Em fins de outubro e início de novembro, altos escalões do governo federal deram declarações contrárias ao aspecto estatal da Petrobrás, defendendo sua total e completa privatização. Em 11 de novembro, Jair Bolsonaro se referiu à Petrobrás como “monstrengo”. O fascista também disse, durante uma motociata no Paraná, que deseja “fatiá-la bastante [a Petrobrás] e, quem sabe, partir para a privatização”. Em entrevista dada ao Uol no dia 17/11, Mourão apontou contra o “monopólio da Petrobrás” na exploração do pré-sal. Já Paulo Guedes, enquanto magnata velhaco, perguntou: “por que nós não podemos pensar ousadamente a respeito disso?”, referindo-se à sua total privatização.
À tribuna do AND cabe apontar que se tratam, todas elas, declarações que indicam uma mesma posição entreguista, antinacional e vende-pátria. É preciso reconhecer que a privatização completa e total da Petrobrás, sonhada pelos reacionários no comando do governo, representará o aprofundamento da dominação direta do imperialismo e a piora acentuada das relações de produção em desfavor das classes populares.
As consequências da criminosa política de paridade internacional de preços, que é um elemento agudo próprio do caráter privado da empresa, atingem sem cessar o povo: alimentos e produtos básicos têm seus preços aumentados, são afetadas as atividades principalmente das médias indústrias (que, como todas, dependem do Gás Natural Liquefeito, também explorado pela Petrobrás) e a promessa de aumento prometido pelas empresas de ônibus de R$ 2 a partir do início do próximo ano.
Embora devamos apontar que com a privatização completa se perderá ainda mais a soberania nacional e fragilizará a economia local, nos é igualmente fundamental apontar que toda esta situação foi possível nos próprios marcos da política de uma empresa em parte estatal, dentro dos limites de um decadente capitalismo burocrático. Portanto, combater a ilusão estatal, visão reinante entre a chamada “esquerda” e mesmo entre setores nacionalistas, criará as condições para que mais parcelas entendam que, afinal, não basta ser estatal se o Estado não for do povo.
Capital monopolista estatal e não estatal
No mês de outubro, a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobrás) produziu óleo por menos de 11 dólares por barril e vendeu combustíveis e gás de cozinha à população brasileira a partir da cotação internacional que coloca o barril a mais de 80 dólares.
Segundo constam os relatórios da Petrobrás, no primeiro e segundo semestres os “acionistas” ou investidores estrangeiros – magnatas do capital financeiro – devem receber R$ 63,4 bilhões. Já o “grupo de controle” (governo federal, BNDES e BNDESPar) ficará com R$ 23,3 bi. O terceiro grupo, o dos “investidores brasileiros” (grandes burgueses nativos) terão R$ 13 bi. O primeiro grupo, dos magnatas, exerce um controle através das ações de 42,8% da empresa. O segundo controla 36,75%. Por fim, os “investidores nacionais” ficam com os restantes 20,46%, expressando que a privatização já está em marcha.
Este é o retrato mais fiel do que é a Petrobrás e o papel que pode cumprir na velha ordem: uma empresa com caráter de capital monopolista estatal e não estatal (grande burguesia brasileira e corporações imperialistas estrangeiras), crescente e profundamente vinculada ao imperialismo.
Uma questão essencial
Àqueles que partem do reconhecimento de que o Estado é um instrumento de repressão de uma ou mais classes reacionárias sobre outras classes populares (e não qualquer ente neutro que reúne os interesses de toda a população, interesses estes que são contraditórios e irreconciliáveis desde sua base econômica) concluem que, sob o regime capitalista, nenhuma instituição ou empresa deste Estado pode fugir à condição de ser parte desta máquina especial controlada pelas classes dominantes. Tampouco pode ser em nosso caso, onde um regime de tipo capitalista burocrático conserva intactas a base primeira para seu desenvolvimento, o latifúndio feudal e semifeudal. Foi esse latifúndio que, após ser impulsionado pela coroa portuguesa sob o sangue de povos inteiros, passou para a influência do imperialismo inglês até ser desenvolvido passando a condição de principal sustentáculo da dominação do imperialismo ianque (Estados Unidos, USA) – ao lado da grande burguesia. Toda essa estrutura arcaica segue intacta em seus dois aspectos fundamentais (monopólio feudal da terra e manutenção de relações pré-capitalistas) que podem ser resumidos em uma opressão e exploração sem fim aos camponeses.
Desta forma, é ingenuidade (e no limite oportunismo de tipo populista) pensar que a manutenção ou restauração da Petrobrás estatal nos faz ganhar uma polegada que seja em questão de soberania nacional. Nada disso foge dos marcos do capitalismo burocrático. Prova disto é constatarmos que toda a atrocidade feita pela atual direção do general quatro estrelas do Exército genocida, Joaquim Silva e Luna, foi possibilitada pelos marcos de uma empresa mista, cujo controle administrativo é estatal.
Tudo isto seguirá ocorrendo enquanto perdurar o velho Estado de grandes burgueses e latifundiários: o aprofundamento da dominação do capital financeiro sobre o conjunto da economia nacional, através da privatização, passo a passo, de empresas estatais ou mistas (como a Petrobrás, mas não só); a crescente e desavergonhada transferência de renda das massas populares diretamente aos grandes acionistas da Petrobrás (capital financeiro imperialista, ao próprio Estado reacionário que concede isenções fiscais para o latifúndio semifeudal ano após ano e às frações da grande burguesia brasileira); bem como a quebra do monopólio da exploração, do refino e da distribuição pela Petrobrás (já efetivada em muitos postos de petróleo, mas também de Gás Natural).
Estado de quem?
Em nosso país, diferentes governos reacionários da grande burguesia cumpriram o papel de desenvolver o capital monopolista no sentido de tornar-se capital monopolista estatal. A Petrobrás, nesse sentido, foi planejada para ser uma empresa estatal desde sua concepção.
O capital estatal, nos marcos do modo capitalista (burocrático), surge como apêndice e a serviço do imperialismo e do latifúndio. Ele aparece com a fusão do capital monopolista com o poder político de Estado – nasce o capitalismo monopolista estatal. O grande chefe do proletariado internacional, o Presidente Mao Tsetung, apontou que as características principais deste tipo de capital são: 1) ser estreitamente vinculado ao imperialismo estrangeiro; 2) ser estreitamente vinculado à classe dos senhores de terras e camponeses ricos de velho tipo; e 3) ter se transformado em capitalismo monopolista de Estado, comprador e feudal.
O Estado reacionário brasileiro, ao qual pertence este tipo de capital, nasceu enquanto um instrumento de dominação das classes dominantes, um ferrolho genocida, um velho Estado de grandes burgueses e latifundiários, capitalista monopolista burocrático (ou capitalismo burocrático). Este, tal como seus monopólios, oprime não só aos operários e camponeses, mas também a pequena burguesia urbana e prejudica os interesses da média burguesia. Deste quadro amplo da conformação do velho Estado brasileiro é parte integrante suas empresas que cumprem o papel de controlar pontos chaves da economia nacional e, direta (como ocorre hoje) ou indiretamente, subordiná-la ao imperialismo*.
Em torno da questão de definir sobre qual perspectiva pode se desenvolver estas empresas, a concepção proletária aponta que, conservadas as bases que sustentam este capitalismo burocrático e seu velho Estado, todas as empresas estatais ou mistas seguirão sem servir ao Povo e à Nação, porque toda a economia sobre a qual se apoia encontra-se dominada, inclusive as finanças do próprio país. Porém, em um Estado que pertença às classes revolucionárias, apoiado em uma economia nacional, autocentrada e autossuficiente, as estatais cumprirão papel chave. Isto, todavia, não pode ocorrer sem a substituição deste Estado por um outro, o Novo Brasil, através da luta. Neste Novo Brasil não somente as demandas de camponeses, operários, trabalhadores, intelectuais e a legítima burguesia nacional serão atendidas; também ocuparão lugar de destaque as empresas estatais de Nova Democracia.
Nota:
*Na China, a formação de capitais deste tipo foi diferente. Quatro grandes famílias impuseram seu regime de dominação durante duas décadas (entre 1920 e 1940). Neste período, valeram-se da centralização política para desenvolver suas empresas (capital monopolista privado), controlando as artérias vitais da economia nacional. Passando por outras formas próprias de desenvolvimento, o caso brasileiro seguiu os mesmos aspectos fundamentais.