Mais de 60 mil armênios são deslocados por ofensiva do Azerbaijão; entenda o motivo

Mais de 60 mil armênios que viviam em Nagorno-Karabakh (Artsaque, República separatista que se localizava dentro do Azerbaijão na fronteira com a Armênia, não reconhecida pelo Azerbaijão), fugiram para a Armênia após ser anunciada, no dia 20 de setembro, a rendição do governo do enclave armênio.
Armênios fugindo do país com medo da repressão. Foto: Reprodução

Mais de 60 mil armênios são deslocados por ofensiva do Azerbaijão; entenda o motivo

Mais de 60 mil armênios que viviam em Nagorno-Karabakh (Artsaque, República separatista que se localizava dentro do Azerbaijão na fronteira com a Armênia, não reconhecida pelo Azerbaijão), fugiram para a Armênia após ser anunciada, no dia 20 de setembro, a rendição do governo do enclave armênio.

Mais de 60 mil armênios que viviam em Nagorno-Karabakh (Artsaque, República separatista que se localizava dentro do Azerbaijão na fronteira com a Armênia, não reconhecida pelo Azerbaijão), fugiram para a Armênia após ser anunciada, no dia 20 de setembro, a rendição do governo do enclave armênio. Tal comunicado se dá 24 horas após as forças azeris promoverem o ataque à República separatista. Vídeos compartilhados na internet mostram a fuga desesperada de milhares de armênios enquanto soldados do Azerbaijão (azeris) saqueiam casas e destroem igrejas. Os armênios de Artsaque temem um genocídio caso permaneçam no país, e, agora, fogem desesperadamente para a Armênia. As autoridades armênias temem ter que receber todos os 120 mil armênios que viviam em Artsaque.

Tudo isto ocorre após o líder da República de Nagorno-Karabakh (Artsaque), Samvel Shahmaranyan, assinar um decreto para encerrar todas as instituições administrativas no dia 1º de janeiro de 2024. De acordo com o monopólio de imprensa Reuters, o decreto afirmava: “Dissolver todas as instituições e organizações estatais sob suas unidades subordinadas até 1º de janeiro de 2024 e acabar com a existência da República de Nagorno-Karabakh (Artsaque)”. O primeiro-ministro arménio Nikol Pashinyan afirmou que não haverá mais armênios em Nagorno-Karabakh nos próximos dias.

Dias antes, em 19 de setembro, o ministério da Defesa do Azerbaijão anunciou uma operação militar contra Karabakh. Artsaque, por sua vez, anunciou num comunicado um dia depois que aceitou um cessar-fogo sob a mediação das forças russas de “manutenção da paz”. Após o cessar-fogo, foram realizadas duas reuniões entre representantes armênios do Azerbaijão e de Karabakh.

Desde o século XX, os armênios são alvos de perseguições. O expansionismo turco kemalista foi responsável pelo massacre de centenas de milhares de armênios, que resistiram por décadas de armas nas mãos. Mais recentemente, na década de 1980 e 90, antes da dissolução da União Soviética já social-imperialista, a violência reacionária contra os armênios marcou a história na região do Cáucaso. Assim como Artsaque, uma das inúmeras repúblicas separatistas que surgiram naquela época, na Chechênia também se produziram episódios de uma resistência: durante nove anos, chechenos resistiram à guerra genocida promovida pelo imperialismo russo antes de ser, finalmente, anexada à Federação Russa.

Região tem histórico de conflitos

O conflito entre turcos/azeris e armênios remonta à primeira guerra mundial. Na época, a Armênia era dividida entre Império Otomano e Império Russo, com a sua maioria territorial e populacional no Império Otomano. O Azerbaijão, que é uma nação túrquica, com laços culturais muito fortemente ligados à Turquia, era parte do Império Russo. Após a derrocada dos Otomanos na primeira guerra mundial, a grande burguesia burocrática turco-otomana desencadeou um processo de autonomia através da “Guerra de Independência”. Se declarou a república da Turquia, e se estabeleceu um regime de tipo fascista (kemalismo) que levou a cabo um grande genocídio contra as minorias do Império Otomano, particularmente, foram afetados armênios, más também assirios e gregos. Ibrahim Kaypakkaya, fundador do Partido Comunista da Turquia/Marxista-Leninista (TKP/ML), definia o kemalismo como “o incitamento ao chauvinismo turco em todos os campos, a aplicação de uma opressão nacional implacável às nacionalidades minoritárias, a turquificação forçada e o assassinato em massa”.

Os armênios eram perseguidos desde antes da guerra imperialista, mas o genocídio promovido pelo expansionismo turco após a guerra levou a morte de 85% da população armênia do país, que outrora tinha mais de 2 milhões de membros, e em 1922 contava com um pouco mais de 300 mil. O povo armênio contou com a intervenção dos bolcheviques. Avançando pelo Cáucaso, os comunistas dirigidos por Lenin impediram que as partes russas da Armênia fossem molestadas pelos expansionistas turcos. E, após um armistício, a Armênia passou a ser parte da União Soviética (URSS) de Lenin e Stalin, enquanto que, na Turquia, poucos armênios sobreviveram, a maioria tendo que migrar de suas terras natais. 

A Armênia soviética, declarada em 30 de novembro de 1920, baseada na solidariedade entre os povos, foi responsável por estancar o conflito militar. Dentro do Azerbaijão, havia uma região onde a grande maioria da população era armênia, desconectada da República da Armênia em si, esta região se tornou a “Oblast Autônoma de Alto Carabaque”.

Armênia e Azerbaijão viveram em paz a prosperidade como países-membros da URSS de Lenin e Stalin. Porém, no contexto do social-imperialismo soviético, após a restauração capitalista encabeçada por Kruschov em 1956 e sobretudo próximo à dissolução promovida por Gorbachov na década de 1990, após anos de abusos pelas autoridades revisionistas de Moscou, com chauvinismo e ações que resultaram em descontentamento das massas populares com o regime social-imperialista, cresceram as tensões entre a Armênia e o Azerbaijão – também impulsionadas pela atuação dos imperialistas ianques ali instalados.

Já em 1988, antes mesmo de declararem a independência, a violência em Alto Carabaque começava. O governo de Alto Carabaque declarou independência como a República de Artsaque, e, combinado à Armênia, foi na ofensiva contra o Azerbaijão, que procurava manter Artsaque sob seu controle direto. A guerra acabou em 1994 com um saldo de 16 mil mortos e mais de 1 milhão de pessoas deslocadas. Armênios foram expulsos do Azerbaijão e azeris expulsos da Armênia. Uma Artsaque independente, porém, se formou, controlando toda a fronteira oeste do Azerbaijão com a Armênia.

A situação se manteve até 2020, quando uma nova guerra estourou, desta vez com uma vitória azeri, conquistando uma grande parte do território de Artsaque e cortando a república da Armênia. A Rússia imperialista (motivada pelo chauvinismo grão-russo impulsionado por Putin) se envolveu diretamente no conflito, fazendo a mediação de um acordo de paz e ocupando uma faixa de terra que conecta Arsaque a Armênia, para garantir que os armênios possam viajar entre as duas repúblicas. Porém, a situação teve uma grande viragem no dia 19 de setembro deste ano: o novo ataque a Artsaque levou a que, em 24 horas, o Azerbaijão conquistasse a vitória.

Genocídio é culpa do imperialismo

Tanto a Armênia como o Azerbaijão faziam parte da União Soviética até 1990. A desintegração da URSS, como consequência da restauração capitalista de 1956, fez com que o imperialismo ianque buscasse desesperadamente penetrar nos países recém-independentes, inclusive no Cáucaso. O Azerbaijão era a base perfeita para os propósitos dos ianques, já que apenas um ano antes, acontecia uma grande rebelião popular de cunho separatista e nacionalista, o “Janeiro Negro”.

Ali, 147 pessoas foram assassinadas pelas tropas reacionárias do social-imperialismo russo durante uma intervenção militar desastrosa na capital do país, fazendo com que a presença ianque fosse vista como a salvação da nação aos olhos tanto dos políticos reacionários e aproveitadores da grande burguesia azeris, como também dos reacionários pró-ianques no Irã, vizinho ao sul do Azerbaijão, inimigo do USA – o Irã conta com uma população de 15 milhões de azeris (mais do que o Azerbaijão em si, com 10 milhões), que se concentram na fronteira com o Azerbaijão.

O firme controle do Azerbaijão pelo imperialismo ianque permitia criar uma base militar e política segura em seus propósitos de penetrar no Leste europeu e na Ásia Central. Isto assegurava a possibilidade de neutralizar a superpotência atômica (imperialismo russo) e golpear o Irã. O entrincheiramento do USA no Azerbaijão fez com que a Rússia se entrincheirasse ainda mais na Armênia, que era bem recebido pelos políticos aproveitadores. Do lado das massas, tanto armênios, como de azeris, elas seguiam sofrendo da exploração desapiedada do “novo” regime de opressão e exploração nos dois países (seja o pró-russo da Armênia, seja o pró-ianque do Azerbaijão).

Mas com a base segura, veio a carta branca dos ianques: por meio da OTAN e ONU, uma série de ações foram feitas para acabar com Artsaque; tudo como parte da estratégia ianque de cercar a Rússia através dos países outrora integrantes da antiga URSS.

O imperialismo russo de Putin – atolado na injusta guerra de invasão contra a Ucrânia – nada faz, e agora, assiste a retirada desesperada de armênios de Artsaque de longe, ocupada com o banho de sangue na Ucrânia. O imperialismo ianque, por sua vez, desponta como um dos responsáveis no genocídio.

Mapa mostra a divisão territorial do Cáucaso na União Soviética, se pode ver a Oblast Autônoma que viria a se tornar Artsaque nas linhas pontilhadas dentro do Azerbaijão. Foto: Reprodução
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