A bra$ilidade do tênis

A bra$ilidade do tênis

Sem dúvidas, a Confederação Brasileira de Tênis passou, nos últimos meses, pela pior crise de toda a sua história, quando os principais atletas, entre eles Gustavo Kuerten, resolveram se unir e boicotar a participação da CTB na Copa Davis, contra o Paraguai. Segundo Guga e seus companheiros, a razão principal para o boicote é a péssima administração de Nelson Nastás, na presidência da entidade desde 1994. No entanto o, nem tão recente, abalo nas estruturas do esporte, desde junho de 2003, revela sintomas bem mais agudos.

A polêmica começou quando Jorge Lacerda Rosa, presidente da Federação de Tênis de Santa Catarina, observou uma prestação de contas da CBT. No balanço, chamou a atenção de Lacerda o fato da Confederação não ter incluído débitos com a Federação Catarinense e com a cidade de Florianópolis, relativos às despesas do confronto entre Brasil e Austrália, pela Copa Davis de 2001. Numa reportagem publicada na época pelo jornal Folha de São Paulo, ficou revelado que a CBT deve cerca de R$ 147 mil à Federação catarinense e outros R$ 100 mil ao município de Florianópolis.

Assim, o boicote de Gustavo Kuerten contra Nelson Nastás não ficou muito bem explicado. Há quem diga que a tentativa de enfraquecer Nastás seria uma forma de abrir espaço político na confederação e eleger como seu presidente um membro da família Kuerten, ou mesmo o atual presidente da Federação Catarinense, Jorge Lacerda Rosa. Criou-se o Movimento Tênis Brasil, com o intuito de moralizar as coisas no esporte. Guga, apesar de suas negativas, apóia o movimento e lhe dá sustentação através do presidente da Federação Catarinense.

Lacerda Rosa é uma peça importante na tentativa da família Kuerten dominar o tênis brasileiro. Ele já foi sócio de Alice Kuerten, mãe de Guga, em um posto de gasolina em Florianópolis, e também vice-presidente do Instituto do Tênis presidido por Rafael Kuerten, irmão de Guga, auxiliando novos talentos do tênis catarinense.

Na guerra instaurada no esporte, definitivamente, não há santos. Tudo se resume a uma questão de poder. Sabendo dos interesses da família Kuerten em controlar o tênis nacional fica cada vez mais difícil ver em Guga um arauto da moralidade, tanto mais que a sua atitude de abandonar a equipe na Copa Davis foi precedida por um planejamento meticuloso, favorecendo sua família e interesses correspondentes.

A fama de Nelson Nastás por controlar a confederação com mão de ferro é conhecida por todos; uma administração que passa longe dos princípios democráticos necessários para o crescimento do esporte dentro do país. Mas o verdadeiro estopim para o boicote foi a saída de Ricardo Acioly como capitão da equipe para a entrada de Jaime Oncis. A troca no cargo foi o pretexto que Guga esperava para iniciar as manobras destinadas a destronar, de uma vez por todas, Nelson Nastás. A postura de Gustavo Kuerten causa estranheza, já que em 1998, em momento parecido, adotou uma atitude diferente. Há seis anos, quando Paulo Cleto saiu para a entrada de Ricardo Acioly, o craque do tênis brasileiro não questionou os mesmos métodos e critérios utilizados pela CBT. Na ocasião, quem se pronunciou para justificar a troca de capitão foi Fernando Meligeni. Guga limitou-se a apoiar, em silêncio, Meligeni, para quem Paulo Cleto não viajava o circuito e nem observava os potenciais adversários da equipe brasileira.

O que causa estranheza é o fato de Guga protestar contra Jaime Oncis, um ex-jogador da Davis ao seu lado e atual treinador de André Sá, que tem toda a experiência necessária para o cargo. Contudo, Guga ignorou o currículo do companheiro e abandonou a equipe.

Os bastidores do tênis brasileiro vêm se movimentando intensamente nas últimas semanas; pressões e contra-pressões afetam dirigentes e atletas. Além do interesse da família Kuerten em dominar o tênis nacional existe uma outra explicação para o boicote. O grupo Koch Tavares, que detém os direitos de comercialização da Copa Davis — e havia marcado as partidas para serem realizadas na Costa do Sauípe, Bahia —, também administra a carreira de Guga e a de seu técnico, Larri Passos. Desesperados, os executivos da Koch tentaram pressionar o tenista, mas de nada adiantou. Uma forte onda vem se formando pelas bandas do grupo ligado à Federação Catarinense e aos ex-tenistas Nelson Aertes e Danilo Marcelino, donos de uma empresa promotora de eventos esportivos que concorrem diretamente com o grupo Koch Tavares.

Perder a organização da competição na Costa do Sauípe, significaria um enorme prejuízo financeiro ao grupo Koch, golpe certeiro que abalaria a briga pelo domínio do circuito de torneios no Brasil. Em meio aos jogos de imensos interesses comerciais, denúncias de corrupção e com a imagem abalada, justamente no ano da disputa da Olimpíada de Atenas, o maior prejudicado é o tênis brasileiro, com a ausência de craques nacionais como Guga e Flávio Saretta.

Nastás cede à oposição

Na tentativa de amenizar a crise, o próprio presidente da Confederação, Nelson Nastás, decidiu antecipar as eleições do seu substituto na entidade para o dia 15 de maio, e ainda se comprometeu a não concorrer à reeleição. Mesmo assim, depois da decisão tomada por Nastás, Guga e a oposição não se mostraram muito entusiasmados. Jorge Lacerda Rosa, presidente da Federação Catarinense, declarou que foi dado um passo muito importante na questão política, mas que a situação da Copa Davis em nada mudou. “Se os jogadores mantiverem sua palavra, ninguém vai jogar contra o Paraguai nestas condições”, afirmou. Para o grupo de oposição, Nastás não cedeu completamente ao pedido de afastamento exigido pelos jogadores da Davis e isso seria o motivo da sustentação do boicote. “Se Guga jogar e a Koch Tavares promover bem o evento, o Nastás vai ficar mais forte e pode mudar de idéia quanto deixar o cargo ou não tentar a reeleição”, avaliou Rosa na ocasião.

O presidente da Federação Catarinense só acreditará na real intenção de Nastás em deixar a CBT se o edital de convocação da Assembléia for publicado, conforme prometido. Nastás, por sua vez, através de seus advogados, entrou com petição junto à 1ª Vara Cível de São Paulo, onde repete o que prometeu em comunicado, ou seja, convocar a eleição para 15 de maio, não concorrer e permitir que os jogadores da Davis escolham a equipe técnica. A principal novidade foi também fixar a data da Assembléia Ordinária, que analisará as contas de 2003, para dia 30 de abril. “Acho que demos um avanço no campo político. Mas a Confederação anda falando por aí que existem muitas federações irregulares e precisa dizer, em edital, quem são e quais os impedimentos para participar das Assembléias.”

Resultado negativo

Boicote mantido e como consequência um péssimo resultado para o tênis nacional, a equipe brasileira, no confronto contra o Paraguai pela Copa Davis, realizada entre os dias 9 e 11 de abril, na Costa do Sauípe, foi composta pelo gaúcho Marcos Daniel e pelos paulistas Alexandre Simoni e Júlio Silva, comandados pelo técnico Carlos Chabalgoity e o auxiliar Edvaldo Oliveira. Como muitos já esperavam, não atingiu o resultado positivo para o Brasil, perdendo para os paraguaios. Com a derrota, a Confederação está seriamente ameaçada de disputar a terceira divisão do tênis mundial, fato inédito.

Essa é, sem dúvida alguma, a maior crise já vivida pelo tênis nacional desde que, com o primeiro título do catarinense em Roland Garros, há sete anos, o esporte passou a ocupar as manchetes dos jornais. Eu concordo com Oscar e condeno o boicote, afinal o Brasil e o tênis brasileiro deve ser preservado diante de discussões políticas, aonde se vê de um lado a atual presidência da CBT e do outro a sua oposição (comandada pela Federação Catarinense) e a emblemática figura de Larri Passos. Mas se Guga acha que o nosso tênis não tem se desenvolvido devido à inoperância e incompetência da CBT imaginemos com a equipe da Davis na Terceira Divisão? Com toda essa confusão Jaime Oncins sai crucificado, intitulado como “traidor” ao aceitar o cargo de capitão, colocando em xeque a sua amizade com Guga.

Indefinição de Estrela

Antes de partir para a temporada européia de saibro, onde jogará três Masters Series e Roland Garros, a estrela brasileira Gustavo Kuerten concedeu uma entrevista coletiva em Camboriú, S C. Guga não confirmou se voltará a defender a equipe brasileira nas partidas contra a Venezuela, em julho, pela Copa Davis. Depois da derrota para o Paraguai, o Brasil precisa vencer os venezuelanos para se manter na Segunda Divisão. “Espero que as coisas se esclareçam mais em relação à Confederação. Continuo mantendo a minha opinião da última Copa Davis e não sei qual vai ser o procedimento das eleições. Tudo está meio no ar. Era essa a dúvida que a gente tinha antes do confronto contra o Paraguai. Vamos ver se essa mudança se concretiza para que a gente possa voltar a competir”, tentou esclarecer.

Guga continua afirmando que só voltará a defender seu país na Copa Davis se realmente houver mudanças profundas e radicais. “Acho que agora, mais do que nunca. Com política nunca me envolvi e não conheço como é o protocolo, dentro da lei e o que vale e o que não vale. Só tenho cada vez mais certeza de que não tenho nada a ver com essa administração. Tomara que haja uma mudança para eu voltar a jogar”, disse o jogador que tenta se manter longe da politicagem no esporte, mas que na verdade defende a eleição do presidente da Federação Catarinense ao comando da CBT.

Uma disputa pelo poder

A Confederação se mostra interessada em contornar a enorme crise, mas, tudo indica, a resolução ficará para julho. Assim, como já tinha estabelecido para o fim da batalha que se instaurou nos bastidores do esporte, Nelson Nástas convocará novas eleições na entidade, em julho, e se comprometeria a não concorrer a outro mandato. Com isso, Nastas estaria praticamente deixando a presidência da CBT, atendendo a exigência dos jogadores para participar da Copa Davis. Fica no ar a dúvida: o dirigente elegeria um sucessor para o seu posto ou ficaria definitivamente afastado? Com certeza um popular “barraco” foi instalado neste esporte tão inativo dentro do nosso país e ao mesmo tempo tão elitizado. É fato também, que com o início da “Era Guga” muito dinheiro circulou nos bastidores do esporte. Com o aparecimento de Guga no cenário mundial, vários foram os investidores, patrocinadores e organizadores de eventos que passaram a ver no esporte uma mina de dinheiro.

Antes, sem patrocínio de grandes empresas como o Banco do Brasil, o esporte já era considerado de elite, pois só quem desfrutava de excelente condição financeira o praticava — o próprio passado de Guga não nos deixa mentir. Além do Banco do Brasil, fábricas nacionais de material esportivo, como a Olympikus e emissoras de TV, também estão por trás do financiamento desse esporte ainda mais elitizado.

O canal fechado SporTV, depois do sucesso de Guga, passou a ser um grande parceiro da CBT, como se fosse um patrocinador. Além do contrato de exclusividade na transmissão dos jogos da Copa Davis, o canal paga uma verba mensal à entidade e se propõe a transmitir 10 finais de campeonatos por ano, o que é muito interessante em termos financeiros para a Confederação. No desenrolar dessa crise há uma disputa pelo novo controlador do tênis brasileiro. Uma guerra pelo poder, que causou uma vítima fatal: o tênis brasileiro. Como fruto dessa disputa, a confederação brasileira está ameaçada de cair para a terceira divisão do tênis mundial, ocupando a última colocação no ranking e com grandes chances de fazer uma péssima exibição na Olimpíada de Atenas. Nessa guerra de poder e vaidade quem perde é o esporte e, ao que parece, os demais ganham, sempre.

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