de novas eleições, tal como propugnou al-Sadr. O objetivo dos ianques é estabilizar o país e neutralizar as marchas de rua que podem tomar a forma de um grande movimento anti-imperialista e anticolonial, utilizando-se para tanto, habilmente, dos capitulacionistas.

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