Massacre de Tupã, dos crimes que não podemos esquecer

Massacre de Tupã, dos crimes que não podemos esquecer

Foto dos comunistas mortos durante o massacre de Tupã. Foto: Reprodução.

Em 1949, os comunistas do Brasil atuando na dura clandestinidade seguiam mobilizando os trabalhadores, mesmo frente às maquinações e golpes duros assentados pelo governo fascista de Eurico Gaspar Dutra. Em Tupã, cidade do interior paulista comandada pelo latifúndio, os comunistas organizaram o Congresso de Trabalhadores Rurais da Alta Paulista, cujo objetivo final era montar uma União Camponesa na região.

De início, o congresso camponês seria realizado no mês de maio na cidade de Marília – São Paulo, porém, foram proibidos pela polícia que, sob o governo de Gaspar Dutra (1946-1951), realizou cerca de 400 intervenções em sindicatos e matou 55 militantes, em sua grande maioria comunistas ou simpatizantes do Partido. Mesmo proibido, o congresso aconteceria na clandestinidade. 

A gleba de Dário de Souza, militante comunista e camponês, foi escolhida para reunir os companheiros. Não era um local recomendado pelo Partido, pois era visado e mais de uma vez Dário recebeu visitas de comunistas clandestinos que provocaram certas queixas por parte da latifundiária dona da fazenda que arrendara.

A ‘MOCINHA DO BARULHO’ DESEMBARCA EM TUPÃ

Era dia 23 de setembro quando Maria Aparecida chega em Tupã, escalada pelo Partido para auxiliar nos preparativos do Congresso Camponês. Tinha apenas 20 anos, vinha de Santa Cruz, onde, num comício de Prestes Maia, pediu a palavra, subiu no palanque e saudou o Partido Comunista do Brasil – P.C.B., Luiz Carlos Prestes e terminou com a consigna Viva a paz!, a principal consigna do Partido à época. Sumiu na multidão, protegida pelos camaradas do Partido. No outro dia a imprensa marrom da burguesia e do latifúndio lhe deu a alcunha “mocinha do barulho”.

Maria pediu que a casa de Dário não fosse utilizada, sabendo de toda a suspeita da polícia em cima da casa. Mesmo assim, não pode impedir a decisão dos demais de fixar o local da reunião na gleba do camponês. 

O MASSACRE 

No dia 25 de setembro se reuniram os pouco mais de dez delegados camponeses. Não se sabe ao certo quem os denunciou à polícia, e as versões se dividem entre um parente próximo da dona da fazenda ou a própria latifundiária que já se queixava das visitas de companheiros à Dário. Mas é certo que o delegado Renato Imparato montou a tocaia dos policiais e que os agentes da repressão chegaram pouco depois da reunião, o que salvou muitos companheiros que já haviam ido embora. Porém, outros dormiam na gleba para tomar o trem no dia seguinte.

O sargento Nilo Cipriano Oliveira deu voz de prisão aos que conversavam fora casa, um dos soldados tentou desarmar o dirigente camponês Miguel Rossi, que reagiu e foi brutalmente assassinado. Os que ainda estavam na casa tentaram fugir, mas foram alvejados pela polícia, resultando em mais dois trabalhadores assassinados. Apenas Dário de Paula conseguiu fugir, Maria Aparecida e Honório foram presos.

Após o massacre o Partido mobilizou uma imensa campanha de denúncia do crime do velho Estado. Por todo o país os trabalhadores recebiam e repercutiram os acontecimentos de Tupã. Democratas, juntamente com Pedro Pomar e Diógenes Arruda (parlamentares comunistas ainda não cassados) denunciaram o crime e assinaram o “Manifesto ao povo do estado de São Paulo” que dizia que:

“Os parlamentares e cidadãos abaixo-assinados (…) ainda mal refeitos da indignação que lhes causaram os bárbaros e desumanos acontecimentos de 25 de setembro em Tupã, onde, ultrapassando todos os limites do arbítrio e da ilegalidade, a polícia atirou mortalmente contra três honrados chefes de família, vêm pelo presente tornar público o seu protesto por tão violenta atitude tomada justamente por aqueles que têm o dever de evitar fatos dessa natureza. Proclamam sua irrestrita solidariedade ao povo de São Paulo e às famílias de Miguel Rossi, Afonso Marma e Pedro Godói que tombaram em Tupã, vítimas de um ataque brutal, quando no franco exercício dos direitos que a Constituição garante a todo cidadão”. 

Duas caravanas partiram de São Paulo e do Rio, convocadas pelo movimento feminino para denunciar os crimes ocorridos em Tupã e prestar solidariedade aos presos políticos da chacina. Adhemar de Barros, governador de São Paulo, se negou a recebê-las. Em uma das caravanas as mulheres foram detidas e espancadas pela polícia, sendo colocadas em um trem de volta para São Paulo capital. Depois de seis meses e nove dias Maria Aparecida e Honório Tavares foram libertados. Era vitória da campanha de solidariedade encabeçada pelo Partido. Maria se tornaria uma conhecida pintora nos próximos anos.

A Chacina de Tupã entraria para a história como um dos mais brutais massacres promovidos pelo velho Estado contra o Partido Comunista do Brasil – P.C.B.

Abaixo, uma biografia das três vítimas da chacina, Afonso Marma, Pedro Godoy e Miguel Rossi.

Afonso Marma (1908-1949), lituano, se mudou para o Brasil em 1927, entrou para o Partido Comunista do Brasil – P.C.B. e ajudou a organizar e mobilizar a comunidade lituana no Brasil. Foi preso e deportado em 1930 e passou a se dedicar ao trabalho internacional em outros países da América Latina, destacadamente Argentina e Uruguai. Voltou para o Brasil em 1935 e atuava no movimento operário quando foi escalado para o Partido para trabalhar na organização dos camponeses na Alta Paulista. Se tornou herói nacional na Lituânia após sua morte.

Pedro Godoy (1920-1949), estivador em Santos, entrou para o Partido em 1946, durante a legalidade. Foi candidato a vereador e dirigente sindical. Perseguido e visado pela repressão, foi para a Alta Paulista, se tornando ativo nas lutas camponesas dirigidas pelo Partido. 

Miguel Rossi (1907-1949) entrou para o Partido em 1933, militou na Aliança Nacional Libertadora (ANL). Preso em 1936, passou cerca de um ano na cadeia. Trabalhava e militava em Garça (SP) quando foi assassinado. O jornal Voz Operária deu detalhes sobre sua morte:

“O delegado Imparato impediu que fosse prestado socorro médico a Godoy. Dirigindo-se ao bravo proletário, o bandido policial disse: ‘Você pode salvar-se. Mandarei tirar a bala, fazer os curativos se você der os nomes dos outros’. O cão policial propunha que trocasse sua vida pela honra. Pedro Godoy, dominando as dores atrozes que o consumiam, queimou o bandido com o lampejo de ódio do seu olhar. Escarrou na cara do policial e, reunindo suas últimas forças, deu-lhe um pontapé com a perna ferida. Depois voltou-se para a parede, fechou os olhos e esperou a morte.” (VO, 25 de setembro de 1954). 

Os comunistas assassinados em Tupã foram enterrados como indigentes, apesar de todos terem sido identificados e portarem documentos. Os monopólios de imprensa, na sua sanha anticomunista, tentaram manchar de lama o legado destes heróis do povo brasileiro, afirmando que teriam reagido a voz de prisão e se envolvido em um tiroteio intenso com a policia portando armas pesadas, que por sinal foram assumidamente plantadas na cena pela repressão. Com elas foi simulado um tiroteio, muito semelhante ao que ocorreu anos depois na chacina da Lapa, perpetrada pelo odioso regime militar fascista que vitimou outros três companheiros: Pedro Pomar, Ângelo Arroyo e João Batista Drummond.

A repressão vitimou milhares de combatentes revolucionários. Das vítimas do Estado Novo até os bravos guerrilheiros da guerrilha do Araguaia, todos tombaram por um ideal, todos tombaram por um novo mundo, por um novo Brasil, e tal qual a canção emblemática do campesinato revolucionário brasileiro que diz “se matarem um daqui, surgem mil em seu lugar”, sempre haverá uma nova geração de combatentes para pegar em suas mãos a bandeira vermelha e marchar em direção a vitória final. Certos disso, os comunistas e democratas têm em si todos os sonhos do mundo.

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