A criminosa administração Cardoso

A criminosa administração Cardoso

Fernando Henrique Cardoso iniciou sua administração em 1995 extinguindo, através de um decreto, a Comissão Especial de Investigação criada na administração Itamar, com o propósito de “combater a corrupção”. Em 2001, Cardoso criou a Controladoria-Geral da União, “órgão especializado em combater denúncias”. É o que diz o livreto do deputado federal João Paulo Cunha, lançado durante a campanha eleitoral, que anuncia um “itinerário de 45 escândalos que marcaram o governo de FHC”. A própria imprensa oficialista, no início do segundo semestre de 2002, confessava a existência de 180 processos movidos contra o sociólogo da desnacionalização.

Na condição de presidente da República, o tempo de mandato de Cardoso equivaleu ao de um senador: oito anos. Sem contar que, antes, fora ministro quando o vice de Fernando Collor, Itamar Franco, assumiu a Presidência da República. Ao findar o primeiro mandato, Cardoso disse precisar de mais 48 meses para aplicar seus planos. No período, episódios de corrupção que favoreceram sua reeleição transformaram-se em escândalos que serviram para penalizar apenas deputados de um estado com receita para lá de modesta, como o Acre. Porém ,nunca o maior beneficiado, Cardoso, teve que responder por isso.

E assim ficou.

E, assim, também piorou a vida das massas no Brasil, não exatamente porque Cardoso estivesse ou esteja acima das classes. Cardoso (ou “similares” passados, presentes e futuros) jamais foi ou será superior às classes para quem trabalha e, em particular, às frações mais reacionárias dessas classes. Nada decidiu que estivesse fora do receituário do império. Ele, como político profissional, é pago, até mesmo, para receber pedradas… que, a princípio, não lhe trarão danos, como ensina qualquer manual de política.

Com a prisão do ex-presidente Carlos Menem e de Fujimori, surgiu no Planalto a certeza de que é urgente um foro especial, de modo que Cardoso não corra o risco de passar pelo mesmo constrangimento.

A queda no padrão de vida do povo brasileiro deve-se ao aprofundamento da política dos USA, auxiliada pelas classes reacionárias nativas associadas ao imperialismo. Personificar na figura de Cardoso, as razões do aniquilamento das forças produtivas, a entrega dos recursos naturais — atribuir-lhe o papel do maior (ou soberano) artífice da política semicolonialista no Brasil, mentor intelectual ou executor dos planos de sobrevivência do Estado burocrático, latifundiário e servil —, significa conferir-lhe um status que ninguém tem, ou jamais teve. Uma responsabilidade que não pode se restringir a um indivíduo apenas, imaginando estar ele acima das classes, do Estado, etc. Personificar num só homem, toda a responsabilidade da direção dos negócios dos exploradores contra os explorados, não passa de uma forma de ocultar a questão principal, de desvirtuar a análise e a investigação científica dos problemas estratégicos no processo de libertação do povo brasileiro.

A princípio, Cardoso deveria responder pelas próprias ações e cumprir o dever jurídico de quem chega a perpetrar as mais graves violações, porque, sem dúvida, cometeu crimes como gente grande. Isso explica a sua força, o alcance de suas relações, a figura do brilhante technopoll que é, assim como sua privilegiada culpabilidade.

Portanto, foro privilegiado

Mas, quando interessa às classes reacionárias com seu sistema forjar os atenuantes para a violação de determinado direito, basta, para isso, mudar a conformação jurídica. Não por acaso, bem antes de Cardoso iniciar a limpeza das gavetas, já se encontrava em tramitação, na Câmara, a Emenda Constitucional nº 29, que, aprovada, possibilitará que Fernando Collor e Itamar Franco se tornem senadores vitalícios. Para isso busca-se criar um Foro Especial destinado a conferir condição privilegiada aos ex-presidentes, quando julgados.

Sucede que a terrível concorrência entre candidatos a gerentes do velho Estado, e entre os quadros do império, de uma maneira geral — ainda que os USA não admitam lutas fratricidas entre as oligarquias nas colônias e semicolônias, capazes de reeditar ditaduras tipo Batista, Trujillo etc. —, impõe o risco de futuras dores de cabeça para presidentes, ministros e congêneres. E eis que o próprio Departamento de Estado necessita criar tumultos administráveis, como forma de, desesperadamente, não sendo possível aos USA governar de forma ideal os seus domínios, ao menos deve proceder, com a competência dos tubarões, ao saque e a pirataria.Além do mais, patrão é patrão, independente da utilidade do pelego.

Mais dia, menos dia, acontece a demissão, porque a vida é assim mesmo. Então, é preciso pensar na vida. Pinochet se cuidou, e mesmo assim…

Um pressentimento aterrador, entre eles, adverte: com a prisão definitiva do ex-presidente Carlos Menem, da Argentina e a de Fujimori, enxotado do Peru, surgiu no Planalto a certeza de que é urgente um foro especial, uma espécie de pára-choques no julgamento de ex-dirigentes, de modo a que Cardoso não corra o risco de passar pelo mesmo constrangimento. Afinal, o que terão os seus sucessores para fazer na vida, sob a administração cada vez mais dura do World Bank, do International Monetary Found, dos diretórios e dos grupos diretorianos do mundo? Campanhas de “moralização”, tidas desde o primeiro Fernando, como recomendáveis manobras de diversão, com CPIs de consumo (que mais servem para ocultar as razões do escândalo imediatamente anterior), para fingir austeridade e independência,tornam-se absolutamente necessárias.

Réu e juiz, ao mesmo tempo

Todavia, para evitar os “efeito Menem”, “efeito Fujimori” etc., Cardoso, há tempos, vem manobrando para acomodar seus interesses na mais alta corte do país. Uma vez nomeado para a embaixada brasileira no Timor Leste, o ministro Ilmar Galvão, do Supremo Tribunal Federal (STF), veria antecipada em alguns meses sua aposentadoria compulsória, fato que permitiria a indicação de mais um aliado de Cardoso ao Tribunal. O mais cotado para a indicação é o procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, muito conhecido pela prática de “engavetamento” de processos contra o governo — já lembravam os juristas Dalmo Dallari e Fábio Konder Comparato, na Agência Carta Maior, 14 de setembro de 2002. Concretizada a manobra, “dos 11 ministros que julgariam FHC em um eventual processo, quatro teriam sido indicados por ele próprio”, advertem os juristas.

Com o Foro, não apenas ex-presidentes, mas também ex-ministros de Estado e ex-parlamentares serão julgados de forma privilegiada, após saírem do cargo, por acusações sobre o exercício de seu mandato. Se aprovada a manobra, processos contra Cardoso, no pós-mandato, serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal.

Dessa forma, até antes de se conhecer o teor de qualquer acusação contra Cardoso, estaria facilitada a comprovação de sua inocência.

Não há nenhum ex-presidente com processo em julgamento, o que deixa claro que o objetivo do projeto em tramitação é o de facilitar a vida de um possível réu, que seja presidente. O desdobramento é que, de quebra, o ex poderá tornar-se um senador biônico, profissão que aguarda por uma linguagem atualizada. Aliás, Nelson Breve (estadão.com.br), em novembro do ano passado, informava que “uma proposta de emenda constitucional nesse sentido” fora protocolada na Câmara pelo presidente nacional do PTB, o deputado José Carlos Martinez (PR), coisa que já tramitava na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)”.

Instrumentos não faltam

Enquanto isso, Cátia Seabra assina um artigo em 18 de outubro deste ano informando, para decepção dos incautos, que o governo e o PT haviam negociado um dos pontos da agenda de transição. Justamente a restauração do foro especial para julgamento de ex-presidentes. Os adversários na disputa presidencial subitamente revelaram ser aliados, desde o início, cotados para ministérios. Como aparece na imprensa dominante, e o próprio deputado João Paulo Cunha — SP —, (precisamente o autor dos “45 escândalos”), admite a hipótese de que um ex seja passível de julgamento numa outra esfera (o Supremo) e trabalha para a desobstrução da pauta da Casa. A votação, tudo leva a crer, transcorrerá visando favorecer a “transição compartilhada”.

A oposição deverá retirar qualquer veto à emenda, indicam as negociações até o momento, o que, para o atual ministro-chefe da Secretaria-geral da Presidência, deputado Arthr Virgílio, PSDB, que a sua aprovação finalmente será um momento vantajoso para a democracia brasileira.

Privatização ou desnacionalização

A desnacionalização das empresas de importância estratégica (privadas e de economia mista), os acordos e tratados lesivos aos interesses nacionais concluídos com o imperialismo, não passam de recursos para impedir o controle do Estado na eliminação imediata dos monopólios estrangeiros e de seus associados internos (o latifúndio, que exerce o monopólio da terra e o capital burocrático nativo), bem como a criação de um setor público que execute um programa voltado para a emancipação das classes oprimidas e a independência nacional.

Justiça seja feita, nenhum antecessor de Cardoso encontrou a oportunidade de doar ao invasor tantas riquezas, de permitir que a exploração do povo brasileiro e dos recursos geográficos pelo império, alcançasse um nível tão inimaginável.

Não fosse crime desnacionalizar as empresas estratégicas, todas de economia mista, denominadas (inadequada e premeditadamente) estatais pela imprensa dominante, ainda assim, em sua maioria elas foram incorporadas ao setor privado, num processo de suspeição, segundo a própria imprensa dominante. Mas o imperialismo não desnacionalizou simplesmente as empresas estratégicas de capital misto. Durante todo o período do gerenciamento militar no Brasil, o imperialismo introduziu associados nas empresas de capital misto, empresas que já produziam para as corporações estrangeiras (e para os grupos associados internos) a preços muito baixos. Pouco tinham de empresa nacional. O imperialismo também assimilava empresas privadas de capital nacional, depois de invadir áreas que tradicionalmente pertenciam a essas empresas brasileiras. Ao privatizar as empresas de economia mista, o imperialismo passou a ter acesso ao solo, ao subsolo e, até, ao espaço aéreo brasileiro. Agora, consagra a posse de território nacional.

Alcântara, caso isolado?

Como se não bastasse o episódio da Base de Lançamentos de Alcântara que, graças ao Protocolo 505, firmado em 18 de abril de 2000, permite obter armas e equipamentos dos USA. Como contrapartida, o imperialismo ianque obteve o uso da base militar e de satélites de Alcântara, sem o conhecimento do parlamento brasileiro. Mas, quantos acordos lesivos aos interesses nacionais, aparecerão como uma desagradável surpresa para o povo brasileiro, além de Alcântara, do Programa Nacional de Florestas — PNF, de acordo com o World Bank, a Ford Fundation, o WWF, o PPD-PPG7-MCT-Finep? etc., etc. Já vem sendo instituído um Regime de Concessões Florestais nas tais reservas de preservação (Amazônia), as quais deverão ser ampliadas de 8 milhões de hectares para 50 milhões de hectares, o tamanho da França.

Para o manifesto da Frente Parlamentar do Brasil, constituída por parlamentares federais, datado de 14 de maio de 2002, o processo de ampliação das reservas prevê concessões exploratórias de longo prazo, venda, na realidade (“honesta, porque tudo é feito através de licitações”, explicaria um desses tecnocratas e entreguistas, a quem o imperialismo chama de dirigentes), desse patrimônio a grandes corporações madeireiras, inclusive estrangeiras sem problemas, porque estão arrolados 800 mil hectares no Pará e 415 mil hectares em Rondônia.

Essas glebas possuem altos investimentos e resultados de pesquisas que revelam riquíssimas ocorrências de minerais.

Na administração Cardoso também isso foi desnacionalizado. Justiça seja feita, nenhum antecessor seu encontrou a oportunidade de doar ao invasor tantas riquezas, de permitir que a exploração do povo brasileiro e dos recursos geográficos pelo império, alcançasse um nível tão inimaginável.

‘Avanço para a democracia brasileira’

O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, deputado Arthur Virgílio (PSDB-AM), nega a articulação palaciana, mas considera que a eventual aprovação dessa emenda se notabilizará como “um avanço para a democracia brasileira”.

Alguns, como o senador Lúcio Alcântara (PSDB-CE), vêem com desconfiança o mandato vitalício. Para ele, não importa muito conceder “todas as vantagens que confiram dignidade aos ex-presidentes do País — aposentadoria, seguranças, carros oficiais, salas para escritório e pagamento de assessores —, mas não um mandato vitalício no Senado”. Outros como Martinez, querem limites para não haver constrangimentos, estabelecendo na proposta que a emenda não teria efeito retroativo: Sarney e Itamar, embora tivessem cumprido mandatos, não seriam beneficiados com o mandato vitalício.

No projeto, o deputado limitou a concessão de mandato vitalício apenas aos ex-presidentes “que tiverem concluído seus mandatos e estiverem com seus direitos políticos preservados” — o que exclui Collor. Martinez estabeleceu na proposta, ainda, que a emenda não teria efeito retroativo. Isso deixaria de fora tanto o senador José Sarney (PMDB-AP) como o governador de Minas Gerais, Itamar Franco (PMDB). Mais uma vez, a proposta de emenda constitucional, em trâmite pelas Comissões da Câmara dos Deputados, criando o cargo de senador vitalício para ex-presidentes da República, revela que surgiu como criação exclusiva, como encomenda e sob medida.

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