Lideranças locais da comunidade Aurizona, localizada no município de Godofredo Viana (MA), tem sido alvos de perseguição, intimidação e criminalização por parte da Mineradora Aurizona S/A, do grupo canadense Equinox Gold.
O Comitê de Apoio ao AND – São Luis teve acesso a dois novos processos, um cível e outro criminal, da mineradora contra Jonias Pinheiro, morador e uma das lideranças da comunidade. No processo, a empresa o acusa de promover informação falsa e de caluniar a empresa após vídeo denunciando a desastrosa situação da comunidade por consequências de ações criminosas por parte da mineradora.
A ação cível de n. 0800377-36.2023.8.10.0079 (1º grau – TJMA) foi iniciada em 16 de maio de 2023, enquanto a queixa-crime sob n. 0800686-57.2023.8.10.0079 (1º grau – TJMA) foi apresentada em 21 de agosto de 2023. Da leitura dos pedidos da ação cível fica muito claro qual o objetivo da mineradora canadense, silenciar a voz de quem organiza e mobiliza a comunidade na defesa de seus direitos.
Leia-se o pedido da mineradora:
(Que Jonias Pinheiro) se abstenha de promover a divulgação de falsas informações acerca da atividade da Autora (Mineradora) e de praticar qualquer ato de incitação popular com base em acusações infundadas;
No entanto, ao mesmo tempo que tenta usar do Judiciário para atacar o povo, a mineradora canadense demonstra o seu maior medo, isto é, que a comunidade volte a se mobilizar em protestos contra seus desmandos.
Em nota de denúncia, o Movimento dos Atingidos por Barragem (MBA) afirma que a prática de “intimidar, criminalizar, desqualificar e perseguir lideranças locais já é corriqueira e sistemática por parte da Equinox Gold. Sempre que ocorre algum tipo de protesto ou manifestação no distrito de Aurizona, é comum a mineradora apresentar um manejo jurídico para coagir e intimidar as lideranças e assim frear e até impedir a continuidade de exercer seus direitos.”
Antecedentes
No dia 25 de março de 2021, a barragem feita ilegalmente pela mineradora Equinox Gold na Lagoa do Pirocáua se rompeu, os rejeitos de mineração comprometeram a água na Lagoa Juiz de Fora e Balneário Cachimbo. Segundo o Ministério Público, a empresa omitiu que estava fazendo uso da Lagoa do Pirocáua como barragem e não cumpriu as regras da Política Nacional de Segurança de Barragens.
A Lagoa Juiz de Fora abastecia a comunidade Aurizona, composta de aproximadamente 4 mil pessoas. Na tentativa de contornar a situação, a mineradora passou a abastecer a comunidade com água de outra lagoa, porém, os moradores notaram que ela estava vindo contaminada, com uma coloração escura, sabor e cheiro desagradáveis.
Impactos na comunidade
Em estudo feito por pesquisadores do Laboratório de Educação Ambiental e Pesquisa da Universidade Federal de Ouro Preto, que reúne pesquisadores também da Universidade Federal do Maranhão – UFMA, da Universidade de São Paulo – USP, da Unicamp e da UEMASUL, pode ser observado altas concentrações de metais tóxicos na água distribuída aos moradores pela mineradora. Tais metais estão associados a efeitos mutagênicos, neuropatias e doenças cutâneas, como denuncia a comunidade ao relatar casos de coceira intensa no corpo e problemas gastrointestinais.
Além dos graves malefícios à saúde, houve impactos de ordem social e ambiental: pescadores tiveram suas redes, canoas e barcos destruídos com os rejeitos de mineração, destruição de manguezais, rachaduras nas casas e deslizamentos.
Mineradora Equinox Gold comete crimes continuamente
Em 2022, a mineradora deu início à construção de uma nova estrada na região sem consultar a comunidade e sem cumprimento de leis ambientais, de início os moradores relatam já se colocaram contra, pois o tempo de percurso para suas atividades diárias seria maior e aumentaria o gasto com locomoção.
Assim que a mineradora terminou a nova estrada, com várias curvas fechadas no meio de um mangue, duas pessoas se acidentaram gravemente em um único final de semana, o que levou a comunidade a realizar um protesto para poder continuar usando a estrada que haviam construído coletivamente com suas próprias mãos.
Passado alguns meses da construção da nova estrada, ocorre o desabamento do bota-fora da mineração que obstrui a nova estrada e deixou a comunidade isolada por mais de uma semana. Ou seja, primeiro a mineradora mudou a estrada sem qualquer consulta à comunidade e depois destruiu a via que tinha feito.
Substituir a antiga estrada por uma nova é uma tentativa de expulsar a comunidade da região. A estrada tem uma importância comunitária, social e econômica significativa pois foi construída pelos próprios moradores há mais de duas décadas para facilitar o seu acesso em uma época que a única forma de deslocamento era por água.
Expulsão dos camponeses de suas terras
No final do ano de 2023 os camponeses sofreram a humilhação de chegarem aos seus imóveis que já são registrados em cartório e se depararam com equipes de “seguranças” fortemente armados que os impediram de adentrar no que lhes pertence.
O Judiciário havia concedido o direito de servidão minerária para a empresa, em decisão liminar, sem que as famílias sequer tenham ficado sabendo do processo e iriam receber uma quantia abaixo do valor da propriedade porque a mineradora não estava reivindicando a propriedade, mas apenas o direito ao subsolo – por meio de um instituto jurídico chamado de servidão minerária – de modo que depois da exploração, os imóveis seriam supostamente devolvidos aos proprietários, o que justificaria o baixo valor das indenizações.
Essa enorme injustiça só não terminou assim, com a expulsão violenta e vil dos camponeses da Vila Aurizona, porque a comunidade se uniu em protestos e conseguiu junto com seus advogados, que a decisão judicial fosse revogada. Atualmente as famílias discutem um valor digno para permitirem a exploração do subsolo pela mineradora.
A perseguição e intimidação contra Jonias Pinheiro e demais lideranças locais a partir de processos é, portanto, só mais uma das tentativas da empresa mineradora de pôr fim à comunidade, expulsando os moradores.
Enquanto escrevíamos essa matéria, recebemos – Via Whatsapp – um vídeo de uma moradora da comunidade denunciando novamente que a água com rejeitos da mineradora está indo em direção à estação de água da comunidade.