Decretos de Netanyahu ajudam-no a continuar no poder e a postergar seu julgamento. Foto: Ammar Awad/Reuters.
Na semana em que o novo primeiro-ministro de Israel deveria assumir e formar novo governo, o ultrarreacionário Benjamin Netanyahu decretou, usando como pretexto a pandemia do coronavírus, diversas medidas persecutórias e antipovo que o mantêm no poder do sistema de governo. Entre as determinações estabelecidas, está o fechamento do Knesset (o Parlamento do país) e de todos os tribunais israelenses, e a instrução ao Shin Ben (agência de Inteligência de Israel) de quebrar a privacidade dos cidadãos e acessar os dados celulares de todos no país.
Este decreto, que libera o uso aberto de tecnologias de espionagem contra a população – o que até agora só haviam sido usadas contra palestinos -, não foi divulgado ou consultado, nem sequer foi visto pelos ministros que votaram a favor do pacote de medidas para conter a crise do coronavírus no raiar do dia 17 de março. Até o fim do dia 18, cerca de 400 israelenses já haviam recebido mensagens de texto com os dizeres: “Olá, você esteve próximo de alguém com corona” e indicando que a pessoa deveria ser submetida a uma quarentena restrita.
Segundo o monopólio de imprensa The Washington Post, Trump teria considerado aplicar um plano semelhante no Estados Unidos (USA), e que funcionários do governo conversaram com empresas de tecnologia como o Facebook e Google sobre o uso irrestrito de dados celulares para fins de rastreamento durante o surto viral.
No mesmo dia, o ministro da Defesa de Israel anunciou o fechamento das fronteiras do país, declarando que os palestinos que trabalham em Israel estão impedidos de voltar para casa por até dois meses, forçando os mais de 100 mil palestinos que vão e voltam para trabalhar no país todos os dias a ficarem presos em Israel, sem acesso a estrutura alguma de abrigo ou ajuda financeira.
Desde o dia 17, os israelenses estão sob um “bloqueio voluntário”, orientados a não sair de casa a não ser para necessidades essenciais, e apenas um número restrito de pessoas foi autorizado a poder ir trabalhar.
Além de ser acusado de explorar a situação atual de crise para adiar sua saída do cargo, Netanyahu também tem sido denunciado por aproveitar-se para adiar por dois meses o seu julgamento pelos crimes de suborno, fraude e quebra de confiança que estava previsto para ter começado no dia 17 de março, mas foi adiado devido à paralisação do Judiciário no país.
Em uma publicação na internet, o famoso escritor israelense Yuval Harari denunciou a situação de seu país: “Netanyahu perdeu as eleições. Então, sob o pretexto de combater o corona, ele fechou o Parlamento israelense, ordenou que as pessoas permaneçam em suas casas e está emitindo qualquer decreto emergencial que deseja” e chamou Israel de “a primeira ditadura do coronavírus”.
Fechamento do Parlamento
No decurso do último ano, Israel passou por três farsas eleitorais que resultaram em impasse, ou seja, em que nenhum candidato para primeiro-ministro conseguiu formar maioria no Parlamento o suficiente para estabelecer um novo governo, de forma que Netanyahu ocupa o posto de primeiro-ministro interino desde dezembro de 2018.
No entanto, a terceira rodada realizada no início de março permitiu que o outro principal candidato, Benny Gantz, conseguiu reunir uma maioria estreita, ao que ele formaria o novo governo no dia 18. Os membros recém-eleitos do Parlamento já haviam inclusive jurado seus votos ao presidente israelense no dia 16, porém foram impedidos de iniciar sua gerência por conta dos decretos baixados por Netanyahu.
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Resposta nas ruas
Apesar das restrições a aglomerações e do medo do surto do vírus, centenas de israelenses organizaram um protesto no dia 19 que fechou a principal rodovia em Jerusalém, denunciando a nova medida de espionagem e o fechamento do Knesset. Levantaram bandeiras pretas e faixas com os dizeres “Não à ditadura!” e chamando Netanyahu de “ministro do crime”.
As forças de repressão tentaram impedir a manifestação fechando as ruas próximas ao Knesset e à Suprema Corte, e prenderam três pessoas por “violar a proibição de encontros com mais de dez pessoas”. Além disso, impediram que uma manifestação em comboio de dezenas de carros entrasse na cidade e que outras dezenas já dentro de Jerusalém se aproximassem do prédio do Parlamento com suas bandeiras negras.
Apesar das medidas terem prazo previsto de duração, o povo teme que aceitar agora medidas que permitem ao Estado formas de vigilância e espionagem contra seus próprios cidadãos venha a abrir um perigoso precedente para que, no futuro, isso volte a se repetir em outras circunstâncias, ou mesmo ainda que o decreto seja prolongado por tempo indeterminado, superando o pretexto de combate ao coronavírus.