Nos últimos anos vem crescendo a chamada "consciência ecológica". O circo apresenta desde pequenas passeatas de crianças rosadas, cujos pais podem trabalhar, ou mesmo possuir fábricas, madeireiras, etc, até ações cinematográficas de ONGs ianques, tudo regado por intensa campanha do monopólio dos meios de comunicação.
Nessas campanhas tenta-se diluir tanto a responsabilidade pela degradação ambiental, quanto sua solução, por toda a população. O que se conseguiu até agora foi transformar a conservação ambiental, ou pelo menos que aparente ser conservacionismo, em um grande negócio, que ilude os incautos e bem intencionados e enriquece os hipócritas.
O barato custa caro
Uma breve pesquisa sobre o assunto revela que na reciclagem de papel economiza-se cerca de 2,5 barris de petróleo, 98 mil litros de água e 2.500 kw/h de energia elétrica por tonelada. Argumenta-se ainda que uma tonelada de aparas (pe-daços de papel a serem reciclados) pode substituir de 2 a 4 m3 de madei-ra, conforme o tipo de papel a ser fabricado, o que se traduz em uma nova vida útil para 15 a 30 árvores.
Esta economia deve-se ao fato de que para se produzir papel vir-gem é necessário derrubar a árvo-re, separar a lignina (substância que dá rigidez à madeira) da celulose, processo que pode ser físico (moagem) ou químico, que resultará na polpa de celulose, que po-derá ser alvejada, dependendo do uso. No caso do papel reciclado, a celulose já está separada. Basta desagregar e refazer o papel: o processo é muito mais rápido e menos trabalhoso. Todavia, o papel não pode ser reciclado indefinidamente. A cada ciclo, a fibra perde qualidade, sendo necessário misturar-se fibra nova para o papel manter a resistência.
Com tamanha economia de recursos, seria de se esperar que o papel reciclado fosse bem mais barato que o papel novo. Ou, se o objetivo fosse apenas melhorar o apro-veitamento das matérias primas, que a celulose virgem e a reciclada se misturassem, e pronto. Mas existe o ser sinistro, com vontade própria, inventado pelos economistas burgueses, o mercado, que percebendo a existência de pessoas dispostas a pagar mais por algo que custa menos, em troca da consciência limpa por estar protegendo a natureza, eleva os preços em até 30%.
Vale ressaltar que a tal conservação de árvores é um mito. O eucalipto, madeira responsável pela maior parte da produção de papel, é uma roça como qualquer outra, ou seja, após sete anos é tempo de colheita, e ele vêm abaixo para a produção de papel, de carvão, ou madeirame da construção civil.
Não seria surpresa se, com o aumento da demanda, o papel "reciclado" passasse a ser feito principalmente com celulose virgem.
A reciclagem da miséria
Na era do imperialismo, para algo funcionar é necessário que gere o máximo de lucro. A recicla-gem não foge à regra. No caso de muitas empresas, longe de existir uma real preocupação com o meio ambiente, o que se abriu foi uma boa perspectiva de negócios. Com a propaganda de que são boazi-nhas e protegem o meio ambiente, elas exploram a mão de obra extremamente barata de uma legião de miseráveis que, para sobreviver, se vêem obrigados a vender sua for-ça de trabalho por qualquer trocado, submetendo-se às mais aviltantes condições de vida e trabalho.
Uma parte vital do processo de reciclagem é a coleta e separação do lixo. Ela é realizada por um exér-cito de homens, mulheres e crianças que, impossibilitados de conseguir um emprego digno, submetem-se a este trabalho, quer nos li-xões, quer nas cidades, empurrando carroças improvisadas, revirando o lixo de casas e estabelecimentos comerciais, na esperança de ne-le encontrar algo para o almoço ou outras necessidades imediatas. Da exploração da miséria desta gente batalhadora alimenta-se uma crosta de ONGs, administradores de associações e cooperativas, atravessadores, até chegar à indústria. To-dos em uníssono mostrando como são bons, afinal estão preservando o meio ambiente.
Argumenta-se que a reciclagem aumentou a renda de milhares de brasileiros, que nas associações é feito um trabalho psicológico para aumentar a auto-estima dos catadores, que é necessário melhorar suas condições de trabalho e por ai vai. Aumentar a renda de quem não ganha nada, ou muito pouco não é tarefa difícil e convencer os ca-tadores de que eles são paladinos da conservação, e não carne de ca-nhão para toda a sorte de explora-dores, não passa de hipocrisia.
Engarrafamento ecológico
Tanto a indústria automobilística como a academia vibram em anunciar motores com menor emissão de gases. Veículos elétricos, biocombustíveis, gás natural, hidrogê-nio, tudo articulado por campanhas publicitárias para vender mais carros e motocicletas. A consequência mais visível são os engarrafamentos (quase se pode falar disso no singular), que levam ao caos o trânsito nas grandes cidades.
O que pouco se diz é que a po-luição gerada por um veículo é mui-to mais que a emissão de gases, ocorrida durante sua vida útil. Ela começa na mineradora e termina no ferro velho e na pilha de pneus, tudo para produzir um meio de transporte confortável, mas ineficiente do ponto de vista ambiental e social.
A solução encontrada e não divulgada, simplesmente implementada, é impedir que pobres e mesmo setores mais proletarizados da pequena burguesia tenham carro. Tal objetivo é alcançado aplicando multas altíssimas e criando disposi-tivos legais que visam retirar carros mais antigos das ruas. Obviamente tal estratégia não dá resultado e o número de veículos cresce em proporção direta com o aumento do tempo de chegada ao trabalho.
A culpa é sempre do povo
Nas campanhas "verdes" da grande imprensa, a responsabilidade pela degradação ambiental é sempre atribuída ao povo, seja o camponês pobre que desmata alguns hectares para sobreviver, seja a população das cidades que compra no supermercado produtos embalados em plástico. A coisa chega a ser patética. Em certa maté-ria, transmitida pela televisão, um casal passou a acumular as embala-gens para ver o lixo que gerava em determinado espaço de tempo. Ao final, toma a decisão de modificar seus hábitos para deixar um mundo melhor para a filhinha.
Considerando que o casal não possuía indústria de plástico nem de papel, é uma falácia afirmar que eles geraram o lixo. Foram somente depositários, pois o lixo passou pe-las mãos deles sem ser transformado. Vale ressaltar que o plástico tor-nou-se a matéria prima mais utili-zada para embalagem por ser eficiente, impermeável, resistente e barato. Além do que o consumidor não tem muita defesa pois o produto vem embalado, e pronto.
Solução coletiva, a única possível
A lógica do imperialismo, em-bora implacável, é de uma simplicidade enorme: obter o lucro máximo em um tempo mínimo, não importando a forma nem as consequências. O que importa é vender carros, mesmo que, para ficarem retidos no engarrafamento, poluí-rem o ar, etc. A reciclagem até pode ser viável se der lucro, mas mudar a forma de oferecer os produtos, di-minuindo a lucratividade, nem pensar. Controlar emissão de gases, desde que não afete os interesses imperialistas, também é uma (im)possibilidade. Com esta lógica, qualquer propaganda conservacionis-ta cai no vazio, por mais bem intencionada que seja.
A verdadeira solução também segue uma lógica bastante simples, mas antagônica à do imperialismo: a coletivização dos meios de produção e da apropriação do produto do trabalho.
Por exemplo, a embalagem é uma diferença que salta aos olhos, quando comparamos um centro atacadista com as prateleiras de um supermercado. A quantidade de plástico e bandejinhas de isopor existentes nas lojas de varejo é impressionante. Isto ocorre porque, no supermercado, os produtos estão embalados para consumo do-méstico e até individual. Às emba-lagens serão somadas ainda as sobras, o tempo gasto para preparar os alimentos e a lava-gem dos utensílios. Isto sem falar na consequência mais nefasta do trabalho doméstico, a escravização da mulher.
Restaurantes com comida boa e barata nos lugares de traba-lho, nas escolas, nos bairros, abertos dia e noite (o mesmo se aplica a lavanderias), representariam uma enorme economia de tempo e recursos para a sociedade. Outro fator importante é a facilidade de administrar o lixo que, além de ser gerado em menor quantidade, estaria concentrado em me-nos pontos. Mas o que seria das transnacio-nais que produzem eletrodomésticos, se as cozinhas ficassem reduzidas a um fogão para esquentar um cafezinho na madrugada, por mera comodidade, já que o res-taurante estaria lá?
Quanto aos engarrafamentos, não importa o combustível utilizado: se a frota continua crescendo o tráfego torna-se invi-ável. A única solução possível é transporte de massa com qualidade, conforto e rapidez, um único condutor substituindo de-zenas e até mesmo centenas, que apro-veitariam o deslocamento para casa ou para o trabalho, para ler, conversar ou descansar.
Em uma socie-dade na qual o foco seja o bem-estar de seus membros, a coleta de lixo, além de facilitada, deve ser feita por gente qualificada, bem remunerada e com equipamento de proteção adequado. Jul-gar que se pode evitar a degradação ambiental, sem mexer nos atuais padrões de consumo e, principalmente, no sistema imperialista de dominação, é ingenuidade ou mentira deslavada.
Uma Fábula Ecológica
Há muito tempo, em um lugar muito distante, houve uma inundação.
Em uma pequena ilha que se formou, encontravam-se um sapo e um escorpião. Este, não sabendo nadar e vendo que o nível da água rapidamente subia, pediu ao sapo uma carona para atravessar a água. Conhecendo a fama do escorpião, o sapo prontamente respondeu:
— De forma alguma, você vai é me matar.
O escorpião argumentou:
— De jeito nenhum. Afinal, se eu te matar, morro junto, e posso até te proteger dos peixes grandes que andam por ai.
O sapo acabou concordando e levou o escorpião nas suas costas. No meio da travessia o escorpião cravou o ferrão no sapo, que gritou, assustado:
— Seu louco, vamos morrer os dois. Por que fizeste isso?
A resposta foi imediata:
— Eu sei, mas não consegui me controlar, é a minha natureza.
Moral da estória, ou será da História? Achar que o imperialismo pode salvar o mundo é seguir os passos do sapo.