MA: Camponeses de Santa Maria protestam contra ameaça de despejo

MA: Camponeses de Santa Maria protestam contra ameaça de despejo

Manifestação contra decisão do judiciário de despejar dezenas de famílias de terras tomadas do latifúndio

As famílias camponesas da comunidade tradicional de Santa Maria estão ameaçadas de despejo em virtude de mandado de reintegração de posse concedido pelo judiciário do velho Estado a um latifúndio monocultor de eucalipto. A comunidade, situada no município de Urbano Santos, há anos resiste aos ataques e ameaças de latifundiários da região.

O mandado de reintegração de posse foi expedido no dia 16 de novembro pela juíza de direito titular da Comarca de Urbano Santos, Cinthía de Sousa Facundo, a pedido do latifundiário Victor Emanuel Alves de Lara, pretenso proprietário da fazenda Lara/Fortaleza, ocupada pelos camponeses desde o dia 27 de outubro deste ano.

No dia 24 de novembro, durante manifestação em Urbano Santos, em frente ao Ministério Público, o promotor da cidade, juntamente com latifundiários plantadores de eucalipto, tentaram intimidar as lideranças comunitárias, mas o povo  não se intimidou e manteve o seu legítimo protesto.

Protesto das famílias da comunidade Santa Maria contra mandado de reintegração de posse em Urbano Santos, 24/11

Nos municípios de São Bernardo e Vargem Grande, o comunicado sobre o cumprimento da reintegração de posse foi queimado durante uma manifestação em apoio aos camponeses da comunidade de Santa Maria. Também ocorreram manifestações de solidariedade em Cantanhede e Itapecuru Mirim.

“Mais uma vez o Judiciário se posiciona contra os trabalhadores e trabalhadoras, enquanto o eucalipto avança destruindo as árvores frutíferas, o povo que faz sua roça é condenado por ‘destruir o meio ambiente’. ‘Ninguém come pedra’, disse um companheiro da comunidade. A Juíza da comarca de Urbano Santos dar uma liminar, ou melhor, iliminar o povo, dando uma decisão de reintegração de posse em favor de Victor Emanoel!”, denunciou um manifestante durante protesto em Cantanhede.

Reproduzimos abaixo nota pública do Fóruns e de Redes de Cidadania do Maranhão, em apoio aos camponeses da comunidade tradicional de Santa Maria e repúdio a decisão do judiciário do velho Estado de emitir o mandado de despejo.

 


O Judiciário e suas mazela

Fóruns e Redes de Defesa dos Direitos da Cidadania do Maranhão

 

Os Fóruns e Redes de Defesa dos Direitos da Cidadania do Maranhão torna pública o seu mais veemente repúdio à decisão da juíza de direito da Comarca de Urbano Santos, Cinthia de Sousa Facundo, ao expedir liminar em ação de reintegração de posse, contra dezenas de famílias da comunidade tradicional de Santa Maria, trabalhadores e trabalhadoras rurais do município de Urbano Santos.

Manifesta-se, assim, da seguinte forma:

 

1 – Por primeiro afirmamos: o que se diz hoje sobre o judiciário e seus membros, suas manifestas seletividade e parcialidade, indígenas, quilombolas, agricultores familiares, trabalhadores rurais, comunidades tradicionais, pescadores e ribeirinhos experimentam todos os dias na pele, há séculos, fatos já constatados em diversas audiências públicas por órgãos oficiais e extraoficiais, já objetos de procedimentos e inúmeras notas públicas, provando a ilegalidade, a arbitrariedade, a discriminação e a truculência com que agem;

2 – Conforme foi observado durante as caravanas do Tribunal Popular do Judiciário, atividade realizada no ano de 2009, o poder judiciário, no que diz respeito à questão agrária, é o órgão mais perseguidor dos trabalhadores rurais e violador dos seus direitos, braço defensor desse modelo agrário baseado no latifúndio, na grilagem de terras públicas, na monocultura e na violência no campo, colocando-se sempre como inimigo de classe dos trabalhadores e trabalhadoras rurais;

3 – Quando o procedimento é para garantia e proteção da “divina propriedade”, a celeridade dar o ritmo, não existindo qualquer preocupação legal ou de cunho social: a garantia do direito ao trabalho, o cumprimento da função social por parte da propriedade, a presença do juiz no local do litígio como forma de melhor prestar a jurisdição ou, na aplicação da lei, a observância dos “fins sociais” a que a lei se dirige e “às exigência do bem comum”. Tudo isso é letra morta para os membros do judiciário, quando o assunto é a propriedade do latifúndio, monocultor, explorador, devastador e fruto de grilagem de terras;

4 – Cabe notar ainda que, conforme foi observado nas mencionadas caravanas, os membros do judiciário, como mostra clara e objetiva da parcialidade aqui repudiada, demonstram claramente suas animosidades para com as representações dos trabalhadores rurais, além de fazer pouco caso às manifestações oficiais nos autos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), autarquia federal, ao informar a existência de procedimento de reconhecimento da comunidade como tradicional e interesse na área para fins de reforma agrária, o que deslocaria, conforme determina lei e jurisprudência, o feito para a instância federal;

5 – A expedição das medidas liminares em ações possessórias, em especial de reintegração de posse, seguem, assim, uma diretriz: favorecer a violência dos latifundiários, manter a grande opressão e exploração dos trabalhadores rurais, destruir suas organizações, proteger o latifúndio e dar guarida à enorme grilagem de terras públicas praticadas em todas as regiões do estado do Maranhão;

6 – Cabe dizer aqui para que todos saibam: a terra em questão pertence, por direito e herança, à comunidade tradicional e remanescente de Santa Maria, luta que tem nosso incondicional apoio, procedimento já devidamente aberto no Ministério Público Federal e em tramitação no Incra, cuja manifestação oficial encontra-se nos autos, fatos que a juíza, seletivamente, não enxerga;

7 – Além de seguir o mesmo roteiro já verificado em outras medidas liminares expedidas em outras partes do estado do Maranhão, fato importante para colocar o estado entre os mais violentos no país quando o assunto é violência no campo, a decisão ora repudiada deixa claro de que lado está, ao demonstrar todo o seu preconceito ao desrespeitar, desvalorizar e menosprezar o tipo de agricultura praticada pelo povo da Comunidade Tradicional de Santa Maria, “roça de toco”, em nome de uma suposta prática “agrosilvopastoril”, que consiste somente em plantio de eucalipto e nada mais;

8 – Como desconhece completamente a realidade em que deveria viver e estar inserida, a juíza acha que esse tipo de agricultura é coisa de outro mundo, quando na verdade é a que desmata, polui, destrói o meio ambiente, além de inibir a economia local, explorar a mão de obra e comprometer a produção de alimentos que serve a todos, tudo a um só tempo, não se observando qualquer função social;

9 – A juíza em questão precisa saber que, no dia a dia, a população come arroz, feijão, farinha, milho, macaxeira, quiabo, maxixe e tantos outros itens produzidos pela agricultura familiar, produtos que servem inclusive a ela própria, que não deve se alimentar de eucalipto, produzindo por essa tal atividade “agrosilvopastoril”;

10 – Como tem dinheiro e pode pagar por seus alimentos, emite uma decisão irresponsável e sem base legal, somente para retirar do trabalho e colocar na rua do infortúnio centenas de pessoas, famílias pobres que a tempo são perseguidas pelos autores da ação, uma comunidade tradicional que produz os seus alimentos e se sente orgulhosa e digna disso;

11 – Autoridades públicas, pagas com os recursos retirados do povo em forma de tributos, mas que têm o mau costume de menosprezar o povo, sua cultura e forma de existência. Comumente falam que o povo não quer trabalhar, mas são as primeiras oprimir o povo, permitir a sua exploração ou impedir o seu acesso à terra, única forma digna de garantir existência, vivência comunitária e produção dos seus alimentos do povo trabalhador do campo;

12 – Cabe, por fim, mais uma vez afirmar que os verdadeiros invasores de terras são esses “plantadores de eucalipto” que, além de praticarem essa agricultura nefasta – “agrosilvopastoril”, que não produz riqueza alguma para nosso país, ainda destrói a natureza e suas árvores nativas, como o buriti, coco babaçu, piqui, bacuri, comprometendo e destruindo os rios da região, devastação jamais objeto de qualquer procedimento nas instâncias locais e/ou estaduais que com elas são coniventes e compactuam.

 

Ninguém come pedra, muito menos eucalipto!

A terra é para os que nela vivem, criam seus filhos e netos, plantam, produzem, preservam, trabalham!

Nossa luta pela nossa terra!

 

Fóruns e Redes de Defesa dos Direitos da Cidadania do Maranhão

Relatoria Estadual de Direitos Humanos dos Fóruns e Redes de Cidadania

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